Depois de uma deflação de 0,07% em julho, a prévia da inflação, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), registrou alta de 0,28% em agosto, e jogou um banho de água fria nas projeções de cortes mais agressivos para a taxa de Juros, a partir da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), em 20 de setembro.
Isso acontece porque o indicador – que reflete o comportamento dos preços até a primeira metade do mês – não capturou o reajuste dos combustíveis, mas já avançou 0,35% ponto percentual (pp) na comparação com a taxa anterior (-0,07). O principal motivo foi a elevação de 4,59% no grupo de energia elétrica, fator que contribuiu com a maior escalada no grupo de habitação.
Para o economista e professor da UFRGS, Marcelo Portugal, o cenário deflagrado após a divulgação dos dados do IBGE, nesta sexta-feira (25), apenas reforça o quanto o “BC está correto e o Ministério da Fazenda equivocado”, no que diz respeito ao combate à inflação no país. Segundo ele, os juros em patamar mais elevado até o início deste mês, quando o Copom definiu a primeira redução (de 0,50 pp) em três anos, demonstraram a efetividade da estratégia, o que sugere, agora, uma descompressão monetária, via redução da Selic, realizada “aos poucos”.
Portugal afirma que a tarefa de conduzir o IPCA para o intervalo da meta (entre 3,25% e 4,75%, ao ano) ainda não está concluída. Por essa razão, acredita que o IPCA-15 de agosto antecipa pressões para o índice cheio e fará o BC seguir a estratégia explicitada na ata da última reunião do colegiado, ou seja, a realização de mais três diminuições, de 0,50 pp, em 2023, o que deixaria a Selic em 11,75% no fechamento do ano. E pondera: essa postura, ao contrário do que argumentam membros do governo e o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não tem gerado revés sobre a atividade econômica.
— A taxa de desemprego vem caindo e o PIB (Produto Interno Bruto) do segundo trimestre deverá ficar entre 0,3% e 0,5%, depois de ter crescido 1,9% no primeiro trimestre. A tentativa de ‘tomar risco inflacionário’ implementando estratégia mais agressiva de redução de juros poderá ter efeitos negativos em termos de não atingir a meta de inflação em 2024 — alerta.
A percepção é partilhada pelo economista-chefe da CDL-Porto Alegre, Oscar Frank. Ele anota: no ano o IPCA-15 acumula alta de 3,38% (acima da meta de 3,25% ao ano) e, em 12 meses, de 4,24% (abaixo do teto de 4,75%), patamar que, ao considerar o peso dos combustíveis, torna mais difícil a manutenção da inflação dentro do intervalo fixado.
— A surpresa inflacionária já na prévia, diminui a possibilidade de que tenhamos ciclo mais agressivo de redução de juros. Creio que ocorrerá o plano de voo originalmente traçado, que são cortes sucessivos de 0,5 ponto percentual na taxa Selic e não de 0,75% como alguns agentes do mercado imaginavam que iria acontecer — sustenta.
Frank acrescenta que os preços da gasolina e do óleo diesel no mercado nacional apresentam defasagem de 8% e 11%, respectivamente, em relação aos praticados internacionalmente. Em outras palavras, diz que ainda há margem para o surgimento de novas zonas de pressões inflacionárias associadas aos itens, que, mesmo sem contabilizar os recentes reajustes (o índice foi calculado entre os dias 14 e julho e 14 de agosto e a remarcação nas refinarias ocorreu no dia 15), já apresentaram alta de 0,46% no IPCA-15 de agosto.
No IPCA cheio, que terá o peso de mais 15 dias de combustíveis mais caros, na avaliação do economista André Perfeito, somado ao avanço da energia e dos automóveis após o encerramento dos incentivos governamentais, surgem como um novo problema e farão com que a as projeções “parem de melhorar”. Outra vez, a consequência imediata será “queda menos forte da Selic”, em razão do “acréscimo de cautela sobre a conduta do Copom”.
UMA BOA NOTÍCIA PARA OS ALIMENTOS
A principal boa notícia do IPCA-15 foi uma nova deflação no segmento de alimentos e bebidas. O índice que já havia ficado no campo negativo em julho (-0,4%) teve uma redução ainda mais pronunciada (-0,65%) em agosto. Com base no fato de que esses preços continuam com trajetória de queda no atacado, é provável, conforme Mauro Rochlin, doutor em Economia pela UFRJ e professor de Economia da FGV, que esse grupo faça o contrapeso na balança.
— Apesar do resultado pouco acima das estimativas, também há registros importantes e favoráveis, em particular o grupo de alimentação e bebidas que pode colaborar com uma eventual manutenção de movimentos menos conservadores do BC com relação aos juros. Mas, realmente, o impacto dos combustíveis, que deverá inflar o IPCA cheio, é que definirá os próximos passos — sustenta.
REAJUSTES EM PORTO ALEGRE INFLUENCIAM RESULTADO
O IPCA-15 de agosto registrou alta em sete dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados. Em Habitação (1,08%), segundo aponta o IBGE o maior impacto veio da alta da energia elétrica residencial (4,59%).
Porto Alegre, onde a variação nesse item foi maior (5,44%) é apontada, ao lado de Curitiba (9,68%) e São Paulo (4,21%), como fator de desequilíbrio. Isso porque, na capital gaúcha ocorreu um reajuste de 2,92% em uma das distribuidoras.
Também no grupo da habitação a alta da taxa de água e esgoto (0,20%) é explicada pelo IBGE em razão de reajustes de 3,45% em uma das concessionárias da capital gaúcha.
ENTENDA O INDICADOR
Qual a diferença entre IPCA e IPCA-15?
O IBGE destaca que o IPCA-15 difere do IPCA, a inflação oficial do país, somente no período de coleta e na abrangência geográfica. O IPCA costuma sair nos primeiros dias de cada mês, mostrando o resultado do mês imediatamente anterior. Já o IPCA-15 reflete o comportamento dos preços até a primeira metade do mês em que é divulgado.
IPCA
Considera período entre o primeiro e o último e último dia de cada mês e é realizado com famílias com rendimentos de um a 40 salários-mínimos, em 10 regiões metropolitanas, cinco municípios e no Distrito Federal.
IPCA-15
Usado como prévia de inflação, tem coleta fixada entre a segunda metade do mês anterior e a primeira metade do mês em que ocorre a divulgação de referência. O levantamento acontece em 11 áreas urbanas do país.