Enfileirando recordes na reta final do ano, a bolsa brasileira fechou 2023 em alta, afastando os temores que dominaram o mercado no primeiro semestre. No final do ano, o Ibovespa , principal indicador de desempenho da B3, avançou 22% ante o mesmo período do ano anterior.
Queda da inflação, que estimula recuo do juro, e mais clareza sobre questões fiscais do governo federal ajudam a explicar esse movimento de alta, segundo especialistas. Na largada de 2024, a bolsa segue com a tradicional ressaca de virada de ano, inflada por novos riscos globais. No entanto, o cenário segue positivo com perspectiva de queda de juro nos Estados Unidos e reformas internas.
Em 28 de dezembro, último pregão do ano, o Ibovespa anotou 134.185,23 pontos, acima dos 109.734,60 pontos observados no fechamento de 2022.
O chefe de pesquisa da Guide Investimentos, Fernando Siqueira, afirma que 2023 começou com certa cautela e desconfiança do mercado sobre alguns pontos, como a nova regra fiscal e comportamento do juro. No decorrer do ano, o ambiente interno ficou mais claro e o externo deu recado positivo, fortalecendo a bolsa, segundo Siqueira:
— No fim do primeiro semestre, isso tudo foi desfeito. A inflação caiu, o juro ficou com espaço para queda, o mercado começou a antecipar que Banco Central iria reduzir o juro ainda em 2023, o arcabouço fiscal foi aprovado. Isso deu uma ajuda para a bolsa no primeiro semestre. No fim do ano, o que melhorou a situação foi a expectativa de corte de juro nos Estados Unidos.
Na reta final de 2023, o Federal Reserve (Fed), banco central americano, manteve o juro na faixa de 5,25%-5,50% e antecipou que espera reduzir a taxa para 4,6% em 2024. Queda do juro americano cria ambiente mais favorável para economias emergentes, como o Brasil.
Valter Bianchi Filho, sócio-diretor da Fundamenta Investimentos, também cita o peso do mercado externo no desempenho da bolsa no fim do ano. O executivo afirma que os dados de inflação dos Estados Unidos, que mostraram ambiente mais benigno para o futuro, também teve peso nesse processo, porque projeta queda no juro no país americano:
— O grande movimento, principalmente em novembro, quando teve uma grande alta na bolsa, tem a ver com a leitura do mercado sobre a queda da inflação.
Gaúchas em destaque
O desempenho das empresas gaúchas na bolsa em 2023 mostra cenário diversificado. Um dos destaques é a Marcopolo, que teve alta de 166,6% em 2023, segundo dados da Fundamenta Investimentos, analisando papéis com maior liquidez. Na sequência, aparecem Randon e Grendene.
O sócio-diretor da Fundamenta Investimentos afirma que o desempenho acima da média da Marcopolo ocorre diante de alguns fatores, como retomada do setor de ônibus no pós-pandemia.
— A Marcopolo teve uma reação tardia à pandemia. Também tem uma certa sazonalidade na compra de ônibus em épocas de eleições municipais — destaca Bianchi Filho.
Na parte de quedas, alguns dos destaques, segundo dados da Fundamenta, são a Renner, que sofreu com competição com mercado chinês e endividamento da população, e a Gerdau, que sentiu impacto da disputa com importação de aço e juro elevado em parte do ano, segundo especialistas.
Cenário para 2024
Movimento tradicional de virada de ano, a ressaca marca os primeiros pregões de 2024 na B3. Na terça-feira (2), primeiro dia útil do ano, o Ibovespa fechou com queda. No dia seguinte, registrou alta. Nesta quinta-feira (4), voltou a anotar variação negativa.
Além desse efeito sazonal, novos riscos globais entram no radar, criando certa instabilidade na bolsa. Entram nesse rol a crise do Oriente Médio, com escalada na tensão no Irã, e dados que mostram emprego aquecido nos Estados Unidos.
O chefe de pesquisa da Guide Investimentos afirma que parcela do mercado estava muito otimista com queda do juro nos Estados Unidos ainda nos primeiros meses do ano. Agora, indicadores apontam que esse processo deve ocorrer no fim do primeiro semestre, segundo Siqueira:
— O dado que saiu sobre emprego nos Estados Unidos reforça essa tese. O que estamos observando nos últimos dias é que um pouco do exagero do mercado em relação a essa questão da queda do juro nos Estados Unidos está sendo desfeito.
O executivo afirma que é preciso ter mais dados ao longo do ano para projetar cenário para a bolsa com mais assertividade.
O economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating, Alex Agostini, afirma que a manutenção da queda do juro é um dos fatores que criam ambiente para a bolsa repetir bom desempenho neste ano:
— A bolsa tem potencial de chegar a 145 mil pontos, porque o juro vai continuar caindo aqui e isso estimula as compras, as vendas, a atividade econômica, ainda que o PIB vai crescer menos. Mesmo menor, será um crescimento sobre uma base fortalecida.
Os especialistas ouvidos pela reportagem de GZH apostam em um bom ano para o varejo, com retomada do consumo. Mas alertam para os dados de inadimplência e endividamento, que seguem elevados.
Outros destaques
- A eventual queda do juro dos Estados Unidos pode atrair investidores estrangeiros para o Brasil, ajudando a atividade econômica e a bolsa no país.
- No cenário interno, a aprovação da reforma tributária e do arcabouço fiscal diminui parte da desconfiança do mercado em relação ao governo federal.
- Com sinais de responsabilidade fiscal, agências de risco também elevaram nota do Brasil nos últimos meses.
- O dólar fechou 2023 com recuo de 8%. Especialistas afirmam que é difícil prever o futuro da moeda, mas o cenário, neste momento, caminha para estabilidade.