A promessa era de que o Brasileirão de 2021 iria trazer maior estabilidade aos treinadores. Com o voto de 11 dos 20 clubes da Série A — entre eles, o Inter — foi aprovada, no final de março, a proposta que limitava a uma por time as mudanças das comissões técnicas ao longo do campeonato. Na prática, viu-se uma diminuição na dança das cadeiras, mas também um novo termo jurídico tomou conta do noticiário esportivo: "saída em comum acordo".
Até a nona rodada do Brasileirão do ano passado, sete treinadores haviam sido desligados. Nesta temporada, este número caiu para quatro. Destes, porém, apenas um foi dispensado pelo clube — Alberto Valentim, logo após estrear com empate pelo Cuiabá. Em seguida, com três derrotas consecutivas, foi a vez de Lisca pedir demissão no América-MG. Por fim, coube aos gaúchos inaugurarem o debate em território nacional: demissão ou comum acordo?
— O que posso dizer é que, com o treinador, encontramos uma solução em conjunto para a sua saída — declarou o vice-presidente de futebol colorado João Patrício Herrmann ao anunciar que Miguel Ángel Ramírez não continuaria no clube após comandar a equipe por duas rodadas e, acometido pela covid-19, não estar presente na eliminação da Copa do Brasil para o Vitória.
— Nós chegamos à conclusão de fazer isso em comum acordo, por conta dos resultados que nós não atingimos dentro do campeonato nacional. Eu queria agradecer de modo especial a ele pela dedicação e trabalho ao longo destes 70 dias que esteve conosco — argumentou o vice de futebol gremista Marcos Herrmann, tendo Tiago Nunes ao seu lado, passadas sete partidas sem uma única vitória no Brasileirão. Na época da definição da nova regra, o Grêmio era contrário e foi voto vencido.
A medida adotada pelos dirigentes gaúchos está baseada no artigo 32 do Regulamento Específico da Competição, que impõe a limitação de apenas "uma demissão de treinador sem justa causa, por iniciativa do clube". Segundo este artigo, "a rescisão indireta por iniciativa do treinador ou a rescisão por mútuo acordo não serão computadas para os efeitos deste parágrafo". Ou seja, Inter e Grêmio não se enquadram na limitação de demissões e poderão, se for necessário, desligar mais um profissional até o final do campeonato.
— A aprovação pelos clubes dessa controvertida limitação me surpreendeu, e penso que ocorreu, fortemente, em razão da rescisão por mútuo acordo não computar, o que faz total sentido. O problema é se essa questão do comum acordo vir a ser utilizada como um subterfúgio, esvaziando por completo a eficácia da norma. Portanto, cada caso deve ser examinado — analisa Bernardo Sarate Pozza, advogado especialista em direito desportivo consultado por GZH.
Exemplo de Minas Gerais
A limitação também foi aplicada na Série B, em que está o Cruzeiro. Há um mês, o clube comunicou a saída do técnico Felipe Conceição. Nesta semana, porém, o profissional recorreu à Câmara Nacional de Resoluções e Disputas (CNRD) para questionar a rescisão contratual proposta pelos mineiros.
Conforme publicou o ge.globo, o documento dispõe que houve um desligamento em comum acordo, o que "não condiz com a realidade". Desta forma, sem ainda ter oficializado sua saída do clube, Conceição não teve seu nome divulgado no Boletim Informativo Diário (BID) da CBF e, assim, não pôde estrear pelo Remo, seu novo contratante.
— Se um clube não quer mais contar com os serviços do treinador e aí rescinde unilateralmente o seu contrato de trabalho, não há dúvidas de que estamos diante de uma dispensa sem justa causa, mesmo que se faça, posteriormente, um acordo no tocante às verbas rescisórias — completa Pozza.
Relembre os técnicos demitidos no Brasileirão 2021
Alberto Valentim (Cuiabá)
Dispensado após empatar por 2 a 2 com o Juventude na estreia.
Lisca (América-MG)
Pediu demissão depois de três derrotas consecutivas, contra Athletico-PR, Corinthians e Flamengo.
Miguel Ángel Ramírez (Inter)
Comandou o Inter apenas nas duas primeiras rodadas, empatando com o Sport no Beira-Rio e sendo goleado pelo Fortaleza, fora de casa. Ao testar positivo para covid-19, não acompanhou a delegação na vitória sobre o Bahia, em Salvador, pela terceira rodada, e nem na partida de volta contra o Vitória, quando o time foi eliminado da terceira fase da Copa do Brasil.
Tiago Nunes (Grêmio)
Dirigiu o time em sete partidas, sem ter conquistado uma única vitória, deixando o clube na lanterna do campeonato.