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Miguel Angelo Laporta Nicolelis nasceu em São Paulo em 7 de março de 1961. Em 1989, mudou-se para os EUA para cursar o pós-doutorado, e em 1994 ingressou na Universidade de Duke, onde permanece até hoje. Em 2004, foi eleito pela Scientific American como um dos 20 cientistas mais influentes do mundo. Palmeirense fanático, ameaça roubar a cena na Arena Corinthians, na estreia da Copa, com um boné do alviverde paulista. No Twitter, é contumaz narrador e comentarista dos jogos do time do coração. Publicou, em 2011, pela Companhia das Letras, o livro Muito Além do Nosso Eu.
Na abertura da Copa do Mundo, ali a 12 de junho, o neurocientista Miguel Nicolelis quer pôr um paraplégico a caminhar comandando uma veste robótica com o pensamento. Oito pacientes do projeto Andar de Novo disputam, em testes na Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) de São Paulo, a chance de dar o pontapé inicial do maior torneio de futebol do planeta.
Aventado como promessa de Prêmio Nobel verde e amarelo, Nicolelis já comparou sua empreitada à de colocar o homem na Lua. Quem agora se juntar via Twitter aos 25 mil seguidores do pesquisador da universidade americana de Duke, entretanto, vai não apenas acompanhar o progresso da pesquisa, como ler que "é hora de os brasileiros sérios darem um basta na mídia golpista". Na semana passada, o cientista dedicou a ex-colegas a pecha de "zés manés".
O pontapé da mixórdia foi em julho de 2011, quando 10 pesquisadores - e com eles dezenas de estudantes e técnicos - abandonaram o Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra (IINN-ELS). Os retirantes ganharam espaço na imprensa com relatos de que Nicolelis era autoritário na condução do IINN, negando acesso a equipamentos e centralizando decisões.
Liderada por Sidarta Ribeiro, ex-orientando de Nicolelis, a turma do êxodo criou o Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O racha deu azo a respingos de política. De um lado, gritos de "miguelomania" e concentração de recursos (o governo deu R$ 33 milhões ao Andar de Novo); de outro, a defesa de Nicolelis como um dos operários da autoestima do país.
Às vésperas de um grande feito para a ciência nacional, a ser visto por 70 mil pessoas no Itaquerão e centenas de milhões pela TV, o neurocientista reclama do que Nelson Rodrigues chamava de "complexo de vira-lata" do brasileiro: uma inarredável tendência de cuspir em si mesmo. Alegando agenda lotada, Nicolelis negou conceder entrevista, e no Instituto do Cérebro da UFRN ouvimos que os pesquisadores não vão mais comentar o assunto. Dez especialistas na área responderam o mesmo à revista Wired, que precisou garantir anonimato para que um "proeminente neurocientista" opinasse que o tópico envolve "orgulho pessoal, ciúmes e dinheiro".
Em cima do laço
Farpas à parte, há também as patadas científicas. Estudiosos da interação cérebro-máquina alertam que, se a proeza for traduzir para um robô sinais simples ("iniciar" e "parar"), a abertura da Copa vai apresentar o que, sem tanto alarde, outros projetos já vêm fazendo.
"Será uma mostra de robótica extravagante, provavelmente pré-programada, não de controle cerebral", disse Andrew Schwartz, da Universidade de Pittsburgh, na revista MIT Technology Review.
Contatado, Schwartz respondeu que prometeu a si mesmo "ficar fora disso". Ocorre que Nicolelis planejava implantar cirurgicamente eletrodos no crânio dos pacientes. Foi assim que, em 2008, ele fez a macaca Idoya controlar, a partir dos Estados Unidos, os passos de um robô no Japão. Para amainar o receio de reações inflamatórias em humanos, ele estudou a resposta do tecido cerebral de ratos, concluindo em favor dos eletrodos.
Mesmo assim, ele virou a casaca e se rendeu, em outubro, à eletroencefalografia (EEG), que antes criticava. Implantes cirúrgicos demandariam o crivo de órgãos reguladores, burocracia que o prazo até a Copa não recomendava. Agora, os pacientes vestem um capacete com sensores que envelopam o couro cabeludo.
A diferença costuma ser comparada a uma orquestra: se eletrodos escutam a execução isolada de uns poucos instrumentos, a EEG grava o conjunto da sinfonia, mas com um único microfone, instalado fora da sala de concerto.
- Estamos cientes das limitações da EEG, mas decidimos mostrar o que podia ser feito - disse Alan Rudolph, coordenador do Andar de Novo e vice-presidente de pesquisa da Universidade do Colorado.
Avançar em relação ao que já existe dependeria do que os cientistas chamam de "graus de liberdade": quantas ações do robô o paciente irá, de fato, comandar com o pensamento. Nicolelis segredava à revista Piauí, a fins de 2011, o desejo de atingir 31 graus, o que Rudolph agora reduz para 17. Se é copo meio cheio ou meio vazio, até entre neurocientistas é questão de perspectiva.
- Não tenho nenhuma crítica técnica ao projeto. Nicolelis é muito bom pesquisador, merece respeito e apoio - diz Iván Izquierdo, diretor do Instituto do Cérebro da PUCRS.
Ainda longe das atenções, oito pessoas acabam de voltar a caminhar. Quando aparecerem, decerto contarão melhor com quantos graus de liberdade se ergue
um paraplégico.
Como Funciona
Para voltar a caminhar, o paciente paraplégico deve instalar uma veste robótica chamada "exoesqueleto". O equipamento de Nicolelis, batizado de BRA-Santos Dumont 1, além de ter a tarefa de manter o usuário em pé, traz a promessa revolucionária de compreender quando a pessoa pensa em caminhar, transmitindo ordens do cérebro para a máquina. A veste também tem a vantagem de retornar um sinal tátil ao usuário para que ele tenha a sensação de estar pisando no chão.
Como ele chegou lá