O Poder Judiciário acatou pedido de reconsideração feito pelo governo estadual e autorizou, na tarde desta quarta-feira (14), a continuidade do processo de privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan).
O sinal verde foi emitido menos de 24 horas antes do horário marcado para a entrega das propostas por investidores privados interessados na aquisição, com preço mínimo de R$ 4,1 bilhões. A apresentação dos envelopes, contendo uma série de documentos comprobatórios, irá ocorrer nesta quinta-feira (15) na B3, bolsa de valores sediada em São Paulo, das 9h às 12h. Na sequência do cronograma de privatização, segue agendada para o dia 20 a sessão de abertura das propostas e lances de viva-voz, ocasião em que os interessados competirão apresentando maiores valores pela compra da empresa.
— Está tudo mantido. Tínhamos convicção de que foi conduzido com lisura e transparência. Isso é reconhecido nessa decisão de revisão — afirma o chefe da Casa Civil, Artur Lemos.
Ele avaliou que, no momento, não é possível avaliar se o vaivém jurídico, às vésperas dos atos de privatização, terá força para gerar instabilidade capaz de afastar investidores.
— Só vamos poder responder a essa pergunta no dia 20 de dezembro. Temos convicção de que é o melhor caminho, seja pela prestação do serviço ou pela preservação ambiental. Jogamos esgoto não tratado em rios e mananciais — sustenta Lemos.
No dia 9 de dezembro, o desembargador Alexandre Mussoi Moreira concedeu uma decisão liminar suspendendo o processo de privatização da Corsan, atendendo ação do Sindiágua-RS. O argumento foi de que a Constituição Estadual contém a determinação de que o Estado tenha estrutura para executar serviços de saneamento, o que ficaria descoberto com a venda total da Corsan.
O governo estadual apresentou pedido de reconsideração afirmando que criou a Divisão de Saneamento (Disan), órgão da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura, que seria capaz de coordenar a política estadual de saneamento mesmo com a alienação da Corsan, entre outros argumentos.
Mussoi acatou, reviu sua posição inicial e autorizou a continuidade do negócio.
“Todo o processo de desestatização da Corsan vem sendo conduzido sem que tenha sido constatada qualquer irregularidade”, justificou o magistrado, citando ainda a aprovação de lei em 2021 cujo texto permitiu ao Estado tomar as medidas de privatização.
Embora tenha autorizado a entrega das propostas e as suas aberturas, com a disputa por lances, Mussoi manteve “vedadas provisoriamente” as etapas finais, como a assinatura do contrato de compra e venda e a efetiva transferência acionária. Isso somente deverá ser liberado após análise de mérito do recurso judicial.
Sindicato avalia medidas e chama greve
O Sindiágua-RS, representante dos trabalhadores do setor, avalia a hipótese de apresentar outro pedido de reconsideração judicial. A entidade também busca medidas junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE). Na esfera política, está sendo planejada uma greve dos servidores da Corsan entre 23 de dezembro e 2 de janeiro, mas ainda não é possível avaliar o eventual nível de adesão. A paralisação terá de ser aprovada no colegiado do Sindiágua-RS.
A organização tem uma série de críticas à privatização. Uma das principais justificativas para a venda é a necessidade de alcançar índice de 90% de coleta e tratamento de esgoto até 2033, conforme definição do novo marco do saneamento.
Atualmente, as economias faturadas de esgoto da Corsan alcançam 19% do todo. O sindicato afirma que, se somadas as Parcerias Público-Privadas (PPPs) feitas na Região Metropolitana, as obras em andamento e os investimentos do programa Solutrat, a Corsan poderia chegar em período breve ao indicador de cerca de 77% em coleta e tratamento.
— Vai ser vendida para alguém que terá de fazer 13% das obras de esgoto. Vai ser um baita negócio para a empresa privada — diz Arilson Wünsch, presidente do sindicato.
Político de confiança do governador reeleito Eduardo Leite (PSDB), Lemos rebate: — O Solutrat não é de agora. Por que não foram feitos os investimentos necessários? Precisa de, no mínimo, R$ 13 bilhões para esses investimentos. Não é com essa gama de serviços que o sindicato alega que chegaremos ao universo de 90% (de tratamento e coleta de esgoto).
O Sindiágua ainda afirma que, nos próximos 20 anos, a Corsan tem R$ 117 bilhões de receita para receber dos seus 307 contratos ativos com municípios gaúchos. Wünsch repete que o negócio será melhor para o investidor, que terá de desembolsar um valor mínimo de R$ 4,1 bilhões, sem contar os ágios dos lances. Lemos, mais uma vez, rebate pelo Palácio Piratini.
— Por que não trazem também a despesa desse período? Por que não trazem o cerca de R$ 1 bilhão em despesas trabalhistas? Ou os R$ 2 bilhões em dívidas com a previdência? Os dados desfavoráveis não são trazidos. Isso não é bom. Parece que querem depreciar o ativo — lamenta Lemos, citando ainda distorções administrativas que existiriam dentro da Corsan.
Por fim, o Sindiágua ainda alega uma situação de possível insegurança jurídica. Dos 307 contratos ativos da Corsan, somente 76 municípios aprovaram a privatização, diz Wünsch.
— A gente vê os resultados pela privatização da CEEE (CEEE-D). Não houve os prejuízos que disseram que aconteceriam. A tarifa, por exemplo, é uma questão de regulação. Não se aumentou a conta como falavam. A gente vê a privatização com bons olhos — comentou Lemos.