Duas pesquisas feitas por estudantes de instituições gaúchas ficaram em primeiro lugar no 28º Prêmio Jovem Cientista, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Um modelo inédito de agricultura urbana rendeu ao universitário Deloan Perini, da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), em Erechim, o reconhecimento máximo na categoria Estudante do Ensino Superior. Já o trabalho de Joana Pasquali, de São Marcos, um kit que detecta substâncias tóxicas no leite, foi eleito o melhor do Ensino Médio.
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Os dois estudos brilharam entre mais de 1,9 mil inscritos nesta edição do prêmio, cujo tema foi Segurança Alimentar e Nutricional. O objetivo da iniciativa é revelar talentos, impulsionar a pesquisa e investir em jovens que procurem inovar na solução dos desafios da sociedade brasileira.
No Rio Grande do Sul, um deles é evitar novas crises na indústria leiteira, marcada por fraudes nos últimos dois anos. Ao saber da Operação Leite Compen$ado, que revelou um esquema de adulteração, Joana, 17 anos, decidiu criar o Detectox: uma fita feita com filtro de coar café, embebida em reagentes químicos, que identifica a presença de contaminantes no leite em apenas um minuto.
Para chegar lá, a menina improvisou um laboratório na garagem. A tábua de passar roupas foi transformada na bancada de experimentos. Uma funerária forneceu as substâncias químicas necessárias para os testes. Assim, ela chegou ao protótipo que rendeu a premiação, dois notebooks, um para si e outro para a orientadora, a professora de metodologia da pesquisa Andréia Gobbi.
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Quando a amostra do leite é colocada em contato com a fita, a reação química entre as substâncias gera três cores diferentes. Cada uma denuncia a existência de uma substância tóxica - o formol, utilizado para matar as bactérias do leite; o hidróxido de sódio, que mascara a validade; e o amido, usado para dar mais consistência ao leite que foi misturado à água. São os tipos de adulteração mais comuns em leites UHT.
A invenção já havia sido apresentada na 4ª Mostra Científica e Tecnológica do Colégio Mutirão de São Marcos, onde a menina estudou até o ano passado (hoje, ela cursa Engenharia de Materiais na Universidade de Caxias do Sul). O manuseio fácil e o baixo preço - o custo é de R$ 4,31 por kit, podendo chegar ao consumidor por cerca de R$ 6,48, conforme os cálculos de Joana - despertaram o interesse.
- Todos queriam um protótipo em casa, quase não tenho mais. A vantagem do meu trabalho está no fato de ele ser bastante aplicável no cotidiano das pessoas - contou Joana.
Hortas urbanas e sustentabilidade
Deloan fez um projeto projeto para transformar terrenos baldios em hortas.
Acadêmico do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFFS, Deloan, 27 anos, observou que Erechim parecia crescer para a periferia, enquanto o Centro acumulava terrenos baldios. Ele se prestou a mapeá-los: 144. Esses espaços vazios deram o clique no estudante, que pensou: por que não transformá-los em focos de agricultura urbana?
A ideia que lhe rendeu o prêmio maior entre os alunos do Ensino Superior é simples: agilizar o abastecimento de alimentos para a cidade por meio de dezenas de hortas urbanas, em um sistema organizado que aproximaria consumidores e produtores. Em cada lote, poderiam ser produzidos alimentos orgânicos como frutas, hortaliças, ervas e temperos.
- O diferencial do projeto está na sustentabilidade. Estimamos que as hortas urbanas de Erechim tenham capacidade para produzir 4,5 quilos por metro quadrado, ou 60 toneladas por mês - explica o jovem, que teve orientação da professora Marcela Maciel, da disciplina Oficina de Desenho.
A pesquisa de Deloan, que veio de Florianópolis para cursar a faculdade, conclui que cada horta poderia ser cultivada por no mínimo três associados, com responsabilidade direta pela manutenção da área. O projeto ainda prevê outros centros de apoio: um banco de alimentos, onde ocorreria a seleção, distribuição e comercialização da produção; um restaurante agroecológico, para onde o excedente seria distribuído; e um centro de compostagem, onde os resíduos orgânicos seriam transformados em adubo ou biogás, matéria-prima para a geração de energia.
Além disso, os produtores urbanos teriam a possibilidade de trocar alimentos ou doar sua produção, recebendo refeições no restaurante como permuta.
- Ainda não viabilizamos a aplicação, mas já dialogamos com alguns setores do município para apresentar a ideia. Elaborei o projeto com a ideia de realmente implantá-lo - explica o estudante, que ganhou R$ 18 mil e uma bolsa de mestrado.
Deloan não teve como objetivo apenas a promoção da segurança alimentar, mote do 28º Prêmio Jovem Cientista. Ele busca também a requalificação dos espaços urbanos, ao incentivar o investimento em áreas públicas e privadas que remanescem ociosas. Outro propósito é o de fazer a população urbana entender a agricultura, relacionar-se com a terra e tomar consciência em relação ao que põe sobre a mesa.