Nos bastidores de Brasília, a nomeação do professor Carlos André Bulhões Mendes como novo reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) já é dada como certa. Interlocutores com forte ligação com o governo, como o deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS), garantem que a escolha da chapa integrante da lista tríplice mais alinhada com o Planalto será formalizada entre esta quinta-feira (10) e a sexta-feira (11).
A chapa de Bulhões, que é professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH), e da também docente Patrícia Helena Lucas Pranke foi a menos votada tanto na consulta acadêmica promovida pela UFRGS quanto na eleição do Conselho Universitário (Consun), que definiu a lista tríplice encaminhada ao Ministério da Educação (MEC). O MEC, por sua vez, encaminhou os nomes ao presidente Jair Bolsonaro após análise. Mesmo com as votações, Bolsonaro tem a prerrogativa legal de optar por qualquer uma das três chapas que integram a lista.
Além de Bibo Nunes, outro deputado federal do PSL confirmou a GZH a intenção do governo de nomear Bulhões para a reitoria da UFRGS. Conforme o parlamentar, que pediu para não ser identificado, o próprio ministro da Educação, Milton Ribeiro, garantiu que seria essa a chapa escolhida pelo governo.
A aceitação da chapa vencedora nas consultas internas de uma universidade federal pelo governo costuma ser vista como um sinal de respeito à autonomia acadêmica. Desde a redemocratização, apenas em uma oportunidade o nome mais votado pela universidade não foi aceito. Foi em 1988, quando existia uma lista sêxtupla.
Mesmo a consulta acadêmica tendo indicado preferência pelos nomes de Rui Oppermann e Jane Tutikian (atuais reitor e vice) em um sistema que dá maior valor aos votos dos professores do que dos alunos e servidores da universidade, e a eleição no Consun referendando a mesma chapa com 45 dos 77 votos dos conselheiros, isso não significa que esses devem ser os nomes escolhidos para a reitoria.
Como explicou o professor da UFRGS Geraldo Pereira Jotz, em artigo publicado em Zero Hora: "O regramento é claro: a comunidade acadêmica vota entre postulantes; depois, o Conselho Universitário legitima uma lista tríplice; por fim, o presidente escolhe um dos três nomes da lista. Todos os candidatos estavam cientes disso e concordaram com a legitimidade da escolha presidencial".
Depois da nomeação, caberá ao MEC marcar uma data de posse do novo reitor ou reitora. Após, a UFRGS deverá conduzir uma cerimônia interna para a transmissão do cargo e o início — ou reinício — do mandato.
Estudantes organizam protesto contra "intervenção"
Em contato com a reportagem, Bulhões explicou que, em respeito ao processo oficial, prefere não se manifestar e aguardar a posição do governo.
GZH também tentou contato com o primeiro colocado nas consultas internas realizadas pela UFRGS, Rui Oppermann, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Para o Diretório Central de Estudantes (DCE) da UFRGS, a universidade deve buscar a paridade dos votos e defender a autonomia universitária. Para Ana Paula Santos, estudante de Matemática e coordenadora-geral do DCE, os problemas da universidade devem ser resolvidos na própria UFRGS, e não com um "interventor".
— O Bulhões não tem legitimidade, e ele deveria recusar, se for defensor da autonomia universitária — afirma Ana Paula.
O DCE está organizando uma manifestação, marcada para a próxima quinta-feira (17), na reitoria da UFRGS, para contestar a possível nomeação de Bulhões por Bolsonaro.
Entenda a disputa
A possibilidade de Bolsonaro escolher o terceiro colocado da lista tríplice, mais alinhado com o Planalto, para ser o novo reitor tem levado a manifestações favoráveis e contrárias entre alunos, servidores e docentes da UFRGS. Enquanto defensores explicam que essa é uma prerrogativa totalmente legal do governo federal e algo com que os candidatos concordaram ao concorrerem à reitoria, os críticos pontuam que a chapa do professor do IPH — que conta com o apoio, entre outros, do deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS), atuando como interlocutor junto ao governo pela indicação — foi a menos votada tanto na consulta acadêmica quanto no Consun.
Após uma campanha acirrada, os atuais reitor e vice-reitora (chapa 2) foram indicados, por parte da universidade, para seguirem nos cargos. A lista tríplice com os nomes enviados ao MEC foi definida em eleição do Consun em 17 de julho, ocasião em que Oppermann e Tutikian receberam 45 dos 77 votos dos conselheiros. A chapa também foi vencedora junto à comunidade em consulta realizada em 13 de julho. No Consun, a chapa 3 (Karla Maria Müller e Claudia Wasserman) ficou em segundo lugar, com 29 votos, e a chapa 1 (Carlos André Bulhões Mendes e Patrícia Helena Lucas Pranke), em terceiro lugar, tendo recebido três votos.
Na consulta à comunidade acadêmica, a chapa de Oppermann obteve 0,387688 de índice. Em segundo lugar, ficaram Karla Maria Müller e Claudia Wasserman, com 0,251304. A chapa de Bulhões e de Patrícia atingiu 0,120896 de índice. Esses resultados são definidos a partir de uma fórmula que prevê que os votos do conjunto de professores têm peso 0,7, enquanto os dos técnicos-administrativos e dos alunos têm peso 0,15, para um total de 1 (veja, abaixo, como foi a votação das chapas). Terminada a votação, o Consun formalizou o resultado e o encaminhou para o MEC.
* Colaborou Débora Cademartori