Pouco mais de uma semana após os cortes de verbas nas universidades federais de todo o país, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) anunciou bloqueio generalizado em bolsas de mestrado e doutorado. Ainda não foi divulgado o número de pós-graduandos afetados.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Capes informou que o recolhimento foi apenas nas bolsas "ociosas", que não estavam sendo utilizadas em abril, reforçando que nenhum bolsista já cadastrado será afetado (leia a resposta na íntegra no fim do texto). A justificativa, conforme representantes das instituições, não tem fundamento.
— As bolsas cortadas, que Capes está chamando eufemisticamente de "ociosas", são aquelas em que o aluno do mestrado termina o programa, defende dissertação e perde a bolsa. Então, o programa vai fazer uma nova chamada, com novo processo seletivo, e outro aluno vai entrar e receber o benefício. "Ociosidade" é término de um e começo de outro — explica o reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Rui Vicente Opperman.
Só na UFRGS, que conta com três modalidades de bolsas (mestrado, doutorado e pós-doutorado), foram cortadas 133 bolsas da Capes (45 de mestrado, 80 de doutorado e oito de pós-doutorado).
— Vale destacar que essas são as bolsas administradas pela pró-reitoria. Tem alguns cursos que são direto com a Capes. Pelo que ouvi, a proporção do corte foi semelhante à nossa, de 5% — completa Opperman.
Na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), houve bloqueio de três bolsas de mestrado, totalizando 3,84% de corte. Ao todo, a universidade contava com 78 bolsas dessa modalidade (agora são 75).
— É uma lástima. Agora, está muito ruim — diz a vice-reitora, Jenifer Saffi.
Sabendo o tamanho do corte desde ontem (8), o reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal, vê com preocupação o fim de bolsas da Capes na instituição — o total era 759 e o equivalente a 2,5% (19, sendo três de mestrado, dez de doutorado, quatro de pós-doutorado e duas do Proex) foram cortadas, conforme comunicado da instituição.
— É um retrocesso por uma série de motivos. Nenhum país sai da crise e alcança o desenvolvimento sem investimento em educação. Recentemente, a Alemanha anunciou uma verba muito grande para universidades e pesquisa. Esse é o novo 7 a 1. Só podemos lamentar — defende, acrescentando que, na UFPel não houve bloqueio no pós-doutorado porque todas as vagas estão preenchidas.
Hallal critica a postura do governo de criar medidas, colocá-las em prática, torná-las públicas e somente no fim avisar as instituições.
— O governo se coloca na posição de nosso inimigo. Se precisa fazer o corte, esperamos ser chamados e ter o problema compartilhado. Mas eles fazem o contrário: bloqueiam o sistema sem que a gente entenda e depois disso a gente é informado pela mídia e, por último, recebemos uma notificação oficial. Falta respeito.
Mais uma vez pegos de surpresa, os administradores corriam nesta quinta-feira (9) para contabilizar as perdas. Na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), os números foram fechados pela manhã e chegaram a um corte de 27 das 1.153 bolsas — sendo 13 de mestrado e 13 de doutorado e uma de pós-doutorado.
— Já temos vários estudantes sem bolsa e vamos aumentar esse contingente de alunos de pós-graduação sem bolsa. Isso preocupa, e é necessário que o governo reveja também essa posição com relação a cortes. Não tem possibilidade de se projetar um futuro de país sem educação e sem ciência — diz o reitor da instituição, Paulo Burmann.
Em nota, a UFSM destaca que "a instituição conta hoje, após este corte, com 672 bolsas de Mestrado e 470 bolsas de Doutorado, concedidas pela Capes por meio do Programa de Demanda Social, e 63 bolsas do Programa Nacional de Pós-Doutorado".
Na Universidade Federal do Rio Grande (Furg), 35 bolsas não estão mais disponíveis – 26 de mestrado e nove de doutorado. Por meio da assessoria de imprensa, a instituição afirma que diversos cursos foram afetados, contudo, o maior impacto foi nos programas de pós-graduação com notas 6 ou 7, inseridos no Programa de Excelência Acadêmica (Proex) da Capes. Além das bolsas que não estavam sendo utilizadas em função da transição de alunos, também foram afetados estudantes que participam de programas no Exterior.
— Também temos o caso de alunos que estão, no momento, em doutorado sanduíche no Exterior e, ao retornar, estarão sem a bolsa — disse, por email, o pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação (Propesp), Eduardo Secchi.
A Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), por meio de sua assessoria de imprensa, informou que não observou nenhum corte ou recolhimento de bolsas na instituição.
A Universidade Federal do Pampa (Unipampa) destaca que, "como outras universidades, possui dependência" do financiamento da Capes. "A demanda de bolsas é atendida em apenas 50% e inclusive neste ano já tínhamos solicitado aumento das cotas pela demanda crescente. Este corte afetará diretamente nossas pesquisas e o nosso papel transformador da região", informa nota da universidade.
Abaixo, a nota enviada pela Capes, por e-mail:
"Os sistemas de concessão de bolsas da CAPES são fechados todos os meses para a geração das folhas de pagamento e reabertos no início de cada mês. Em maio, o sistema permaneceu fechado para ajuste da concessão de bolsas – recolhimento de bolsas que estavam à disposição das Instituições mas que não estavam sendo utilizadas no mês de abril de 2019 (bolsas ociosas, ou não utilizadas). Assim, nenhum bolsista já cadastrado nos sistemas de concessão foi retirado. Ainda não temos o número exato das bolsas ociosas recolhidas".
* Colaborou Camille Wegner