A busca de consumidores por energia solar mostra sinais de acomodação no Rio Grande do Sul após corrida acima da média em 2022. Dados das duas principais concessionárias de energia do Estado apontam que o número de novos projetos de geração distribuída (GD) reduziu no acumulado de 2023 até maio, ante igual período do ano passado.
Na área atendida pela CEEE Equatorial, a queda é de 15,8%. Já sob o guarda-chuva da RGE, o recuo é de 53% no mesmo recorte de tempo. Juro em patamar elevado, que encarece a adesão ao sistema, entrada em vigor do marco legal do segmento e comparação com base mais forte estão entre os principais fatores que explicam esses números, segundo especialistas e integrantes do setor.
De janeiro a maio, a CEEE Equatorial registrou 6.101 solicitações de acesso à geração distribuída. No mesmo período de 2022, foram 7.243 pedidos – 1.142 a mais. Mesmo em queda, o montante registrado neste ano é superior ao anotado no mesmo recorte de tempo de 2021 (2.183). A RGE não informou os dados absolutos, apenas a variação percentual.
Consumidores interessados em realizar a própria geração de energia com isenção de taxas pelo custo de distribuição tinham até o início de janeiro de 2023 para garantir o benefício até 2045. Diante desse cenário, clientes que pretendiam realizar esse investimento no início deste ano anteciparam o aporte para o fim do ano passado, segundo a coordenadora estadual da Absolar no Estado e sócia da Solled Energia, Mara Schwengber. Mas, ela destaca que o marco é apenas um dos fatores com peso na desaceleração de novos pedidos:
— Tem também a questão do aumento da taxa de juros, um fator que fez muitas empresas e pessoas físicas segurarem o investimento. Hoje, se percebe muito mais isso do que propriamente o peso do marco em si. Se a gente analisar, essa queda de novos projetos é relacionada a 2022, que foi um ano fora da curva, que teve o que chamamos de corrida do ouro.
Análise
Nesse sentido, Mara avalia que o setor caminha para uma normalização após o pico do ano anterior, com uma rede que segue crescendo e com demanda. Os dados mais recentes da Absolar corroboram a análise da empresária. Em um ano, a potência instalada de energia solar no Estado subiu de 1.396,80 megawatts (MW), em maio de 2022, para 2.217 megawatts em maio deste ano – crescimento de 58,7%. Já o número de sistemas subiu de 152.857 para 250.113 nesse período – avanço de 63,6%. Esse indicador leva em conta todos os tipos de conexões, seja via painéis solares em imóveis ou microusinas em pátios.
A Nono Ludovico, empresa que atua no ramo de pizzarias em Porto Alegre, é um dos negócios que investe na energia solar. O empreendimento decidiu ampliar o uso desse modelo no negócio com a construção de uma nova usina em Eldorado do Sul, onde já tem um sistema nesse molde. Os novos painéis foram instalados nos últimos dias.
Paulo Dalpian, 62 anos, proprietário da Nono Ludovico, explica que a decisão pela nova usina partiu da necessidade de expansão do negócio. Mesmo com nova taxação, por se enquadrar na linha de grandes consumidores, Dalpian avalia que o investimento segue sendo vantajoso:
— Mesmo assim, a energia segue sendo um bom negócio.
Em relação ao futuro, porém, diante da possibilidade de novas taxações, o empresário nutre certa desconfiança em relação ao ganho com esse sistema.
Edilson Deitos, coordenador do Grupo Temático Energia e Telecomunicações do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), destaca o efeito da mudança de legislação nesse processo. Segundo o especialista, existe um compasso de espera entre o público entender as novas regras e decidir investir no sistema:
— Até o mercado absorver esses custos e entender que ainda é vantajoso, leva um tempo.
Frederico Boschin, conselheiro do Sindienergia-RS e da Associação Brasileira de Geração Distribuída, afirma que a queda no apetite por novos projetos também pesa na movimentação de empresas do setor, que instalam os equipamentos de energia solar. Períodos com baixa em novos projetos pode frear o investimento em mão de obra por parte de negócios de porte menor. No entanto, afirma que o grande volume de adesão ao sistema solar nos últimos anos cria ambiente fértil para as companhias:
— O mercado não sofre como um todo porque a gente ainda tem uma série de atividades que continuam sendo buscadas por uma demanda que foi criada por esse volume gigantesco de usinas instaladas nos últimos anos.
Próximos meses
Coordenadora estadual da Absolar no RS, Mara Schwengber diz que o setor apresenta, desde maio, leve aceleração. Queda mais robusta nos insumos e equipamentos tem participação nessa reação, aponta, o que contribui para manter o investimento em energia solar atrativo. Para os próximos meses, Mara estima cenário mais aquecido diante dessa queda nos preços e retração na taxa Selic, principal indicador que baliza as operações de crédito e financiamentos:
— A gente imagina que, ao virar o semestre, deve ter demanda maior do que a observada no primeiro semestre, mas não igual a 2022.
Dólar em baixa também deve influenciar nesse cenário de otimismo, pois boa parte dos materiais usados pelo setor é importada.