Transformada em canteiro de obras nos últimos anos, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) chega ao final de 2018 com uma série de construções atrasadas, paralisadas e sob risco de parar ou nem sair do papel. O ambicioso projeto de ampliação e expansão da instituição — que incluía investimentos em novas unidades nos municípios de Cachoeira do Sul, Frederico Westphalen e Palmeira das Missões — esbarrou na falta de dinheiro e em problemas nas licitações.
Segundo a reitoria da UFSM, o governo federal não repassou os valores previstos ou os liberou com atrasos. O Ministério da Educação (MEC) afirma que o programa de expansão das universidades, herdado da gestão anterior, foi realizado sem planejamento e pecou pela falta de “mensuração dos efeitos dos gastos exagerados e sem controle”.
De um total de 30 obras elencadas pela universidade, que já consumiram R$ 75 milhões até agora, só duas estão totalmente concluídas e entregues. Há outras quatro que a reitoria lista como 100% concluídas, mas que ao mesmo tempo informa terem “ligeiras pendências”, como necessidade de vistoria e, se necessário, correção. Em outras três, o prazo previsto para a entrega já expirou, mas os trabalhos não terminaram.
Pelo menos duas estão paradas por problemas nas licitações, incluindo a Central de UTI do Hospital Universitário de Santa Maria (Husm), iniciada em 2013 e que deveria ter sido entregue no ano seguinte, mas que teve o contrato rescindido e depende de nova licitação. Com a central, o Husm passaria dos atuais 45 para mais de 80 leitos, o que ajudaria a superar o cenário de superlotação.
Há 12 obras que, conforme o cronograma original, deveriam estar prontas entre janeiro e março, mas pelo menos em parte delas isso não vai acontecer: seis têm menos de 40% dos serviços concluídos (sendo que algumas estão na faixa dos 10% ou dos 20%). Segundo o reitor, Paulo Afonso Burmann, os prazos devem ser “jogados para a frente”:
— A verdade é que o cronograma tem sido adaptado à disponibilidade orçamentária. Optamos por manter todas as obras em andamento, ainda que em ritmo devagar. Até porque uma obra parada é um problema, quase sempre terá um custo final três vezes maior. Mas se as expectativas de repasses do governo não forem cumpridas, o andamento pode desacelerar ou, até mesmo, parar já em 2019.
A situação atual contrasta com o período de bonança entre 2007 e 2012, quando a UFSM recebeu R$ 200 milhões do governo federal para alavancar mais de uma centena de projetos e aumentar seu escopo, não só em Santa Maria, mas em novos campi de outras cidades. O investimento fez área construída passar de 300 mil metros quadrados para 400 mil metros quadrados e viabilizou o aumento de vagas — de 13 mil em 2005 para os atuais 30 mil alunos.
Mec diz que expansão não teve planejamento
Agora, a realidade é bem diferente. Entre 2014 a 2016, a fonte secou, como reflexo da crise econômica. A UFSM diz ter deixado de receber R$ 237 milhões previstos: R$ 107 milhões para custeio e investimento (o que inclui obras) e R$ 130 milhões referentes à expansão do campus de Cachoeira do Sul. Em 2018, o MEC repassou para as obras R$ 19 milhões, valor que estava previsto. A projeção da Pró-Reitoria de Infraestrutura é de que sejam necessários, para 2019, de R$ 15 milhões a R$ 20 milhões para concluir as 30 obras em andamento.
Em nota enviada a GaúchaZH, o MEC ressaltou que, em 2018, não cortou recursos das universidades federais e fez os pagamentos sem atraso: “Mesmo com as limitações orçamentárias que o país enfrenta, não é verdade que falte recurso”, diz o texto. A nota do ministério acrescenta que, por falta de planejamento, o programa de expansão das instituições de Ensino Superior, iniciado no governo Lula e mantido por Dilma Rousseff, causou impacto significativo no orçamento da pasta: “Esta expansão foi realizada sem planejamento. O ano de 2014 foi influenciado pelas eleições e por um momento econômico em que não houve mensuração dos efeitos dos gastos exagerados e sem controle. Diversos programas aumentaram recursos fora da realidade, fazendo com que reduções de orçamento começassem a partir de 2015”.
Atraso leva a pagamento de aluguel de R$ 40 mil por mês
Uma das situações mais delicadas para a UFSM diz respeito ao campus de Cachoeira do Sul, que começou a ser construído em 2013. Para consolidar a primeira fase da unidade, o governo federal comprometeu-se em repassar R$ 130 milhões à universidade, mas apenas R$ 13,5 milhões, pouco mais de 10% do esperado, chegaram aos cofres da instituição.
Segundo o reitor Paulo Burmann, o empreendimento ficou três anos – de 2015 a 2017 – sem receber verbas da União. A instituição aportou recursos próprios para não paralisar os trabalhos.
– Isso representa em um sério risco no projeto para a consolidação da unidade. Convivemos com uma grande e cruel incerteza – diz.
O projeto todo prevê quase 40 prédios na nova unidade, mas a penúria financeira limitou a dois os que foram concluídos nos últimos quatro anos. Por esse motivo, a universidade teve de alugar salas de aula e laboratórios fora da sede, um custo mensal de R$ 40 mil, sem contar as despesas de energia, limpeza e segurança.
No momento, há 10 construções em andamento no campus de Cachoeira. Três figuram na lista das 30 obras que a universidade classificou como prioritárias: dois blocos com salas de aula (78% executados), laboratórios (35%) e uma residência estudantil (44%). A expectativa da reitoria é de conseguir concluir esses projetos ao longo do ano que vem. A unidade mantém 800 alunos. Com o investimento de R$ 130 milhões, teria chegado a 1,2 mil.
O novo campus vive um outro drama, que não tem a ver com as obras: também faltam servidores. São pouco mais de 40 técnicos-administrativos para um quadro previsto de 75. Em lugar dos 111 professores necessários, há apenas 50.
Universidade demite para não comprometer serviços
As dificuldades financeiras da UFSM não impedem apenas o andamento normal das obras, mas o próprio custeio do dia a dia da instituição. Em resposta às limitações orçamentárias, no ano passado a reitoria demitiu 160 trabalhadores terceirizados, principalmente nos setores de vigilância, portaria e recepção. A economia foi de R$ 4 milhões.
A prioridade, de acordo com a administração, é preservar a assistência aos estudantes. Clayton Hillig, que está à frente da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Prae), garante que não haverá qualquer comprometimento nas refeições servidas no Restaurante Universitário (RU) e nos auxílios concedidos a acadêmicos. Segundo ele, o orçamento voltado à assistência estudantil neste ano é de R$ 22,7 milhões – e tudo já teria sido liberado.
– No momento, nossa maior preocupação é a manutenção dos restaurantes universitários, que consomem aproximadamente R$ 18 milhões por ano. Também nos preocupa o aumento da demanda por moradia estudantil. Por enquanto, não há fila de espera, mas estamos estudando medidas para garantir o acesso de todos em 2019, pois não teremos vagas suficientes – projeta Hillig.
Mesmo com as dificuldades financeiras, a UFSM é um portento orçamentário. Enquanto a prefeitura de Santa Maria conta com R$ 700 milhões (dado referente a 2018), a universidade sediada no município movimentou R$ 1,3 bilhão no ano passado (sem contar o Husm, que recebeu R$ 212 milhões).
Desde 2013, o orçamento da instituição de ensino sempre superou a marca do bilhão. Do total, cerca de 75% estão comprometidos com a folha de pagamento dos 4,7 mil servidores da instituição.
Andamento das 30 obras consideradas prioritárias pela UFSM
100% concluído, sem pendência
Ar comprimido e rede de gases da Odontologia
Já investidos: R$ 406.946,29
Estágio da obra: 100%
Concluído
Centro de Convenções (áudio, vídeo e cenotecnia) Já investidos: R$ 2.904.546,08
Estágio da obra: 100%
Concluído
Prontas, mas com pendências
Obra do prédio da Fonoaudiologia
Já investidos: R$ 3.391.253,13
Estágio da obra: 100%
Previsão de conclusão: obra entregue, mas aguarda correções por parte da empresa como, por exemplo, infiltrações no forro
Complementação do Jardim Botânico
Já investidos: R$ 135.862,17
Estágio da obra: 100%
Previsão de conclusão: aguarda finalização da empresa, que precisará fazer correções na impermeabilização da laje do jardim
Obra do Laboratório de Análises de Resíduos de Pesticidas (CCNE)
Já investidos: R$ 1.705.255,06
Estágio da obra: 100%
Previsão de conclusão: aguardando finalização pela empresa, que fará ajustes no sistema elétrico
Construção do Pavilhão da Divisão de Patrimônio (Demapa)
Já investidos: R$ 2.120.537,19
Estágio da obra: 100%
Previsão de conclusão: aguarda por vistoria final para ser dado como pronto
Prazo vencido
Construção do prédio da Odontologia
Já investidos: R$ 10.031.632,71
Estágio da obra: 95%
Previsão de conclusão: 19/2/2018
Construção da Casa de Comunicação
Já investidos: R$ 5.384.412,78
Estágio da obra: 89,06%
Previsão de conclusão: 17/10/2018
Casa do Estudante (Cachoeira do Sul)
Já investidos: R$ 1.345.963,33
Estágio da obra: 44,2%
Previsão de conclusão: 1/11/2018
Obras paradas
Unidade Rede Bio
Já investidos: R$ 2.006.999,52
Estágio da obra: 66%
Previsão de conclusão: aguarda contratação da segunda colocada em licitação. Empresa contratada descumpriu o cronograma fixado, o que levou a universidade a romper o contrato
Central de UTI do Hospital Universitário de Santa Maria (Husm)
Já investidos: R$ 7.901.348,31
Estágio da obra: 72,44%
Data de início: 2013
Previsão de conclusão: 2014, mas o contrato foi rescindido porque a empresa inicialmente contratada descumpriu com o cronograma fixado, o que levou a universidade a romper o contrato. Após nova licitação, a obra será concluída em até seis meses
Prazo acabando
Construção de Casa do Estudante (módulos III e IV)
Já investidos: R$ 3.036.203,99
Estágio da obra: 91,61%
Previsão de conclusão: 3/12/2018
Obra do prédio do curso de Arquitetura e Urbanismo
Já investidos: R$ 5.425.863,93
Estágio da obra: 73,57%
Previsão de conclusão: 14/12/2018
Obra da cozinha industrial do Restaurante Universitário
Já investidos: R$ 527.249,49
Estágio da obra: 23,63%
Previsão de conclusão: 19/3/2019
Ampliação do prédio 16-B do Centro de Educação
Já investidos: R$ 1.807.483,20
Estágio da obra: 64,65%
Previsão de conclusão: 10/3/2019
Prédio de salas de aula (curso Medicina)
Já investidos: R$ 1.883.294,58
Estágio da obra: 62,16%
Previsão de conclusão: 3/2/2019
Unidade Básica Ensino II (Colégio Politécnico)
Já investido: R$ 2.761.317,50
Estágio da obra: 74,20%
Previsão de conclusão: 3/2/2019
Obra do Núcleo de Desenvolvimento de Materiais Avançados
Já investido: R$ 240.416,49
Estágio da obra: 13,21%
Previsão de conclusão: 26/12/2018
Construção do Laboratório de Fisiologia de Peixe
Já investido: R$ 210.219,45
Estágio da obra: 11,05%
Previsão de conclusão: 14/1/2019
Construção do Laboratório de Modelagem Animal
Já investido: R$ 319.017,35
Estágio da obra: 16,62%
Previsão de conclusão: 14/1/2019
Laboratório Análises Biodinâmicas do Solo
Já investido: R$ 406.834,71
Estágio da obra: 33,96%
Previsão de conclusão: 3/1/2019
Construção de dois blocos básicos de Ensino (Cachoeira do Sul)
Já investido: R$ 7.450.197,71
Estágio da obra: 77,63%
Previsão de conclusão: 5/2/2019
Bloco de salas de aula (Frederico Westphalen)
Já investido: R$ 809.559,35
Estágio da obra: 36,16%
Previsão de conclusão: 17/12/2018
Outras obras em andamento
Construção do Bloco 5 (Palmeira das Missões)
Já investidos: R$ 29.139,39
Estágio da obra: 66,12%
Previsão de conclusão: setembro de 2019
Pesquisa em Fármacos
Já investidos: R$ 119 mil
Estágio da obra: 5%
Previsão de conclusão: 22/7/2019
Museu do Conhecimento
Já investidos: R$ 151 mil
Estagio da obra: 5%
Previsão de conclusão: 29/11/2019
Laboratório das Humanidades
Já investidos: ainda não foi aportado recurso Estágio da obra: executadas apenas a terraplenagem e as fundações
Previsão de conclusão: 23/5/2020
Central de Laboratórios (Cachoeira do Sul)
Já investidos: R$ 2.924.934,86
Estágio da obra: 34,62%
Previsão de conclusão: 3/9/2019
Casa do Estudante (Palmeira das Missões)
Já investidos: R$ 656.437,76
Estágio da obra: 44%
Previsão de conclusão: 5/6/2019
Construção de três pavimentos (Palmeira das Missões)
Já investidos: R$ 514.345,02
Estágio da obra: 32,55%
Previsão de conclusão: 15/5/2019