A demissão de 45 pessoas, ocorrida há exatamente uma semana, foi mais um sinal da crise financeira que o Inter atravessa. E do enfrentamento do problema. Em uma década, a dívida do clube triplicou — beira os R$ 600 milhões, com quase metade a ser pago no curto prazo. Por isso, o torcedor pode esquecer investimentos polpudos em nomes consagrados ou grandes contratações midiáticas. Pelo contrário, a porta do Beira-Rio está aberta bem mais para saída do que para entrada de jogadores.
Desde o início da pandemia, em março de 2020, o Inter soma 152 pessoas demitidas. Restam 545 funcionários no quadro. O número está na média dos demais brasileiros de porte semelhante, dado que precisa dedicar profissionais a cuidar do estádio. A direção garante que as demissões não foram as únicas medidas, mas são parte de uma mudança de processos que envolve também revisão de contratos com fornecedores, aumento de eficiência, entre outros. A meta é economizar cerca de R$ 80 milhões até o final de 2022.
— Precisamos realizar as mesmas atividades com uma estrutura menor — resume o CEO do clube, Giovane Zanardo.
A situação atual exige, de fato, medidas drásticas. O próprio presidente Alessandro Barcellos revelou que o clube paga, todos os meses, R$ 6 milhões em dívidas. Dinheiro que poderia ser destinado ao futebol, mas que precisa ser usado para quitar débitos com bancos, juros e causas trabalhistas. Como exemplo, Ignacio Scocco, que passou pelo clube em 2013, ganhou uma ação judicial cuja indenização se aproxima a R$ 10 milhões, a ser pagos até 2022. Caso semelhante ocorreu com Forlán, cujos débitos foram liquidados em 2018.
Dívidas assim, bancárias e trabalhistas, são as mais graves, já que precisam ser quitadas o quanto antes sob pena de aumentarem e se tornarem inviáveis. Segundo levantamento de Rodrigo Capelo, jornalista do ge.globo especializado em finanças dos clubes, esses débitos de curto prazo representam 47% do total devedor do Inter.
Para resolver isso, só há duas soluções: pagar o que se deve e renegociar prazos. Para conseguir o segundo, fazer o primeiro é fundamental. Reduzir dívidas e mudar processos de gestão são sinais aos credores de que há, de fato, intenção e forma para pagar. Um exemplo disso ocorreu em 2019, quando o empresário Delcir Sonda perdoou uma dívida de R$ 25 milhões e de certa forma salvou o clube de perder os benefícios do Profut, programa do governo federal para renegociar tributos fiscais.
É com base nisso que ocorreram as demissões. E as vendas de jogadores. O clube orçou a arrecadação de R$ 90 milhões em negociações e está próximo dessa meta com saídas de Praxedes (para o Bragantino) e Vinícius Tobias (Shakhtar), além do empréstimo de Thiago Galhardo (Celta), alcançando pouco mais de R$ 77 milhões. Desfazer-se de atletas é uma realidade do futebol brasileiro — e inclusive foi o que fez o Inter virar referência no país no início do século 21. Se não nessa janela, a próxima terá mais despedidas.
Nesse cenário, justifica-se o investimento na categoria de base. O Inter foi à Argentina buscar Gustavo Grossi, antes coordenador do River Plate, para incrementar o trabalho. Formar jogadores é fundamental tanto esportivamente, quanto financeiramente. Foi vendendo Lucas Paquetá, Vinícius Júnior, Reinier e Léo Duarte que o Flamengo conseguiu o dinheiro para contratar Gabigol, Bruno Henrique, Arrascaeta, Éverton Ribeiro, Gerson e os demais nomes que o levaram ao bicampeonato brasileiro e ao título da Libertadores.
Outro ponto fundamental é o retorno do público às arquibancadas. Não só pela bilheteria em si (apesar da relevância de ter visto cerca R$ 20 milhões deixarem de entrar nos cofres com o Beira-Rio vazio), mas também pela retomada no projeto de aumentar a quantidade de sócios. O clube chegou a ter 129 mil associados em 2019 e viu o número cair para 96 mil atualmente, sendo cerca de 20% deles inadimplentes.
O quadro social deveria entregar ao clube cerca de R$ 77 milhões, mas o valor certamente será menor. Ano passado, foram R$ 66 milhões. Atualmente, os torcedores são responsáveis por 21% do orçamento do clube, a terceira maior fatia, atrás apenas de direitos de TV e de venda de jogadores, e à frente de patrocínios, licenciamentos de marca e estacionamento.
Com todos esses cenários equalizados, será possível retomar, aos poucos, uma condição melhor de investimento em futebol. O primeiro passo é encerrar o ano praticamente zerado, possivelmente com superávit de R$ 170 mil. Se for confirmado, será a primeira vez desde 2015 que as contas não fecharão com déficit.