— Aqui na Austrália, eu vivo um sonho todos os dias.
Já faz cinco anos que a administradora Thais Mayer, 31 anos, largou tudo no Rio Grande do Sul em busca de uma vida nova na Austrália, ao lado do noivo Diego Cardoso, 33. Hoje trabalhando como faxineira, em Adelaide, no sul do país, a gaúcha de Viamão tem um padrão de vida muito melhor do que tinha no Brasil, onde era auxiliar administrativa de uma grande empresa.
— Trabalho mais de oito horas por dia fazendo faxina em casas e escritórios e consigo fazer coisas que jamais sonhei. No Brasil, eu só conheço Santa Catarina e Rio de Janeiro. Aqui nós já viajamos muito, falta só conhecer um Estado. Fomos ano passado nos shows do Ed Sheraan e do Bruno Mars, que eu jamais imaginei que conseguiria ir. Além da facilidade que temos para comprar casa, carro, celular, computador, relógio... No Brasil, eu jamais conquistaria tudo que tenho aqui — conta.
A facilidade para ter uma vida de alto padrão é o que mais encanta os gaúchos que a reportagem de GZH conheceu na Austrália ao longo de pouco mais de duas semanas de cobertura da Copa do Mundo Feminina. O caxiense Cássio da Silva, 28 anos, por exemplo, vive em Gold Coast há apenas cinco meses e se impressionou com a facilidade para arrumar emprego com salários atrativos.
— Sou garçom e ganho o triplo do que ganhava no Brasil na área de TI. É incrível. Aqui na Austrália, todas as pessoas, independentemente da profissão, tem acesso a qualquer coisa. Seja faxineiro, garçom, carpinteiro, todo mundo consegue comprar um celular bom e ter um carro. Quero viver na Austrália para sempre — relata.
Mais do que o bom salário, os gaúchos que moram na Austrália enfatizam o reconhecimento que os australianos dão para profissões que no Brasil são pouco valorizadas.
— A Austrália devolve a dignidade. No Brasil, a gente rala e, por mais que se esforce, muitas vezes não é reconhecido. Aqui, se eu me esforçar, eu sei que eu vou ser valorizado, independentemente da profissão. O advogado ganha o mesmo que um faxineiro. Eles precisam de mão de obra, então a profissão que menos paga já te dá uma condição de viver bem. É o país da oportunidade — descreve Guilherme Gomes, 31 anos, que é gaúcho de Canoas e mora há cinco anos em Brisbane, onde trabalha na área de TI.
No país da Copa Feminina, o salário mínimo é de aproximadamente 23 dólares australianos por hora, cerca de R$ 73. Em uma jornada de 40 horas semanais, isso significa quase 3,7 mil dólares australianos por mês, ou R$ 11,5 mil mensais.
— Com uma hora de trabalho eu compro 1kg de picanha. Tu já imaginou isso no Brasil? — questiona Guilherme.
Mas a maior valorização não é financeira. Durante a passagem da Seleção Brasileira por Brisbane, a reportagem conversou sobre esse assunto com Kur Monjok, 31 anos, que é natural do Sudão e mora na Austrália há mais de dez anos, conciliando os trabalhos de eletricista e motorista de aplicativo. Muito mais do que o bom pagamento que recebe por seu trabalho, Kur ressalta a ausência de discriminação social na sociedade australiana.
— Ao contrário do teu país e do meu, aqui as pessoas não são julgadas por seu trabalho e sua condição financeira. As pessoas muito ricas não se consideram melhor que ninguém por causa do dinheiro que têm. No Sudão ou no Brasil, parece que o trabalhador precisa servir aos mais ricos. Aqui, independentemente do dinheiro que têm, todos dividem a mesma sociedade — resume.
Por outro lado, para prosperar na Austrália, os brasileiros precisam estar dispostos a seguir carreiras que no Brasil são pouco valorizadas.
— Aqui nós precisamos quebrar essa barreira que temos no Brasil de considerar determinados serviços subempregos. Na Austrália, as pessoas pagam muito bem para ter uma pessoa que realmente cuide bem da casa delas e elas valorizam muito isso. Os serviços básicos na Austrália são muito valorizados — explica Thais Mayer, ex-administradora e hoje faxineira com orgulho.
Além das boas oportunidades de emprego, impressiona a qualidade de vida australiana. Seja em Adelaide, Brisbane ou Melbourne, onde acompanhamos a Seleção Brasileira no Mundial, todas as ruas e avenidas são bem pavimentadas. No trânsito, impera o respeito às leis. Mesmo em Melbourne, onde os engarrafamentos são similares aos de São Paulo, não se ouve buzinas. E não há relatos de assalto.
— Ando na rua à noite e mexendo no celular sem nenhuma preocupação, mesmo sem mulher — resume a arquiteta Marina Amado, 31 anos, natural de Caçapava do Sul e que vive em Brisbane com o namorado Marcelo Fagundes, 35, também de Caçapava do Sul.
— Temos segurança, infraestrutura e qualidade de vida. Certa vez, eu e a Marina viajamos de carro de Brisbane até Sydney. São quase 1000 quilômetros, e ao longo de toda estrada havia banheiros limpos, sempre com sabonete e água quente. Aqui o dinheiro dos impostos realmente volta para a sociedade — destaca Marcelo, que era administrador de empresas no Brasil e hoje trabalha em Brisbane como operador de empilhadeiras.
Contudo, para se adaptar à vida na Austrália, os brasileiros precisam mudar alguns hábitos. Por conta da cultura importada pela colonização britânica e pelo alto preço da mão de obra, os estabelecimentos comerciais e restaurantes fecham muito mais cedo que no Brasil. O horário comercial normalmente termina às 17h e, depois das 21h, é difícil encontrar lugares abertos.
— Eu trabalho em restaurante. Chegou o horário de fechar, fechou. Não tem "choro" — resume o auxiliar de cozinha Bruno Ribeiro, 23 anos, gaúcho de Caxias do Sul e que mora há cinco meses em Gold Coast.
Segundo o ultimo censo australiano, a população do pais é de cerca de 25,7 milhões de pessoas, sendo que cerca de 25% são imigrantes e pouco mais de 46 mil são brasileiros. Não há uma estimativa oficial de quantos deles são do Rio Grande do Sul, mas a quantidade de gaúchos, especialmente em Adelaide e Brisbane chamou atenção da reportagem durante a Copa do Mundo Feminina. Normalmente, eles viajam à Austrália atraídos pela facilidade de conseguir o visto de trabalho ou de residência permanente, pois o processo é muito mais ágil do que nos Estados Unidos ou na Europa, por exemplo.
— Eu e minha esposa chegamos à Austrália em 2014 e moramos três anos em Sydney. Porém, para conseguirmos o visto permanente, tivemos que nos mudar para Adelaide. Pela necessidade de mão-de-obra, o governo dá facilidade para quem quer trabalhar em cidades mais regionais, como Adelaide ou Perth (na costa oeste do país) — explica o analista de dados Bruno Melos, 37 anos, gaúcho de Cachoeirinha.
Além disso, ao contrário de outros países, não é necessário ser fluente na língua local para conseguir uma primeira oportunidade.
— Muitas pessoas chegam sem ter um bom inglês e, mesmo sem experiência na área, já conseguem trabalho em menos de um mês — conta a designer Tamires da Rosa, 32 anos, gaúcha de Estância Velha e que mora há cinco anos em Brisbane.
Outra característica das grandes cidades australianas é a integração entre natureza e espaço urbano. Tanto Brisbane quanto Melbourne, duas das mais populosas do país, possuem grandes parques em meio aos prédios, sempre com uma extensa rede de pistas de corrida e ciclovia.
— Aqui, de um lado do rio, você vê muitos prédios imponentes, de primeiro mundo. Do outro lado, você vê uma praia artificial e uma área toda verde. É muito legal esse contraste — ressalta Matheus Spirandorello, 30 anos, natural de Porto Alegre e que mora há sete anos em Brisbane, onde dá aulas de futevôlei.
Se para a Seleção Brasileira Feminina o sonho do inédito título mundial foi adiado, para milhares de gaúchos o sonho australiano já é uma realidade.
Durante a Copa do Mundo Feminina, GZH tem edições especiais do "Expresso da Copa" para repercutir a competição que ocorre na Austrália e na Nova Zelândia. O programa é realizado de segunda a sexta-feira, das 11h às 11h30min, no Youtube de GZH e no Gaúcha 2.