Fernando Carvalho raras vezes tem aparecido em público, e para falar sobre o Inter. O presidente campeão do mundo em 2006 jamais voltou ao Beira-Rio após o descenso de 11 de dezembro de 2016. Assiste aos jogos somente pela TV. Não vê mais clima para ir ao estádio. Aos 65 anos de idade, hoje ele trabalha como consultor permanente do Cianorte – o clube do interior do Paraná, que neste ano foi eliminado pelo Inter na Copa do Brasil. Tem passado as semanas em viagens entre Porto Alegre, Cianorte e Europa.
Nesta quarta-feira, porém, Carvalho voltou a conversar publicamente sobre o Inter. Ainda com algum constrangimento ao citar a sua última passagem pelo departamento de futebol do clube, quando atendeu a um apelo do então presidente Vitorio Piffero para assumir um vestiário que já não tinha mais nada a dar ao time, e que acabou na Segunda Divisão. No Tá Na Mesa, evento semanal da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande Sul (Federasul), Carvalho e o presidente do Grêmio, Romildo Bolzan Júnior, foram os palestrantes do painel "Futebol: paixão de milhões". E, 557 dias depois daquela tarde tórrida em Mesquita, na Baixada Fluminense, Fernando Carvalho voltou a falar sobre o Inter. Confira os principais trechos da entrevista:
Fernando Carvalho voltará ao Inter um dia?
Não volto. Voltei em 2016 por um momento de apreensão, de dificuldade. Talvez, em uma outra oportunidade, se houver necessidade, eu possa rever isso. Mas, nesse momento, nem numa situação assim eu penso voltar. Para o dia a dia, para trabalhar pelo clube, para isso, o meu prazo de validade terminou. Tem muita gente boa querendo trabalhar e ajudar o Inter. Prefiro ficar torcendo como sempre torci. O meu prazo de validade no Inter já terminou, essa é a realidade.
O último jogo do Inter que assisti ao vivo, no estádio mesmo, foi Fluminense e Inter, em 2016. Nunca mais fui. Sou um torcedor de sofá
FERNANDO CARVALHO
Ex-presidente do Inter
O senhor tem ido aos jogos, tem assistido às partidas no Beira-Rio?
Não tenho ido. Assisto a todos pela TV. O último jogo do Inter que assisti ao vivo, no estádio mesmo, foi Fluminense e Inter (o empate em 1 a 1, na última rodada do Brasileirão, chancelou o rebaixamento do Inter), em 2016. Nunca mais fui. Sou um torcedor de sofá. Já estava no sofá antes de agosto de 2016, é mais cômodo, mas acabei atendendo a um pedido do Vitorio (Piffero). Sigo um torcedor muito identificado, mas não tenho mais vontade de ir ao estádio.
Como o descenso do Inter abalou o senhor?
Me abalou como torcedor. É uma situação pela qual ninguém quer passar, mas é da vida. Tô em outra agora, torcendo pelo meu time, que está fazendo uma campanha acima da expectativa, e espero que consigamos chegar ao ponto que o Inter merece: a parte de cima da tabela.
Mas como foi conviver com isso?
A vida é feita de sucessos e de insucessos. Tive muito sucesso no Inter e, depois, um período que não foi bom. Nem fico enfeitado na vitória, nem depressivo quando perco. É assim que ajo. A questão da Segunda Divisão é muito ruim, ninguém, quer passar pelo que passamos, mas deu, acabou. Estamos na Primeira Divisão de novo e, como torcedor, penso para a frente. Penso que o meu clube vai crescer, melhorar, e conquistar os títulos que a torcida quer. O que aconteceu, passou. É preciso ter equilíbrio.
As contas da gestão Piffero estão sob investigação do Ministério Público. O que o senhor tem a dizer sobre isso?
Tenho optado por não falar das questões do Inter. Claro que, em alguma oportunidade, terei de falar. Mas estou esperando que as coisas se clareiem. Sou amigo do Vitorio há mais de 50 anos, tenho plena confiança nele, e tenho certeza que, lá adiante, as coisas serão esclarecidas. Tudo ficará claro. E esse clima ruim contra ele vai acabar terminar. Ele sairá bem desse episódio. Mas, sinceramente, não gosto de falar sobre essas coisas, e já estou falando demais. Estou falando coisas que não gostaria porque me impus um silêncio que acho adequando e necessário. Piffero é uma pessoa, do bem e correta. Sempre foi correto comigo e com o clube. Espero que, no fim, as coisas sejam esclarecidas e que ele não tenha nada que desabone a sua conduta. Está tão bom assim sem falar, prefiro ficar distante, observando.
O que o senhor tem feito?
Estou vinculado ao Cianorte, viajo muito para a Europa e para outras cidades do país, pois esse trabalho de consultoria implica em muita viagens. Faço isso permanentemente.
O senhor tem conversado com o presidente do Inter, Marcelo Medeiros, e com o vice de futebol, Roberto Melo?
Trabalho profissionalmente com o futebol agora e, de vez em quando, converso com Marcelo e com Melo, muito esporadicamente, e mais coisas informais do que qualquer tipo de opinião sobre o que está acontecendo.
Gostou da contratação do diretor executivo Rodrigo Caetano?
Rodrigo é muito experiente. Ele passou muitos clubes, teve sucesso quase sempre. Saúdo a contratação dele, ainda que entenda que Jorge Macedo (o antecessor de Caetano) tenha ajudado muito o clube, principalmente na remontagem do grupo, em 2017.
E Odair Hellmann, a quem o senhor deu o primeiro emprego como auxiliar no Inter? O que lhe parece a estreia dele como treinador?
Odair é um treinador que sequer é futuroso, ele já demonstra a sua condição. Confesso que quando ele foi escolhido achei que não era a hora. Era uma tarefa muito difícil, pelo grande componente de coisas: o clube voltando da Segunda Divisão, reestruturação de grupo e de elenco, e isso traz dificuldades. Ele começou claudicante, como todo o treinador, mas alterou esquema, passou a jogar no 4-1-4-1, achou os jogadores certos, e está fazendo um excelente trabalho. Torço muito pelo Odair pela pessoa que ele é: do bem, interessada, que faz cursos, que tem boa relação com os atletas, e a minha restrição inicial se dissipou. Odair terá um futuro brilhante pela frente.
O Inter tem condições de, ao menos, voltar à Libertadores pelo Brasileirão?
Acho que tem toda a condição. Jogamos a primeira parte da tabela contra times muito difíceis. Se não tivéssemos perdido pontos em casa, contra Cruzeiro e Sport, estaríamos ainda mais perto da liderança (o Inter está na quarta colocação). Agora, terá a vantagem de jogar somente o Brasileirão, enquanto que os outros clubes da ponta de cima estarão envolvidos em outras competições. Além disso, a tabela será menos exigente para nós, embora este não seja um fator que decrete a vitória, pois os times jogarão atrás contra o Inter, retrancados, mas acho que o time tem totais condições de chegar à Libertadores.
D'Alessandro é o tema do momento: ele deve voltar ao time ou ficar na reserva?
D'Alessandro é titular. Sem dúvidas.