O Pronampe Solidário foi o primeiro grande programa de concessão de crédito em condições especiais estabelecido pelo governo federal para ajudar na recuperação de empresas gaúchas atingidas pela enchente do ano passado. Destinado a microemprendedores individuais (MEIs), microempresas e empresas de pequeno porte, o Pronampe foi anunciado pelo Planalto ainda em maio, mês da tragédia climática.
Na época, o governo estimava alavancagem da concessão de crédito em um total de até R$ 30 bilhões no âmbito do Pronampe. Contudo, até o encerramento do programa, no último dia de 2024, 37,1 mil operações foram realizadas e R$ 3,4 bilhões em crédito foram contratados, cerca de 11% do valor da projeção inicial.
O anúncio do Pronampe foi feito pelo governo federal em 9 de maio, em meio a um pacote de medidas que, pela projeção do Planalto, chegava a R$ 50 bilhões em ações de recuperação do Rio Grande do Sul após a enchente. O Painel da Reconstrução, ferramenta desenvolvida pelo Grupo RBS, monitora estes anúncios e acompanha os repasses efetivamente realizados.
O Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) é um programa de governo federal destinado ao fortalecimento das empresas deste porte, instituído pela Lei nº 13.999, de 18 de maio de 2020, em meio à pandemia da Covid-19. A legislação que o rege foi alterada pela Lei nº 14.161, de 2 de junho de 2021, para permitir o uso do programa de forma permanente, como política oficial de crédito.
O governo federal se valeu das bases do Pronampe para criar o Pronampe Solidário RS. A iniciativa previa aporte de R$ 4,5 bilhões para concessão de garantias no Fundo Garantidor de Operações (FGO), além de mais R$ 1 bilhão para subvenção nas transações — valor que, posteriormente, seria ampliado.
As condições das contratações de crédito no Pronampe Solidário incluíam subsídio de 40% do valor do empréstimo por parte do governo federal, além de dois anos de carência antes de começar a pagar e possibilidade de parcelar o valor em até 60 prestações, com a taxa de juros sendo a Selic mais 6% ao ano. Os interessados poderiam contratar crédito no valor de até 60% do seu faturamento do ano anterior, com um limite máximo de até R$ 150 mil.
As operações do Pronampe Solidário no Rio Grande do Sul tiveram início por Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. Posteriormente, Banrisul, Sicoob e Sicredi também foram autorizados pelo governo federal a operar a linha especial do programa.
Em setembro, o Pronampe ficou por cerca de 20 dias com suas operações suspensas, após a medida provisória que o instituiu expirar. Depois da aprovação de um projeto de lei no Congresso, o programa foi retomado e executado até o último dia de 2024.
Fatores de limitação das contratações
Na avaliação de entidades empresariais gaúchas, o Pronampe Solidário teve importância significativa, mas alguns fatores impediram que as contratações de crédito chegassem mais perto da projeção inicial de R$ 30 bilhões do governo federal. Para o economista e gerente de relações governamentais da Federação do Comércio, Bens e Serviços (Fecomércio-RS), Lucas Schifino, os principais problemas na execução do programa foram os 40% de subsídio do valor contratado, que, no seu entendimento, deveria ter porcentagem maior, e também os limites de R$ 150 mil ou até 60% do faturamento no ano anterior de cada negócio.
— O governo deu 40% de subvenção, mas esses outros 60% são corrigidos pela Selic mais 6%. Com esse aumento da Selic, vai ficar bem mais pesado, e muita gente ficou com um pé atrás. Além disso, o limite no valor total possível de ser contratado foi muito baixo, pois muitas empresas tiveram prejuízos patrimoniais muito maiores, sem falar nos lucros cessantes do período em que os negócios ficaram fechados ou sem sua total capacidade. O interesse havia, tanto que o número total de operações foi alto, e o programa teve sua importância, mas o valor contratado teria sido mais alto se a subvenção fosse maior e o limite mais amplo — afirma.
Um dos negócios que contratou crédito via Pronampe Solidário foi o restaurante Mayô Gastronomia, localizado no Sava Iate Clube, na zona sul de Porto Alegre. Além dos danos materiais, o Mayô teve que ficar fechado por 35 dias entre maio e junho em razão da enchente, chegando a um prejuízo total estimado em R$ 500 mil.
— Contratamos o valor máximo, de R$ 150 mil, mas, se pudéssemos, contrataríamos um valor maior, para acelerar a retomada — conta Guilherme Grassotti, um dos sócios do estabelecimento.
Na visão de Rafael Goelzer, vice-presidente de integração da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul), outros fatores também contribuíram para que o volume de crédito contratado no Pronampe Solidário não fosse tão alto. Além de apontar que algumas empresas severamente atingidas sofreram dificuldades para apresentar certidões negativas e garantias de pagamentos aos bancos, Goelzer também destaca que a necessidade do negócio estar dentro da mancha de inundação para poder participar do Pronampe foi um limitador para as contratações.
— Nós insistimos muito com o governo federal para que os negócios que sofreram um grande déficit no seu faturamento, mesmo os que não foram diretamente alagados, também pudessem participar do Pronampe, ainda que com condições menos vantajosas do que os diretamente atingidos. Você teve todo o problema logístico no Estado, muitas empresas tiveram funcionários ou fornecedores atingidos, e mesmo assim não puderam contratar créditos no programa — ressalta.
O empresário Frederico Müller, sócio de dois restaurantes na Capital, experimentou essa diferença na prática. Para o Olivos 657, localizado no bairro Cidade Baixa, que foi alagado, conseguiu contratar recursos. Já para o Capincho, localizado no bairro Moinhos de Vento, que não foi inundado, não houve essa possibilidade.
— Se pudesse, também teria contratado crédito para o Capincho, pois o nosso faturamento diminuiu muito e foi muito difícil manter a operação. Além de termos parceiros que foram alagados, o turismo em Porto Alegre diminuiu muito com o aeroporto fechado, e uma boa parte do nosso público vem daí, de pessoas que passeiam no shopping ou que se hospedam no hotel, por exemplo, que também perderam muito movimento durante e após a enchente — detalha o empreendedor.
Governo federal considera programa um sucesso
No entendimento do governo federal, a criação e execução do Pronampe Solidário RS foi "um sucesso". Maneco Hassen, que coordena as ações de recuperação do Rio Grande do Sul realizadas pelo Planalto no Estado, aponta principalmente o número de operações realizadas como ponto de destaque.
— O alto número de operações e de empresas que acessaram os créditos no Pronampe já demonstra a importância do programa. Foi a primeira grande ação feita pelo governo federal para socorrer esses negócios, começou a operar rapidamente, e mais de 36 mil empresas foram socorridas, então acho que foi um sucesso — afirma Hassen.
Em relação aos apontamentos realizados pelas entidades empresariais, Maneco destaca que este foi o formato que o governo federal encontrou para executar o programa com maior agilidade no momento em que foi lançado.
— Os recursos estavam disponíveis para contratação, a projeção inicial de contratação foi feita com base no cenário do momento, que era de urgência, ainda durante a enchente, e as condições estabelecidas acabaram sendo as que eram possíveis naquele momento, com o limite de R$ 150 mil e a necessidade de estar dentro da mancha de inundação como critérios. Foi como esse programa foi formatado, lembrando que o governo também disponibilizou outras opções às empresas, como o próprio BNDES Emergencial — complementa.
Balanço das contratações
Ao todo, até o final de dezembro passado, foi contratado um valor de R$ 3.422.945.331,22 em crédito no âmbito do Pronampe Solidário, resultado de 37.199 operações realizadas por 36.172 empresas ou MEIs.
As pequenas empresas realizaram 18.593 operações, com R$ 2,37 bilhões em créditos contratados. As microempresas foram responsáveis por 15.628 operações, com R$ 952,8 milhões em créditos contratados, já os MEIs realizaram 2.978 operações, contratando R$ 93 milhões em créditos.
Entre os municípios, Porto Alegre foi a cidade que mais realizou operações, com 7.224 transações e R$ 739,7 milhões em créditos contratados. Na sequência, vêm Canoas, com 2.190 operações e R$ 202,2 milhões em contratação de créditos, e Caxias do Sul, com 1.982 operações e R$ 211,2 milhões em créditos contratados.