Entidades ligadas ao ensino têm opiniões divergentes sobre a suspensão temporária da abertura de novos cursos, vagas e polos de graduação a distância, estabelecida por uma portaria do Ministério da Educação (MEC), publicada na última sexta-feira (7). A medida está relacionada à atualização dos referenciais de qualidade e do marco regulatório para a oferta de formações EAD, que deve ser feita até o final deste ano.
Assinada pelo ministro da Educação, Camilo Santana, a portaria 528 prevê a suspensão até 10 de março de 2025. No entanto, a medida não se aplica aos cursos de instituições públicas do Sistema Federal de Ensino vinculados a políticas e programas governamentais. O documento também afirma que o MEC deve estabelecer novos referenciais de qualidade e marco regulatório para essa oferta até 31 de dezembro de 2024.
Nos últimos anos, o EAD se popularizou no Brasil como alternativa para atender uma população que precisa conciliar trabalho e estudo — ao todo, são 4,3 milhões alunos. Mas, parte dessas graduações é alvo de questionamentos relacionados à qualidade do ensino e à oferta limitada de experiências práticas, que prejudica a formação dos novos profissionais.
Rafael Frederico Henn, presidente do Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas (Comung) e reitor da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), aponta que os cursos que já estão em andamento não serão atingidos e destaca que a medida sinaliza que o MEC pretende observar a qualidade do ensino nas instituições que ofertam essa modalidade — algo que já vinha sendo pedido pela entidade. Por isso, consideram a medida positiva.
— Não somos contra o EAD, somos contra a baixa qualidade do ensino a distância. Não há um controle efetivo sobre a qualidade desse ensino. Isso é ruim para o aluno, que chega ao mercado de trabalho despreparado, e bagunça todo o mercado, porque cobram mensalidades muito baixas — afirma, ressaltando que a solicitação da entidade envolve, principalmente, um controle da qualidade das atividades práticas.
Na visão de Henn, a baixa qualidade percebida em graduações a distância no Brasil ocorre porque muitas instituições não oferecem aulas práticas, que são essenciais em muitos cursos, sobretudo nas Licenciaturas. O reitor acredita que a atualização dos referenciais de qualidade e do marco regulatório deve organizar o mercado, que vem crescendo muito:
— Basicamente, deve ter a presencialidade, porque as práticas garantem uma qualidade. Os representantes das universidades comunitárias estão esperançosos em relação à regulação que deve vir. E não vai ser prejudicial ao aluno. Então, nesse momento, achamos que tudo bem ocorrer a suspensão, porque o benefício provável supera qualquer dificuldade que pode vir pela não abertura de novos cursos e polos neste ano.
O presidente da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), João Mattar, concorda que a criação de novos referenciais de qualidade é positiva, já que os últimos são datados de 2007 e estão desatualizados. O professor acrescenta que a atualização também era uma demanda da entidade e que o MEC está incluindo a Abed nas conversas sobre as mudanças.
— O MEC também está propondo revisar os instrumentos de avaliação dos cursos EAD, e toda revisão é bem-vinda, pois a área é muito dinâmica. Uma outra portaria instituiu o Conselho Consultivo para o Aperfeiçoamento dos Processos de Regulação e Supervisão da Educação Superior (CC-Pares), que terá participação de várias entidades e universidades. Isso também é positivo — avalia Mattar.
O problema, entretanto, está na suspensão da criação de novos cursos, vagas e polos até março de 2025, destaca o presidente da Abed. Essa medida, na visão de Mattar, funciona como um bloqueio para travar o crescimento da modalidade e é desnecessária, uma vez que as revisões poderiam ser feitas sem esse impedimento. Além disso, a entidade considera que a suspensão limita o acesso de alunos ao Ensino Superior.
— Não precisaria ter a suspensão, mas apenas a revisão. Quando tivessem as novas regras, mudaria para todos. Assim, grandes grupos que têm seus cursos funcionando vão continuar, mas instituições menores vão demorar mais de um ou dois anos. Gera uma concentração de mercado, isso é ruim, e tira o direito dos alunos mais pobres, que têm o EAD quase como a única opção de estudo — defende, ressaltando que algumas instituições estavam com tudo pronto para abrir novas vagas e polos.