O vice de futebol Paulo Caleffi recebeu a reportagem de GZH em sua sala no CT Luiz Carvalho na última quinta-feira (18). Escolhido pelo presidente Alberto Guerra para representar a renovação na política do Grêmio, o dirigente de 40 anos viveu 60 dias de uma mudança intensa. Teve que agregar uma rotina diária no Grêmio com a vida profissional de advogado criminalista, sem abrir mão da atenção aos três filhos e o papel de pai.
Na conversa de quase duas horas, o dirigente contou como Luis Suárez passou de sonho a realidade no Grêmio com o auxílio de Lionel Messi. E como a parceria com Antonio Brum na gestão do departamento de futebol aposta em Renato Portaluppi. Caleffi quer possibilitar que o técnico possa se dedicar apenas com as questões de campo, com a direção responsável por todas as demais questões da rotina do CT. Confira abaixo os principais trechos da conversa.
Como foram esses primeiros 60 dias de trabalho?
Tivemos um cenário atípico. A eleição teve seu desfecho em novembro, e quatro dias depois estávamos gerindo o clube. Foi um cenário que nos fez ter velocidade para agir. Quando enxergamos que ganhar a eleição era plausível pelo contexto que víamos, adiantamos muita coisa em termos da carência do elenco e nomes de jogadores. A questão fundamental foi justamente a equipe que encontramos no departamento de futebol. Encontramos pessoas muito capacitadas, e que não eram utilizados ao seu máximo. Todo o pessoal do clube. Naquele momento que ingressamos, reuni todos e disse que precisava do que eles tinham de melhor para dar. Pedi para que alinhassem o que fosse necessário e reportassem para a tomar a decisão. Eles são a verdadeira engrenagem do futebol do Grêmio. Os instiguei a dar o máximo, até pelo próprio relato deles, era o que faltava nos últimos anos. De que desenvolvessem e apresentassem ideias e que isso não seria vetado em instâncias superiores
Qual tua relação com o futebol e como surgiu o Grêmio?
Minha relação com o Grêmio é familiar. Meus pais e meu irmão são gremistas. Frequentei o Olímpico desde meus seis anos. Sempre fomos fanáticos. Um jogo marcante é a Copa do Brasil de 1989. Demoramos a entrar e tivemos de sentar na escadinha. Viajei em diversas partidas de Libertadores e Copa do Brasil. Meu irmão se afastou um pouco e comecei a viajar com um grupo de amigos. Conheci países por causa do Grêmio. Colômbia, Paraguai, estive no Mundial de 2017 (nos Emirados Árabes Unidos). Um ano e meio atrás, antevendo um cenário delicado ao Grêmio e sem perspectivas de escapar do rebaixamento, comecei a conversar com o (Alberto) Guerra para construirmos um cenário. Guerra, mesmo jovem, tinha uma trajetória e que ele seria um nome forte para o pleito.
E a função de vice de futebol. Era um desejo ter esse contato mais próximo com o clube?
Nunca almejei essa posição. São cenários que ocorrem. Existe um dinamismo. Meu nome surgiu e foi avalizado pelo Conselho de Administração. Obviamente que já era sabedor de que o Antonio Brum seria diretor, e isso era um cenário indispensável. O Antonio é um grande amigo, temos uma relação muito próxima. Nessa construção do ambiente de reconstrução do clube, preciso ter alguém da minha confiança. Alguém que eu saiba que não irá puxar meu tapete e nem que teríamos trairagem.
Como se passa de advogado criminal a responsável por contratar reforços para o Grêmio?
Meu ambiente de trabalho envolve muita negociação. Mudamos o objeto, mas a forma de negociar é similar. Primeiro temos os alinhamentos impostos pela gestão do presidente Guerra, mas também as questões que não podemos nos afastar. Situações de conduta, imposição pessoal que não abrimos mão em nenhuma das negociações. Isso foi tranquilo. Talvez mude a sistemática de atuação. Identificar algumas questões trazidas por empresários inicialmente, que surpreendiam. Mas depois vinha a clareza do que estavam buscando. Mas não houve nenhuma dificuldade em exercer essa situação. Foi uma readaptação do que faço no meu trabalho.
Qual foi teu primeiro contato com Renato?
As primeiras conversas foram pela renovação do Renato. Agendamos a ida ao Rio de Janeiro, mas as indicações de negociações eram tratadas desde um momento anterior com o Renato. As indicações dele já avançamos, juntamente com as nossas. Foi colocar confiança no pessoal, fazer eles entenderem que eram os pilares do nosso trabalho. E depois contatar os empresários para a construção de um novo time.
Como se senta com um ídolo como o Renato, mas que é um funcionário do clube, ao definir sua renovação?
O Renato já tinha colhido informações com o Guerra, do ambiente do CT. Ele recebeu boas referências, o que facilitou nossa conversa no Rio. Fora isso, que estreitou muito a ligação com o Renato, é o perfil pessoal. Eu e o Antonio somos voltados no nosso ambiente particular a ter uma relação mais descontraída. Quando o Renato veio com uma piada, veio a devolução. Isso gerou um ambiente que alicerçou a relação. Ele é muito inteligente. Temos de desconstruir essa imagem do Renato interventor, alguém que quer dar palpite em todas as horas. Esse foi meu compromisso quando sentamos para conversar sem o Guerra. Que ele teria total confiança que a atenção dele poderia ser exclusivamente com a questão técnica. Que todo o ambiente externo ele poderia deixar conosco, que não precisaria mais se desgastar para tratar de problemas administrativos. Não dá para ser assim. Ele não precisa se desgastar com o que não seja questão técnica. Temos uma excelente relação, de termos conversas fora do CT. Isso facilita qualquer processo. Quando estou aqui, não olho para o ídolo, mas para o técnico Renato Portaluppi e por alguém que quer o mesmo que eu. Que é ver o Grêmio vencedor. Tenho convicção que isso dará resultado.
A janela do Grêmio foi de muitas movimentações. A direção entende que sanou as carências?
Entendemos que foi uma excelente janela para o Grêmio e uma primeira grande notícia, ao nosso entender, foi a renovação com o Kannemann. Só de acompanhar os treinamentos, de ter uma proximidade com ele, ver a forma como ele conduz o dia a dia e principalmente o ambiente do vestiário antes da final da Recopa, nos assegura que o Kannemann foi a primeira grande contratação que fizemos para esta temporada. Mas não foi só ele. O próprio Fábio, eu tenho a convicção de que ele vai entregar muito. O Reinaldo tem uma grande trajetória pelo São Paulo. Temos o Galdino, um destaque da Série B, tremendo finalizador e que também vai nos agregar qualidade. O Pepê, o Renato brinca que enxerga o Maicon jogando. De fato, até a questão de postura. Se ele levanta as meias, talvez a gente depare com um Maicon até mais bonitinho (risos). O João Pedro agora, mais recentemente, é um jogador que estamos apostando em uma retomada. E tem mais o Suárez. Só o Suárez...
A retomada das negociações com Suárez aconteceu por uma ligação feita para você..
A grande questão desta ligação foi que os mesmos agentes que finalizaram a negociação do Felipe Carballo, eles acabaram realizando a operação Luis Suárez. E naquele dia, 15 de dezembro, era o aniversário da minha namorada, tínhamos concluído a negociação pelo Carballo. Então, estava um ambiente de descontração, alegria. São 22h30min e vem a ligação do empresário. Pensamos que iria comemorar junto com a gente. Atendo a ligação, mas o cara começa dizendo assim: "Paulo, caiu o negócio!". Quando ele falou isso, eu digo: "Como assim? Está de brincadeira?". Eu fico branco, o Guerra e o Antonio notam, ficam preocupados. E então, ele complementa: "Caiu o negócio do Suárez nos Estados Unidos". E então a minha reação foi: "Ai, meu Deus do céu!". E os dois perguntaram o que aconteceu. Então, eu digo: "Te ligo amanhã de manhã cedo, me deixa pensar um pouco". Eu desligo e falo: "Aconteceu o que a gente temia que fosse acontecer", por causa daquela coletiva que ele deu na Copa do Mundo, na pergunta do Rodrigo Oliveira.
O peso do vazamento do interesse no Suárez na época da campanha teve influência?
A gente sofreu na época da eleição de que era mentira e um estelionato eleitoral. Ficamos quietos. Sempre deixamos claros que ofertamos uma carta de intenções, sem a logomarca do Grêmio, mas com o timbre da campanha do Guerra, com o endereço do site e do Instagram. E ponderamos aos agentes que, havendo a vitória na eleição, tínhamos o compromisso de cumprir com aquilo que estava no papel. Mas na semana da campanha veio a informação de cenários que impossibilitavam a negociação. Não chegamos a conversar com o Luis na época da campanha. Quando ele veio em uma coletiva de Copa do Mundo e diz que agradece ao carinho e a proposta, ficou um ambiente de dúvida para nós, de que o sujeito se interessou mais do que os agentes nos transmitiram.
Messi teve mesmo participação na decisão de Suárez?
Veio a indicação dele de que o Messi questionou: "Se tens a disponibilidade de jogar em um futebol competitivo, vai para o Grêmio sem pensar". Porque a outra proposta que ele tinha era do futebol mexicano. Tive acesso à proposta e era um negócio mirabolante, mesmo para o Luis Suárez, que é um jogador de referência mundial e escolhe onde quer jogar. Até por eu ter visto a proposta mexicana, sem dúvidas Suárez escolheu jogar no Grêmio. Não tem grau nenhum de comparação.
A distância dificultou a negociação?
Nossos contatos, às vezes, eram rompidos por isso. Em um primeiro momento, seguimos bem. Até que começaram a existir, por um lado e outro, determinadas ponderações que não nos deixavam chegar a um consenso. Aí surge a história que virou meme. Eram 23h, vou tomar um banho e levei meu telefone comigo. Surge a chamada do Luis Suárez por vídeo e o agente. Pensei: "Não pode ser algo ruim". Atendo sem camisa, peço desculpas, ele me olha e começa a dar risadas, porque ali já tínhamos uma boa relação. Então, ele indica que estava optando pela proposta do Grêmio, começamos a ter algumas conversações e ele quis saber se na apresentação dele teria torcida. Eu disse: "Luis, na tua apresentação vai ter um estádio cheio. Na tua chegada a Porto Alegre, vai ter 10 mil pessoas te esperando no aeroporto". E ele dá um sorriso com aquilo, um pouco incrédulo e diz: "Olha que na minha apresentação no Nacional tinha 20 mil pessoas". Respondi: "Não vou te falar nada, só espera" . Tanto que tem uma foto do Lucas Uebel (fotógrafo do clube), que é após ele falar com os torcedores e me cumprimentando. Ele abriu um sorriso e eu falei: "Eu te avisei".
O Grêmio já conta com todos os parceiros para bancar o salário de Suárez?
A operação Suárez está garantida. Temos situações burocráticas que estão sendo tratadas. Os dois que foram apresentados com o Luis, na festa da Arena, é que já tinham seus contratos firmados. Isso, obviamente, se estende aos dois anos. Nós, em hipótese alguma, teríamos um movimento de concretizar uma negociação destas se não fosse algo seguro e não tivéssemos a convicção no retorno que ela traria nos dois ambientes do clube: o principal, que é dentro de campo, mas também a questão externa, com a movimentação do torcedor no quadro social e para a aquisição de produtos que serão desenvolvidos em parceria com o atleta.
Existe convicção de que Suárez dará retorno esportivo?
Futebol traz, algumas vezes, percalços que são subjetivos e não temos controle. Falo especificamente de uma lesão. Estou batendo na mesa aqui para não ocorrer. Agora, não havendo nenhum obstáculo neste sentido, tenho absoluta convicção de que ele vai entregar dentro de campo. E não é pelo que vi na Recopa, mas pelo que vejo nos treinos. Não é só qualidade, é postura. Agora temos o Kannemann gritando atrás e o Luis gritando na frente. Isso demonstra que, de fato, quando ele optou pelo Grêmio, ele falou exatamente o seguinte: "Paulo, eu não estou fazendo turismo. Não vou tirar férias no Brasil. Eu quero jogar e quero ganhar". Então, é incompatível pensar alguém que não vai entregar tudo que tiver dentro de campo. E isso que nos permitiu evoluir na negociação.
O Gauchão é tratado com o mesmo peso de Brasileirão e Copa do Brasil?
O Grêmio sempre tem de ganhar. Não pode tolerar a derrota. Se pudermos vencer e desempenhar um bom futebol, excelente. A gente atingiu os dois objetivos. O Grêmio trata o Gauchão no mesmo patamar de importância porque o Grêmio tem a obrigação de ganhar. Em relação à Copa do Brasil, o Grêmio vai buscar o título e, no Campeonato Brasileiro, estar sempre entre os postulantes. O Grêmio não pode é estar afastado daquele contexto de quem está na frente da tabela. Este é o nosso objetivo: estar sempre no pelotão de frente.
Após 10 contratações, o Grêmio ainda pensa em buscar mais reforços nesta janela?
Vamos iniciar o Gauchão com este elenco. A partir disso, vamos fazer análises. Se entendermos que há uma emergência em aportar algum reforço, isso vai ser discutido com o presidente Guerra e o Conselho de Administração para viabilizarmos isso. É importante o torcedor ter claro que um esforço enorme foi feito para a realização destas contratações e que nós não podemos nos afastar de um ambiente de dificuldade financeira que o Grêmio tem enfrentado.
O Grêmio segue interessado em Michael?
O Grêmio vai verificar uma viabilidade de uma eventual operação.
A situação do Douglas Costa está resolvida?
O estafe do Douglas solicitou uma conversa com o presidente Guerra. Esta conversa aconteceu no Litoral, não se avançou em nada sobre negociação, não se tratou nada sobre um retorno dele, afora a sinalização do próprio jogador de que seria a sua vontade. Não existiu uma segunda conversa e não tem nenhuma tratativa em aberto neste sentido. Não foi analisado em nenhum momento.