Se os torcedores colorados ficaram felizes por não terem de cruzar nas oitavas de final da Libertadores com Grêmio, River Plate, San Lorenzo ou Athletico, saibam que o mata-mata com o Nacional-URU não será algo exatamente simples. Além de contar com um time dono de forte marcação no meio-campo, que se defende como poucos, os uruguaios bateram o Atlético-MG duas vezes, encerrando a fase de grupos empatados em pontos com o Cerro Porteño e ostentando a melhor campanha de um segundo colocado no torneio, com 13 pontos, apenas um a menos do que o Inter.
Se há algo que não falta ao Nacional é tradição. São 47 participações em Libertadores, contar apenas 12 do Inter, e três títulos. É como se a dupla Gre-Nal fosse todos os anos para o torneio continental, via Gauchão. O Nacional é também o clube que mais vezes enfrentou o Inter na Libertadores. Já foram oito encontros, com uma final de campeonato, em 1980, quando o Nacional se sagrou campeão, em 2006, quando o Inter venceu o duelo nas oitavas e acabou caminhando para o seu primeiro título, e na fase de grupos de 2007, quando Vélez e Nacional avançaram, e o então campeão mundial foi eliminado de forma precoce.
Com um elenco reformulado, o Nacional buscou 12 jogadores para a temporada 2018/2019. Largou mal no começo do ano, colecionando tropeços no Campeonato Uruguaio, o que o deixou distante do título e fez com que a direção trocasse de treinador. Em 16 de março, após uma derrota por 2 a 0 para o Danubio, o argentino Eduardo Domínguez foi demitido e a aposta recaiu sobre Álvaro Gutierrez, de 50 anos, chamado pelo apelido de "Guti". Ainda que na Libertadores a equipe já somasse duas vitórias, sobre Zamora-VEN e Atlético-MG, as duas derrotas e os três empates no Uruguaio precipitaram o câmbio.
O novo técnico é uma espécie de Odair Hellmann charrua. Ele havia comandando o Nacional na temporada 2014/2015. Assumiu como interino, logo depois de uma goleada, e, aos poucos, foi ganhando jogos até levar o time à vaga na Libertadores. No ano seguinte, efetivado no cargo, fez a melhor campanha do Nacional em um Campeonato Uruguaio, obtendo 42 pontos em 45 possíveis. Ao final da temporada, sagrou-se campeão uruguaio e foi contratado pelo Al Shabab, da Arábia Saudita. Depois, ainda treinou a LDU. Em seu retorno ao clube, em março, passou a realizar algumas mudanças no time.
— O Nacional está voltando agora a um bom nível. Joga no 4-4-1-1, e é um time que gosta de se defender e sair em contra-ataques. Acredito que adotará esta postura contra o Inter, mesmo jogando em casa — afirma Emiliano Salomón, repórter da Rádio Universal, de Montevidéu. — Trata-se de um time muito focado e taticamente obediente — acrescenta Salomón.
Com uma equipe que mescla jogadores experientes com jovens da base, o Nacional tem entre os seus destaques "veteranos" o goleiro titular da seleção panamenha, Luis Mejía, 28 anos, o meia Chory Castro, 34, que voltou para a encerrar a carreira no clube depois de 10 anos no futebol espanhol, e o atacante argentino e goleador do Campeonato Uruguaio Gonzalo Bergessio, de 34 anos. Um dos zagueiros titulares é o "doble chapa" Felipe Carvalho. Nascido em Rivera, ele tem nacionalidade uruguaia e brasileira. Fez carreira no futebol sueco antes de ser contratado pelo Nacional.
Entre a "gurizada", os destaques são o lateral-direito Guzmán Corujo, 22 anos, que voltou em alta após seis meses parado devido à ruptura nos ligamentos do joelho direito; e, do lado esquerdo, outro talento da equipe: Matías Viña, de 21 anos.
No meio-campo, o jogador mais ofensivo é o novato Santiago Rodríguez, 19 anos, titular da seleção uruguaia sub-20 que disputará o Mundial na Polônia, a partir da próxima semema. Considerado a joia da base, Rodríguez reveza com Castro a titularidade.
— Nos jogos contra o Atlético-MG, o Nacional não se mostrou um time propriamente técnico, mas foi seguro defensivamente e aproveitou bem as poucas oportunidades que teve. Em boa parte da partida no Uruguai, entregou a bola para o adversário, que não sabia muito bem o que fazer com ela. Quando resolveu pressionar, apostou bastante em cruzamentos para a área. E foi numa dessas que Bergessio fez o gol da vitória, de cabeça — recorda João Vitor Marques, setorista do Atlético-MG no Portal Superesportes.
— No jogo em Belo Horizonte, o Atlético estava ainda mais pressionado. Mas o cenário da partida foi muito parecido com o do primeiro jogo: Nacional recuado, sem a bola e com pouca criatividade ofensiva. Numa das poucas vezes em que o time uruguaio foi à frente, Felipe Carballo fez um golaço, e eliminou o Atlético no Mineirão. O Nacional se mostrou forte no meio-campo. Povoou bastante aquele setor e deu pouco espaço para Luan e Cazares, homens mais criativos. O Atlético, então, ficou muito previsível e não conseguiu achar opções pelas pontas — completa Marques.
Como na Libertadores de 2006, a decisão do mata-mata das oitavas será no Beira-Rio. Naquele ano, o Inter encontrou a sua maneira de jogar o torneio justamente ao encontrar o Nacional. Quem assegura isto é o presidente colorado na época, Fernando Carvalho:
— Aquele jogo em Montevidéu (vitória colorada por 2 a 1, de virada, com gols de Jorge Wagner e de Rentería) marcou a nossa virada na Libertadores. Foi lá que passamos a atuar com cinco no meio-campo, marcando e jogando. Ficava apenas o Sobis na frente.
Depois, em Porto Alegre, o Inter empatou em 0 a 0 com o Nacional de Luis Suárez, avançou às quartas de final, eliminando a LDU, depois o Libertad de Guiñazu, na semi, e bateu o São Paulo de Muricy Ramalho na final, se sagrando campeão pela primeira vez.
Para Carvalho, a nova decisão com o Nacional não será um duelo simples de se resolver. O ex-presidente entende que o estilo de jogo dos uruguaios pode dificultar o Inter.
— O Nacional é um time que não ataca, e isto será um problema. A dificuldade maior será enfrentar uma equipe que jogará no erro do Inter. Desde os tempos do Nico, o Nacional é um time que se defende muito bem e que contra-ataca bem também. Eles não costumam propor o jogo. Têm camisa e tradição, além de confrontos marcantes com o futebol brasileiro. Não dá para subestimar o fato de eles não estarem disputando títulos. Em 2011, o Peñarol eliminou o Inter nas oitavas e só foi perder a final para o Santos do Neymar, por escore mínimo — adverte Fernando Carvalho.
Já sem chances de conquistar o Campeonato Uruguaio — que deverá ficar com o Peñarol —, o Nacional ainda tem três datas a cumprir até o dia 2 de junho, quando haverá recesso no futebol local. Até lá, enfrentará Defensor, Juventud e Rampla Juniors. Depois, os jogadores receberão três semanas de férias, até a reapresentação, ao final do mês. O Clausura Uruguaio se iniciará depois da Copa América, dias antes do primeiro jogo contra o Inter, pela Libertadores. Dificilmente haverá chegadas e partidas no elenco. Mas Santiago Rodríguez pode ser um alvo em potencial da Europa, caso vá bem no Mundial da Polônia.
Das curiosidades da Libertadores colorada em 2019 estão os reencontros de ídolos com os seus clubes de origem. Foi assim entre D'Alessandro e River Plate, entre Paolo Guerrero e Alianza Lima, e será agora, com Nico López enfrentando pela primeira vez o Nacional. Nesta terça-feira, quando o Nacional cumpriu 120 anos de vida, Nico postou uma foto em seu Instagram felicitando o clube e, ao final, a frase:
— Nos vemos pronto.
Das 12 participações do Inter na Libertadores, o Nacional é o principal rival. Foram oito encontros até aqui, com três vitórias coloradas, duas vitórias uruguaias, e três empates. O Nacional se sagrou campeão da América em 1980 sobre o Inter, enquanto os gaúchos do Rio Grande do Sul eliminaram os "gauchos" de Montevidéu em 2006 para caminhar para o seu primeiro título. Vem aí um mata-mata de tradição, títulos, e rivalidade entre Brasil e Uruguai.