A eleição dos nomes que comandarão a reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) pelos próximos quatro anos chegou ao fim. Não é possível ainda, no entanto, dizer com certeza quem será a nova reitora. O motivo é a necessidade de confirmação, por parte do Ministério da Educação (MEC), da conformidade da documentação de votantes e candidatos, e posterior nomeação feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva de uma das três chapas mais votadas para administrar a instituição.
A tendência sinalizada aos organizadores da consulta à comunidade por representantes do governo federal é de que seja respeitada a ordem da lista tríplice elaborada nesta sexta-feira (19) após a eleição no Conselho Universitário (Consun). Com isso, a vitória da chapa 3 seria endossada, e Marcia Barbosa se tornaria, a partir de 21 de setembro, a nova reitora, com Pedro Costa ao seu lado, como vice-reitor.
Em 2020, contudo, não foi assim. Apesar de a lista tríplice colocar a chapa de Carlos André Bulhões e Patrícia Pranke em último lugar entre as três mais votadas, foi ela a indicada pelo então presidente Jair Bolsonaro para comandar a UFRGS. Em entrevista ao Gaúcha Mais, Marcia transpareceu tranquilidade com relação à decisão do governo federal desta vez.
— Eu sou uma cientista, então, eu vou atrás de evidências. As evidências mostram que este governo, até o momento, sempre escolheu o primeiro ou a primeira da lista, quando é enviada por alguma universidade. Já tivemos vários casos. Então, eu me sinto confiante que o governo federal vai escolher o meu nome e o nome do professor Pedro Costa, que vai ser o vice-reitor indicado nessa lista tríplice, para assumir a reitoria da UFRGS agora, em setembro deste ano — destacou a candidata eleita.
Procurado pela reportagem, o MEC respondeu que a lista tríplice encaminhada será analisada à luz das leis e que, “sendo constatada a conformidade da documentação, o processo será encaminhado à Casa Civil, para nomeação pelo Presidente”. A pasta destacou, ainda, que o mandato do atual reitor da UFRGS se encerra no dia 21 de setembro, e que a publicação do decreto de nomeação “pode ocorrer até a essa data”.
Veja quantos votos recebeu cada candidata a reitora no Consun:
- Marcia Barbosa – 44 votos
- Ilma Brum – 26 votos
- Liliane Giordani – 1 voto
- Brancos – 2 votos
- Nulos – 2 votos
Bandeira branca
Permeado por ações judiciais e disputas políticas nas quais chegaram a figurar duas chapas comemorando vitória na noite de segunda-feira, o processo eleitoral de escolha da nova reitoria termina com os ânimos atenuados. A bandeira branca foi hasteada pela chapa 2, encabeçada por Ilma Brum, nas primeiras horas desta sexta-feira: em manifesto, a atual diretora do Instituto de Ciências Básicas da Saúde (ICBS) e seu candidato a vice, Vladimir Nascimento, reconheceram o resultado paritário na consulta à comunidade, que daria a vitória para a chapa 3, e informaram que seus apoiadores expressariam seus votos “com a autonomia que lhes é de direito”.
Em todas as eleições para a reitoria realizadas pela instituição até agora, os votos dos professores tinham peso de 70%, contra 15% os dos estudantes e 15% os dos técnicos-administrativos. Neste ano, a previsão inicial era de que as escolhas dos três segmentos tivessem o mesmo peso na consulta à comunidade – a chamada “consulta paritária”. Nesse novo critério, a chapa 3 teria vencido a consulta. O impasse gerou conflitos durante o processo eleitoral.
Após a votação no Consun, o tom daqueles que quiseram compartilhar seus votos com o grupo era de comemoração e apaziguamento. Ítalo Guerreiro, representante dos técnicos-administrativos, defendeu que a universidade “crie um ambiente mais democrático e participativo”, que entende que é almejado por todos.
— Espero que o próximo período seja de muita tranquilidade e reivindicação, e que algumas coisas não sejam mais aceitas. Que a gente não chegue para votação e tenha a Polícia Federal nos esperando. Que não haja mais integrantes da reitoria dizendo que, para tirar uma foto profissional, o servidor tem que cortar o cabelo. Votei na chapa 1 (na consulta à comunidade), e não na 3, mas declaro com tranquilidade todo o meu apoio a essa reitoria (para a posse) — destacou Ítalo.
Representante docente, Eduardo Rolim de Oliveira expressou o desejo de que esta tenha sido a última eleição com lista tríplice, que, em seu entendimento, precisa ser extinta.
— Precisamos ter tranquilidade, uma eleição com regras bem definidas em que não precisemos ficar discutindo suas regras enquanto deveríamos estar discutindo propostas para a universidade. Este é um dia histórico. A professora Marcia é a primeira colocada da lista e temos, há muitos anos, um compromisso com o primeiro colocado da lista tríplice. Agora, o nome da professora Marcia é o nosso nome, e eu deposito nela a esperança de que tenhamos uma pacificação nesta comunidade — defendeu o conselheiro.
Adriana da Silva Cunha, que representou a Associação Terceirizados Unidos, que reúne os profissionais terceirizados da UFRGS, sinalizou a luta de sua categoria, que, hoje, não tem direito a voto na consulta à comunidade.
— A universidade não se resume a professor, aluno e técnico. Temos muito mais aqui dentro e temos muito a crescer se olharmos para fora disso. Lutamos para que a universidade seja democrática de verdade. Quero ter direito a estudar aqui dentro, que meus filhos estudem aqui, que meus colegas tenham voz e voto. E, agora, temos esperança disso — pontuou Adriana.
A chapa vencedora
É composta por Marcia Barbosa, candidata a reitora, e Pedro Costa, candidato a vice-reitor.
Marcia é professora do Instituto de Física da UFRGS e pesquisadora nível 1A do CNPq. Foi diretora do Instituto de Física. É membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Mundial de Ciências e integra organizações como American Physical Society, Conselhos Nacionais de Ciência e Tecnologia, de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência e Comitê de Gênero da The World Academy of Sciences. Em 2023, assumiu como secretária de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, cargo que deixou há dois meses. Pesquisa Física da Matéria Condensada, principalmente em água e no uso de suas anomalias para processos físicos e biológicos.
Pedro é professor da Escola de Administração da UFRGS, onde ministra disciplinas sobre Administração de Organizações da Sociedade Civil e Administração Pública Social, Estado, Terceiro Setor e Organizações não governamentais. Na pós-graduação, atua na linha de Gestão Social e Desenvolvimento. Trabalha com projetos de pesquisa e extensão na área de gestão social e tecnologias sociais. Fundou o Núcleo de Estudos em Gestão Alternativa. Foi chefe do Departamento de Ciências Administrativas, coordenador da Comissão de Graduação e da Comissão de Extensão de Administração e vice-presidente da Comissão Especial de Acompanhamento junto ao MP e MEC. Foi membro da Comissão Permanente de Pessoal Docente, presidiu a Comissão Especial de Avaliação de Reestruturação da Reitoria e foi representante docente no Conselho da Unidade e no Consun.
Um dos entendimentos da chapa 3 é de que a falta de diálogo da reitoria tornou a UFRGS uma “federação de institutos” que realizam diferentes projetos, mas sem relação uns com os outros, o que, no entendimento de Marcia, pôde ser percebido em maio, durante a enchente.
A dupla avalia que, diante de demandas como essas e a transição energética, por exemplo, a universidade precisa “sair da caixa e ir para a sociedade” – se não o fizer, a evasão seguirá acontecendo e a instituição seguirá pouco ouvida na busca de soluções para esses problemas.
A parceria com empresas é outra bandeira da chapa 3, o que deve ser facilitado a partir da elaboração de um banco de dados que mapeie os projetos e competências de cada servidor da instituição.