Um dos principais investimentos do Grêmio para a temporada não usa chuteiras, nem está à beira do campo nos estádios. Fernando Lazaro, profissional contratado no final do ano passado para coordenar o setor de Análise e Desenvolvimento do Departamento de Futebol, chegou a treinar o Corinthians em 2023, mas foi nos bastidores que construiu um trabalho decisivo para os títulos conquistados pelo time paulista.
Fernando Lazaro começou a trabalhar no Parque São Jorge em 1999. Em todos esses anos, teve com Tite a relação mais próxima — e de maior sucesso. A parceria rendeu tantos frutos que o profissional, filho do lateral Zé Maria, ídolo corintiano dos anos 1970 e 1980, é citado em diversos trechos da biografia do técnico gaúcho, escrita e lançada em 2016 pela jornalista Camila Mattoso.
O livro trata da vida de Tite em todas as dimensões, do pessoal ao profissional. E é nesta segunda área que Lazaro ganha protagonismo, no comando do Centro de Inteligência do Futebol (Cifut) do Corinthians.
A forte conexão fica clara em uma das histórias relatadas na publicação, quando em 2 de janeiro de 2013, o analista atendeu a um telefonema de Tite durante as férias, na madrugada. Dormindo, Lazaro estava em um país com fuso de quatro horas a menos com relação ao Brasil, e o treinador, sem se dar conta da diferença, pediu uma lista de conteúdos para um reunião que viria a ser realizada depois.
O Cifut mantinha um grupo de WhatsApp com Tite. Pela ferramenta, o técnico podia pedir materiais, como lances de partidas do Corinthians ou de outros times, para serem estudados. Fernando Lazaro é descrito como alguém que soube lidar como o perfil workaholic (24 horas conectado no trabalho) de Tite. A amizade, baseada no profissionalismo de ambos, fez com que Lazaro fosse convidado para integrar a equipe da Seleção Brasil no ciclo para a Copa do Mundo de 2018.
Relação com atletas e tecnologia
O livro de Camila Mattoso conta que Lazaro, além de corresponder às demandas de Tite, foi um incentivador do uso de novas estratégias para melhorar o rendimento do time. Entre elas, a da utilização de vídeos enviados pelo WhatsApp para os jogadores, a fim de corrigir erros em campo.
Tite viu esse método em fevereiro de 2014 quando visitou o Arsenal, na Inglaterra, durante seu ano sabático após ter conquistado quase tudo pelo Corinthians: Brasileirão (2011), Libertadores (2012), Mundial (2012), Paulistão (2013) e Recopa-Sul Americana (2013).
A comissão técnica de Arsène Wenger (treinador do Arsenal) compreendia que os atletas assimilavam melhor as suas funções quando as orientações eram passadas de forma personalizada. Tite já utilizava as imagens nas preleções, mas para o grupo de forma geral. A ideia dos vídeos curtos e enviados individualmente também havia sido cogitada por Lazaro, que conheceu o mesmo comportamento no Chelsea, em 2012.
Tite colocou a ideia em prática após retornar ao Corinthians em 2015. No mesmo ano, o clube passou a utilizar uma grua (minielevador móvel como uma câmera) no Centro de Treinamentos Joaquim Grava.
O equipamento, adquirido por iniciativa de Lazaro, nos Estados Unidos, possibilitou que os treinos pudessem ser filmados em toda a extensão do campo. Assim, se um gol sai pelo lado direito, a comissão técnica consegue ver qual foi a movimentação do time na parte oposta do gramado, por exemplo.
No retorno de Tite, o Corinthians ainda levou o Brasileirão de 2015. Nas duas passagens, o Cifut, do qual o Grêmio pretende os seus melhores aspectos, se configurou em um braço tecnológico para o aperfeiçoamento da equipe dentro das quatro linhas.
Logo após o término das partidas, a comissão técnica tinha acesso ao compacto com os lances mais importantes. Camila Mattoso reforça que não eram os "melhores momentos" para o torcedor, e sim trechos recortados conforme tópicos previamente estabelecidos por Tite, o auxiliar Cleber Xavier e os demais integrantes da comissão. A edição obedecia a itens como iniciação pelo lado direito, perde-pressiona, cruzamento com a bola no "funil", exemplificou a jornalista.
— A geste busca lances que tenham a ver com a ideia do jogo, do nosso padrão. Uma cobertura que não foi bem feita, uma bola parada, alguma tema específico que a gente tenha treinado na semana — explicou Fernando Lazaro para Camila Mattoso, em depoimento que consta no livro sobre Tite.