Com a pandemia e a interrupção das aulas presenciais, 5,5 milhões de estudantes brasileiros de seis a 17 anos deixaram de estudar em 2020, mostra estudo conduzido por Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Instituto Claro e Cenpec Educação. A soma envolve alunos que abandonaram os estudos e os que estavam matriculados, mas não receberam atividades para fazer em casa.
Em outubro do ano passado, 3,8% das crianças e adolescentes do Brasil entre seis e 17 anos (1,38 milhão de pessoas) deixaram de estudar presencial ou remotamente, acima da média nacional de 2% em 2019, segundo a Pnad Contínua, pesquisa produzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Além disso, 11,2% dos estudantes (4,12 milhões) que diziam estudar não haviam recebido nenhuma atividade escolar e também não estavam em férias. A soma de ambos os grupos leva a 5,5 milhões de jovens que não estudaram na pandemia.
O Brasil tinha, em 2019, 27,78 milhões de estudantes na educação básica em escolas públicas, segundo o mais recente censo escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
O aumento do abandono vem sendo apontado por especialistas como a pior consequência imediata da pandemia na educação. A médio e longo prazos, isso se reverte em aumento da desigualdade social, uma vez que o nível de renda está diretamente associado ao estudo.
No Rio Grande do Sul, 3% dos estudantes de seis a 17 anos estavam fora da escola em outubro do ano passado, abaixo da média nacional de 4% – o Estado tinha 2,3 milhões de matrículas em 2019, segundo o Inep. O pior desempenho é o de Roraima (15% dos alunos sem estudar), e o melhor, de Sergipe e Minas Gerais (2%).
A etapa com pior índice de interrupção dos estudos a nível nacional é o Ensino Médio, no qual 5,1% dos estudantes não frequentavam a escola em outubro. O pior cenário é na Região Norte (7,3% de jovens sem estudar) e o melhor, no Sudeste (4,2%). No Sul, a taxa é de 4,4%, melhor do que a média brasileira.
Estudantes negros e indígenas tiveram menor acesso do que brancos, o que, segundo a análise, reforça a necessidade de políticas públicas voltadas a esses grupos.
— Em muitas escolas, há menos condições de trabalho para o professor do ponto de vista de material de apoio: falta biblioteca, falta banheiro, falta acesso à internet. Precisamos ir atrás desses 5,5 milhões de alunos e garantir que tenham acesso, além de trabalhar para ter a reabertura das escolas. Abrir e fechar, se houver piora, mas sem deixar que 5,5 milhões de fiquem sem acesso à educação — afirmou Ítalo Dutra, chefe de Educação do Unicef Brasil, em coletiva de imprensa na manhã desta quinta-feira (28).
O relatório cita dados da Pnad Contínua que mostram que a Região Sul teve os menores índices de estudantes fora da escola no Ensino Fundamental 1 – 2,6%. Na outra ponta, na Região Norte, a taxa de abandono foi de 7,9%. No Ensino Fundamental 2, o abandono no Sul cai para 1,9% (acima do Sudeste e Centro-Oeste).
Os dados mostram que "a pandemia afetou mais a vida escolar daquele perfil de estudantes que já era mais impactado pela cultura do fracasso escolar: meninas e meninos negros e indígenas, nas regiões Norte e Nordeste", aponta o estudo.
A permanência dos jovens na escola, diz a análise, é resultado "dos esforços das famílias e de suas condições objetivas de promoverem os acessos que as atividades remotas demandam", diz a pesquisa.
As aulas começaram a ser interrompidas no Brasil em março, com o registro dos primeiros casos oficiais de coronavírus. Governadores, prefeitos e analistas em educação reclamaram da falta de atuação do Ministério da Educação (MEC) para elaborar ações que norteassem gestores do país. Como resultado, cada rede teve que se organizar para pensar em um jeito de manter as aulas de forma remota.
Uma boa notícia é que, entre julho e outubro, a frequência escolar dos brasileiros entre 11 e 17 anos aumentou – segundo o estudo, isso sugere que o esforço de gestores "das diferentes instâncias dos sistemas educacionais e de familiares pelo aporte de mais e melhores condições de acesso às atividades vêm alcançando resultados positivos". No entanto, caiu ligeiramente o engajamento de crianças de seis a 10 anos.
O relatório destaca que a crise econômica advinda da pandemia reduz a arrecadação de impostos, que são a principal fonte de financiamento da educação pública. “Esse cenário pode ameaçar a garantia do direito à educação, expresso pelo acesso, permanência e sucesso escolar”, diz o estudo.
O balanço tende a agravar a situação que era vista em 2019, quando 2,1 milhões de estudantes foram reprovados no Brasil, cerca de 620 mil abandonaram a escola e mais de 6 milhões estavam em distorção idade-série (atrasados no ano).