Ao colocar as chuteiras importadas no vestiário da Arena, a torcida gremista ainda urrando o nome de Dida, o mesmo goleiro que atacou o seu pênalti, o quinto e decisivo, uma descalibrada cavadinha, Pato desabou. Chorou como um guri de 10 anos na frente dos colegas, da comissão técnica, de seguranças e de funcionários do Corinthians, dono de quase 17% de toda a torcida brasileira. A cena é rara.
Aos 24, quase sete de carreira entre Inter, Milan, Corinthians e Seleção, Alexandre Rodrigues da Silva, paranaense de Pato Branco, o guri que seguiu para a Europa em 2007 com planos de ser o número 1 da Fifa em pouco tempo, às vezes, aparenta ter ancorado nos 17 anos. Parece disposto a não deixar uma idade tão confortável, ainda mais com uma conta bancária recheada de milhões de reais, dinheiro que bilhões com mais de 60 anos nem sonham em ter um dia mundo a fora. Dunga não o levou para a Copa do Mundo da África do Sul de 2010 por absoluta falta de maturidade e, claro, disposição.
Ao sair do vestiário, umas horas depois, era o único que procurou o ônibus do time, que perdeu as quartas de final da Copa do Brasil para o Grêmio, seguido por um segurança com ar de um Mike Tyson em forma. Os 1m79cm do jogador aparentavam menos ao lado da escolta. Ele parecia ter encolhido.
Não quis falar aos repórteres, que buscavam uma frase de arrependimento, um linha de pesar. Quase 270 profissionais da mídia, dezenas deles, envolvidos com as 25 rádios que contaram a partida, queriam ouvir a sua voz. Os microfones o capturaram antes, ainda tentando entender a absurda falha no pênalti, quando ganhou a ira dos corintianos, virou alvo das redes sociais, com os protestos varando a madrugada no Brasil.
- Treinei assim e bati assim. Queria bater assim - disse, sem mostrar um milímetro de emoção, como se a falha monumental pudesse sumir a medida que o estádio se calasse com o desembarque da madrugada, como se o desdém da cavadinha representasse o mesmo que um chute na Lua com todo o vigor de um jovem.
Sangue nas veias é o que cobram de Pato. É o que o Milan não conseguiu tirar do atleta depois de seis anos no norte rico do país. O PSG ofereceu R$ 85 milhões em 2012. A namorada de Pato na época, Barbara Berlusconi, não o deixou trocar Milão por Paris. O pai, o bilionário Silvio, dono do clube e da Itália, concordou. Sairia no ano seguinte por 50% deste valor, sem a mínima oposição da família Berlusconi, após disputar, por exemplo, cinco edições do Campeonato Italiano e marcar 36 gols.
No Milan, a crítica e o elogio eram absorvidos da forma quase idêntica em dia de gol, cada vez mais raros, em noite de erros, quase comuns. Ninguém notava uma reação. A conduta no Brasil é a mesma desde janeiro. No Corinthians, Pato porta-se como uma celebridade, o futebol chega sempre depois. Não o associam com bebedeiras, nunca, mas como o brilho das festas com famosos globais, cantores, modelos, bares, restaurantes e endereços de chefs da hora. Os atores são réplicas nacionais das suas companhias europeias, iniciado por Ronaldinho e Robinho na década passada. O gaúcho, coisa de revista de fofoca, foi acusado de ter ajudado a complicar a sua vida com Stephany Brito, a ex-mulher que o levou a Justiça.
O comportamento de Alexandre Pato é acompanhado de longe pelos colegas corintianos, que não aprovam. Acreditam que Pato "se acha". Uns admitem que ele não é "tudo isso" em campo. Outros entendem que, pelos valores do seu contrato, o maior da história do Brasil com um jogador que veio da Europa e com salários de Primeiro Mundo, Pato precisaria jogar mais, quase o dobro, ser um ponto de referência. Sem querer, Pato rompeu o equilíbrio de um grupo coeso, humilde e que ganhou o Mundial de Clubes da Fifa do refinado Chelsea acreditando no suor e no trabalho pesado.
Um empresário que o conhece desde guri e o classifica de boa gente, disse nesta quinta:
- Acho que caiu a ficha.
Será o recomeço da vida profissional? Os erros têm o poder de refazer as pessoas. Pato não voltou com os colegas, que foram xingados no retorno a São Paulo. Mesmo distante, camuflado em Porto Alegre, cidade que pouco visita, ele foi o mais atacado pelos revoltados gritos dos torcedores no aeroporto paulista.
Pato se apresenta nesta sexta em São Paulo, treina à tarde. Domingo enfrenta o Santos, em Araraquara. Receberá uma carga pesada da ira da Fiel. Não será ingênua como o Pato Pateta, canção de Toquinho e Vinícius de Moraes, que as torcidas rivais transformaram em hino viral na internet na ressacada quinta pós-derrota. É preciso um tempo para saber se a ficha caiu mesmo. Se ele terá o relógio corintiano a seu favor ou não é outra delicada questão.