A Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta segunda-feira (21), a medida provisória que abre caminho para a privatização da Eletrobras, estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia que responde por 30% da energia gerada no país. Apresentado pelo relator, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), o texto foi aprovado por 258 votos a 136. A matéria segue para sanção presidencial.
O modelo de desestatização prevê a emissão de novas ações a serem vendidas no mercado sem a participação da empresa, resultando na perda do controle acionário de voto mantido atualmente pela União. Com o aval do Congresso, o governo poderá dar prosseguimento aos preparativos para emissão de novas ações da empresa, prevista para o primeiro trimestre de 2022, por meio da qual a União vai reduzir sua fatia na companhia de cerca de 60% para 45%. Contudo, a proposta é fortemente criticada por parlamentares de oposição e a aprovação deve acabar sendo judicializada.
A Câmara já tinha aprovado a MP em 20 de maio, e o Senado no dia 17 de junho. Como os senadores modificaram o texto aprovado pelos deputados, ele precisava voltar para uma nova análise da Câmara. A medida provisória precisava ser aprovada até esta terça-feira (22) para não perder validade.
Ao longo desta tarde, em votação em separado, os deputados rejeitaram, por 394 a dois, as sete emendas propostas pelos senadores e que foram excluídas pelo relator na Câmara. Depois, analisaram os chamados destaques, que tinham por objetivo modificar o conteúdo da MP.
Entre os trechos retirados por Nascimento estão as emendas que obrigavam a Eletronorte a vender energia da hidrelétrica de Tucuruí a preços mais baixos para a indústria na região amazônica, e que o aumentava um subsídio embutido na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), para permitir a compra de uma permissionária de Santa Catarina por outra distribuidora.
O relator também sugeriu rejeitar, a pedido do governo federal, a emenda que determinava indenização para o Estado do Piauí pela privatização de uma distribuidora federalizada há 20 anos — o Senado havia previsto indenização no valor de cerca de R$ 260 milhões. Em troca da renegociação de dívidas estaduais com a União, a empresa passou a pertencer à Eletrobras e foi privatizada em 2018.
O parlamentar ainda excluiu o trecho que detalhava a abertura do mercado livre para todos os consumidores até 2026. Segundo ele, o tema, incluído pelos senadores, foi mal recebido pelos deputados e foi considerado por alguns deles um dos "jabutis" da proposta (como são chamadas as emendas estranhas à proposta original). O assunto será tratado no projeto de lei que aborda o novo marco do setor elétrico, já aprovado no Senado e em tramitação na Câmara.
O plenário aprovou ainda emenda prevendo o uso de batalhões de engenharia do Exército em obras de revitalização dos rios São Francisco e Parnaíba.
O texto irá aumentar o custo da energia para consumidores em R$ 84 bilhões nas próximas décadas. Por sua vez, o governo sustenta que a privatização da estatal e as medidas incluídas pelo Congresso podem reduzir a conta de luz em até 7,36%.
Terras indígenas
O relator da MP na Câmara, Elmar Nascimento, manteve um trecho que foi fundamental para a obtenção dos votos dos três senadores de Roraima — Chico Rodrigues (DEM), Mecias de Jesus (Republicanos) e Telmário Mota (Pros). A emenda que atropela o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) no licenciamento para a construção da linha de transmissão de energia Manaus-Boa Vista.
Do total de 721 quilômetros do traçado previsto para ser erguido, 125 quilômetros passam dentro da terra indígena Waimiri Atroari, onde estão 31 aldeias e vivem 1,6 mil índios. Pela Constituição, as comunidades indígenas precisam ser consultadas sobre esse tema, em atendimento a uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que garante esse direito. Segundo a Câmara, o documento já foi entregue e está sendo analisado pelos conselhos indígenas.
Direitos trabalhistas
Duas emendas aprovadas tratam de questões trabalhistas. Uma delas limita a 1% das ações remanescentes da Eletrobras em poder da União o lote que poderá ser comprado pelos empregados da empresa e de suas subsidiárias em virtude de demissão após a desestatização. A opção pela compra de ações com o dinheiro da rescisão trabalhista deverá ser feita em até 6 meses da demissão e o preço da ação a ser vendida seria aquele de cinco dias antes da edição da MP (em fevereiro deste ano).
Em vez de ser facultativo, como no texto da Câmara, a redação que irá à sanção determina ao Poder Executivo contratar os empregados da Eletrobras demitidos sem justa causa nos 12 meses seguintes à desestatização em empresas públicas federais para cargos de mesma natureza e com salários equivalentes aos anteriormente recebidos.
Lira nega que haja "jabutis" na medida
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), rebateu as acusações de que a proposta tenha "jabutis" em seu teor. Ele afirmou que as mudanças incluídas por deputados e senadores têm pertinência temática, já que tratam de setor energético.
— Se a medida provisória falar de energia, e nos dissermos que matéria pertinente com a energia é jabuti, depreciaremos o trabalho de deputados e deputadas que têm total respaldo para fazer quaisquer emendas que pensem ser meritórias, e o plenário decide por sua maioria — afirmou.
A MP da Eletrobras foi a primeira proposta de privatização aprovada pelo Congresso aprovada durante a gestão de Bolsonaro. Até o momento, o governo não conseguiu vender nenhuma estatal de controle direto da União. Pelo contrário, criou uma nova, a NAV, responsável pela navegação aérea.
Com informações da Agência Câmara de Notícias