Miguel Ángel Ramírez é adepto do Jogo de Posição (JP), conceito que tem como referência o seu compatriota Pep Guardiola, atualmente técnico do Manchester City. Isso não significa que o Inter vai jogar como o time inglês ou como o Barcelona nos tempos em que teve o espanhol no comando. É apenas um conceito de jogo sobre o posicionamento dos atletas e suas funções em campo.
No Jogo de Posição, cada jogador tem um função dentro do espaço do campo. A proposta é que a bola chegue a esse setor para que o atleta possa executar sua tarefa. Não quer dizer que o time se posicione de forma estática, mas, sim, que sempre tenha alguém ocupando determinadas zonas do gramado. Isso ocorre porque a ideia central do JP é a ocupação de espaços livres, seja para receber a bola sem marcação, seja para atrair um marcador e, consequentemente, encontrar um companheiro livre para avançar em direção ao gol rival. A busca é sempre por gerar superioridade, numérica, posicional ou qualitativa (quando um jogador de bom potencial técnico fica no mano a mano contra um marcador).
É importante entender que o Jogo de Posição é um conceito, e não um modelo de jogo. Assim, existem diferentes formas de executá-lo, casos de Jorge Sampaoli e Domènec Torrent, que trabalharam no futebol brasileiro na última temporada.
— O Jorge Sampaoli pratica o Jogo de Posição, mas os times dele são mais agressivos. O Independiente Del Valle do Ramírez não era tão agressivo, era um time de domínio e posse, que escolhia muito a jogada e rodava mais a bola. Esse estilo é mais parecido com o do Domènec — cita o analista tático do UOL Rodrigo Coutinho.
Saída de bola
Para a boa execução do Jogo de Posição, a posse da bola é ferramenta fundamental. É por meio da troca de passes que o time busca mexer com os jogadores rivais para criar os espaços. Em razão disso, é preciso que a equipe valorize a posse desde a saída da defesa, o que exige participação ativa dos zagueiros e também do goleiro no início da construção das jogadas.
Ramírez, porém, não é um técnico que se prende apenas a uma saída com passes curtos, como fazia Fernando Diniz no São Paulo, por exemplo. O espanhol usa essa ideia de atrair os adversários e, quando muitos marcadores estão perto de sua área, aposta em passes mais longos para encontrar seus jogadores livres ou o chamado "homem livre".
— O Independiente Del Valle era um time que fazia uma ocupação muito racional dos espaços. Nessa saída, será preciso uma participação muito grande dos zagueiros e do goleiro. O que tenho dúvida é se o Marcelo Lomba vai conseguir. O primeiro volante também é fundamental para esse jogo funcionar — ressalta Coutinho.
Por essa ideia, é comum que os times que praticam o Jogo de Posição tenham altos índices de posse de bola. Na última Libertadores, por exemplo, o Independiente Del Valle de Miguel Ángel Ramírez foi o time que teve a maior média percentual de posse de bola, de 69,4%. Na campanha do título da Sul-Americana, em 2019, esse índice foi um pouco menor, de 57,6%.
Sistema tático
Ramírez não é um técnico adepto de apenas um esquema tático, mas no Del Valle teve o 4-3-3 como preferencial. Na comparação com o time de Abel Braga, o Inter deverá ter uma mudança no perfil dos jogadores de lado de campo. Extrema pela esquerda no Brasileirão, Patrick deverá passar a atuar mais como um dos homens do tripé de meio-campo. Caio Vidal se encaixa nesse estilo dos atacantes de lado que o espanhol costuma usar, da mesma forma que Peglow.
Na defesa, zagueiros voltarão a ter a exigência de uma boa saída, como com Eduardo Coudet. Os laterais terão mais funções ofensivas do que com Abel Braga , mas atacarão de uma forma diferente do que faziam com o antigo treinador argentino. Enquanto Coudet usava os laterais como responsáveis pela amplitude, com Ramírez eles dividem essa função com os atacantes de lado e, algumas vezes, aparecem apoiando por dentro.
Reforços
Ainda que a ideia do Inter na contratação de Miguel Ángel Ramírez seja um maior aproveitamento da base, alguns jogadores precisarão ser contratados — como para a lateral esquerda, meio e lado de ataque. Como o clube passa por dificuldades financeiras, será preciso criatividade para esses acréscimos ao elenco.
Os primeiros nomes falados como possíveis colorados nos últimos dias são os do meia argentino Giuliano Galoppo, do Banfield, de 21 anos, e o atacante chileno Carlos Palacios, do Unión Española, de 20 anos. O Interesse em Palacios é confirmado pela direção.
Os dois são amostras da tentativa de o clube ter criatividade na busca por atletas que possam se valorizar. Ramírez teve a experiência de ser coordenador da base do Del Valle e está acostumado a trabalhar com jovens.
Em participação em um seminário do site The Coaches Voice, no começo de fevereiro, Ramírez falou sobre diferenças e semelhanças na forma de trabalhar com jogadores jovens e rodados.
— A forma de trabalhar na base é diferente do profissional, mas, no final, o objetivo é atender a coletividade do indivíduo. Não se pode pensar que todos são iguais e que se deve tratar de forma igual, porque não é assim. Tem um tipo de jogador que vai entender apenas praticando no campo, que não adianta explicar no quadro negro ou no vídeo. Esse jogador pode não entender a teoria, mas vai aprender fazendo. Outros precisam se verem fazendo, precisam rever o jogo no vídeo para entender. Há os que entendem pela explicação no quadro negro e também os que aprendam na conversa e até nos gritos — citou.
Ramírez assinou contrato com o Inter por duas temporadas. O espanhol começará sua trajetória no Colorado na sequência da disputa do Campeonato Gaúcho.