Documento que estabelece metas e indicadores por período de 10 anos, um novo Plano Nacional de Educação (PNE) foi elaborado pelo governo federal e está em discussão no Congresso Nacional. Nesta quarta-feira (18), o 26º Fórum Nacional do Ensino Superior Particular (Fnesp), realizado em São Paulo, iniciou suas atividades com dois painéis sobre o assunto. Entre autoridades e especialistas no assunto, o consenso é de que as diretrizes têm o desafio de ampliar a oferta no Ensino Superior e assegurar a inclusão e permanência de mais pessoas, mas sem perder a qualidade educacional.
De acordo com levantamento feito pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, 90% das metas do PNE vigente entre 2014 e 2024 não foram cumpridas e 10% foram cumpridas parcialmente. Entre as não cumpridas, 13% apresentaram até retrocesso, na comparação com o documento anterior. Há, ainda, um sério problema de lacuna de informações que impede a avaliação das estratégias usadas no cumprimento dos objetivos.
Entre os motivos, segundo Claudia Bandeira, integrante do movimento, está um quadro de fragilização de políticas sociais e ambientais, diante do estabelecimento de teto de gastos que abrangeu a área da educação, e um “desmonte institucional”, em especial no enfrentamento das desigualdades sociais que dificultam o acesso ao Ensino Superior. Ela ainda aponta para a ausência de um Sistema Nacional de Educação que articule a cooperação entre os entes federados para implementar e monitorar o PNE.
Para que o PNE dê resultados, Marta Abramo, secretária da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação (MEC), ressalta que a sociedade precisa se apropriar de seu conteúdo, o que nem sempre acontece. Em sua opinião, o documento, às vezes, “some do horizonte” dos responsáveis por políticas educacionais, e foi a falta de empenho e a descontinuidade das estratégias que fez com que não se atingisse a maioria das metas previstas para o período entre 2014 e 2024.
— Se não tivermos um plano articulado, planejado e com estratégias muito claras, não chegaremos a lugar nenhum. Precisamos nos inspirar no plano que temos e não cumprimos para planejar as metas do próximo ano — observa Marta, ponderando que as metas do PNE anterior eram “ambiciosas”, e que não ter atingido todas as metas “não significa que não há nada a se comemorar”.
Com relação ao Ensino Superior, o principal motivo de comemoração é o aumento no número de matrículas, o que indica uma maior inclusão da população nessa etapa, muito relacionada à popularização do ensino a distância (EAD). O novo PNE precisa, no entanto, pensar na inclusão e na expansão sem perder a qualidade da educação ofertada.
— A expansão não aconteceu como planejada. Uma das ideias era expandir as vagas públicas, uma meta que não foi atingida. Também não conseguimos incluir todos que gostaríamos. Precisamos fazer a reflexão sobre se a expansão que fizemos está cumprindo com o seu objetivo: estamos formando profissionais realmente preparados para contribuir com o desenvolvimento do país? — questiona a secretária.
No caso da EAD, Marta defende que se trata de uma modalidade que “é e deve ser diferente da presencial”. Não pode, no entanto, estar “aquém”: deve garantir trocas de conhecimento entre pares e junto a professores especializados.
Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao MEC, Manuel Palácios chama a atenção para a baixa taxa de conclusão das graduações, que tem variado pouco nos últimos anos: em torno de 40% daqueles que ingressam no Ensino Superior realmente se formam. Para o gestor, o dado põe em xeque as motivações dos jovens para seguir com os estudos.
— Temos certeza de que temos de colocar o tema da eficiência do Ensino Superior em primeiro plano. Se há uma percepção de pouca motivação dos estudantes em fazer o Ensino Superior, será que os itinerários formativos, currículos e propostas das instituições atendem às necessidades desses estudantes? Quando se discute condições de oferta, elas devem focalizar de forma significativa qual a experiência estudantil que o aluno tem — defende Palácios.
Henrique Sartori, membro da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CNE), avalia que há muito estigma envolvendo o EAD, pois não há disposição para entender que o que já foi construído até agora tem seu valor, e precisa também ser levado em consideração.
— Falamos sobre educação emancipadora, mas não entendemos o que o jovem quer hoje. As competências digitais e a existência de novos atores na educação são uma realidade. O celular está sempre presente na vida das pessoas, e jovens e adultos estão buscando um modelo de educação com o qual o PNE atual não conversa. Temos um PNE que durou 10 anos e foi amplamente discutido e criticado e, agora, o novo plano também repete muitos erros que já criticamos no anterior — analisa.
Luiz Roberto Curi, titular da Cátedra Paschoal Senise da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador associado da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defende que o PNE precisa contribuir para o desenvolvimento do país, o que não acha que está acontecendo:
— O PNE tem que aumentar a empregabilidade, gerar uma redução da pobreza, combater a desigualdade. O que significa ter uma meta de matrícula se perdemos tantos alunos ao longo dos anos? Se a meta de conclusão não for incluída, a de matrícula não adianta para nada.
Para Renato Pedrosa, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP e membro da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), para além das estratégias, o PNE precisa ter previsões de políticas específicas para viabilizá-las nos seus dois primeiros anos.
— Sem políticas específicas, você não vai entender o que aconteceu quando as metas não forem cumpridas. Pouca coisa acontece por inércia. Certas unidades federativas, inclusive ricas, como Minas Gerais e Rio Grande do Sul, investem pouco em sistemas estaduais de Ensino Superior, por exemplo — cita Pedrosa.
O Fnesp acontece nesta quarta e quinta-feira (19) em São Paulo.
*A repórter viajou a convite do Semesp.