A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (17) o pedido de urgência para o projeto que institui a nova regra fiscal. Foram 367 votos a favor e 102 contra. Isso permitirá que o texto seja votado diretamente no plenário, dispensando trâmites regimentais, como a análise nas comissões temáticas da Casa. A previsão é votar a proposta na próxima semana.
A nova regra fiscal substituirá o atual teto de gastos, que é um mecanismo que limita o crescimento de grande parte das despesas da União à inflação. Com a aprovação da urgência, o projeto será votado mais rapidamente, agilizando sua tramitação.
O deputado Cláudio Cajado (PP-BA) é o relator da matéria e incluiu na nova versão da proposta os chamados "gatilhos" para a contenção de despesas. Esses gatilhos são mecanismos que obrigam a redução de gastos sempre que o governo ultrapassar certos limites estabelecidos.
O líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), afirmou que a aprovação do requerimento de urgência da nova regra fiscal permite uma nova rodada de negociação com as bancadas até a próxima semana.
— A urgência vai permitir ao relator, deputado Claudio Cajado, dialogar com o governo e com as bancadas para chegarmos na próxima terça-feira com a matéria pronta para a votação — disse Guimarães.
Ele afirmou que se trata da principal pauta econômica do Legislativo:
— Estamos tratando de um tema que diz respeito ao país. Com o fim do teto de gastos, precisamos de um novo regime fiscal para garantir estabilidade, previsibilidade e readquirir a confiança do Brasil perante o mundo e perante os agentes econômicos.
O líder do União Brasil, deputado Elmar Nascimento (União-BA), destacou que a bancada é favorável à urgência.
— É uma matéria de Estado, não importa quem é governo e quem é oposição. Estamos votando algo importante para o país, para colocar a economia nos rumos, para reduzir os juros e dar a contribuição do parlamento — afirmou Nascimento.
Contrário à urgência, o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) afirmou que a proposta é “insuficiente”. Ele disse ainda que não há clima para votação da proposta após a decisão da Justiça Eleitoral que indeferiu a candidatura do deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR) e, portanto, o retirou do mandato.
— Não há nada mais urgente do que debater as prerrogativas parlamentares e a importância de garantirmos a presença de todos os deputados eleitos pelo povo — disse van Hattem.
A deputada Bia Kicis (PL-DF) também criticou o projeto:
— Temos um sistema muito melhor, que é o teto de gastos, por isso somos contra essa urgência.
O deputado Tarcísio Motta (PSOL-RJ) afirmou que o PSOL é contra a urgência, apesar de ser da base de apoio ao governo. Ele disse que o partido discorda da adoção do novo regime fiscal, ao qual chamou de "calabouço fiscal".
O que diz a proposta de nova regra fiscal
A proposta possui gatilhos e sanções para caso de não cumprimento de metas fiscais. O texto prevê:
- A elevação das despesas (gastos) do governo fica condicionada ao equivalente a 70% de crescimento das receitas (arrecadação) consolidada no ano anterior;
- Na prática, permite que o governo possa elevar gastos setoriais se tiver capacidade de elevar a arrecadação e potencializar os recursos para os serviços públicos e programas sociais;
- A regra permite, mas estipula um teto em 2,5% do crescimento do PIB, que o governo reforce o orçamento de setores específicos em momento macroeconômicos considerados favoráveis;
- Tem como meta zerar o déficit fiscal já em 2024, diminuir os encargos com a dívida pública e gerar superávit primário (resultado positivo de todas as receitas e despesas do governo, excetuando gastos com pagamento de juros) de 0,5% PIB em 2025 e de 1% do PIB em 2026;
- Prevê que nos momentos de baixa atividade econômica haja um crescimento orgânico das despesas, assim como, caso ocorra o descumprimento das metas (entre 0,6% e 0,25% do PIB), as despesas possam ser elevadas em 50% da margem das receitas no primeiro ano e 30% no segundo;
- Prevê um pequeno crescimento da dívida pública bruta até 2025 e a estabilização, em 2026, em 76,54% do PIB. Essas projeções, no entanto, ocorrem no cenário em que o resultado primário fique no centro dos limites previstos para as bandas, pois caso o governo economize menos do que o esperado, a dívida aumentará de 74,11% do PIB em 2023 para até 77,34% em 2026;
- O foco do mecanismo fiscal está no nível das receitas para controlar o aumento de gastos.
Entenda o passo a passo
1 – Apresentação
Um projeto de lei complementar (PLC) pode ser apresentado por qualquer deputado ou senador, comissão da Câmara ou do Senado, pelo presidente da República, pelo procurador-geral da República, pelo Supremo Tribunal Federal, por tribunais superiores e cidadãos. Esse tipo de projeto estipula regras para cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios, em temas especificados pela Constituição Federal.
2 – Entrada
Via de regra, a tramitação começa pela Câmara. A exceção é para os PLCs apresentados por senadores. O Senado funciona como a Casa revisora para os projetos iniciados na Câmara e vice-versa. Se o projeto da Câmara for alterado no Senado, volta para a Câmara. Da mesma forma, se for alterado pelos deputados, volta ao Senado. Ou seja, a Casa onde o projeto se iniciou tem a palavra final sobre seu conteúdo, podendo aceitar ou não as alterações feitas na outra Casa.
3 – Comissões
Após protocolados, os projetos são distribuídos nas comissões temáticas. Além das que avaliam o mérito, existem duas que podem analisar outros aspectos, a de Finanças e de tributação (análise de adequação financeira e orçamentária) e de Constituição e Justiça (análise de constitucionalidade). Só então o PLC estará habilitado a ser votado em Plenário.
4 – Comissão especial
Os projetos que tratarem de assuntos relativos a mais de três comissões de mérito são enviadas para uma comissão especial criada especificamente para analisá-los. Essa comissão substitui todas as outras e dará o parecer final para que a proposta vá à Plenário.
5 – Urgência
O projeto de lei complementar pode tramitar em regime de urgência se o Plenário aprovar requerimento com esse fim. Geralmente, a urgência depende de acordo de líderes, o que permite que seja votado rapidamente no Plenário, sem necessidade de passar pelas comissões. Os relatores da proposta nas comissões dão parecer oral durante a sessão, permitindo a votação imediata.
6 – Presidência
O presidente da República também pode solicitar urgência para votação de projeto de sua iniciativa. Nesse caso, a proposta tem de ser votada em 45 dias ou passará a bloquear a pauta da Câmara ou do Senado (onde estiver no momento).
7 – Aprovação
Os projetos de lei complementar exigem quórum diferenciado para a sua aprovação, que é, no mínimo, a maioria absoluta de votos favoráveis, ou seja, 257 votos dos 513 deputados federais. No Senado são necessários 41 dos 81 senadores com cadeira na Casa.
8 – Sanção e veto
Quando aprovados no Congresso, os PLCs são enviados ao presidente da República, que terá prazo fixado em 15 dias úteis para a sanção ou veto. Os vetos, que podem ser totais ou parciais, têm de retornar ao Congresso para serem votados. Para rejeitar um veto, também é preciso o voto da maioria absoluta dos deputados (257) e dos senadores (41).