A crise do coronavírus provocou, em abril, uma destruição de empregos com carteira assinada no Rio Grande do Sul. No período, a indústria foi o setor que mais sofreu os efeitos no mercado de trabalho, com perda de quase 25,5 mil vagas formais no Estado. O saldo decorre da diferença entre 33,8 mil demissões e 8,3 mil contratações. Os dados integram o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado pelo Ministério da Economia.
Abril foi o primeiro mês completo com medidas de distanciamento social para frear o avanço da covid-19 entre os gaúchos. Puxado pelo desempenho das fábricas, o Rio Grande do Sul perdeu 74,6 mil postos formais no período. O saldo é superior à população de um município do porte de Alegrete (73,5 mil habitantes), na Fronteira Oeste. Também é o pior para o intervalo desde o início da série histórica disponível – há dados regionais a partir de 1992.
Economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), André Nunes de Nunes atribui o resultado no setor a uma combinação de fatores. Um deles é a suspensão de pedidos. Segundo pesquisa feita pela Fiergs na primeira quinzena de abril, 56,6% das indústrias gaúchas registraram cancelamento de encomendas. Com queda na demanda por produtos, decidiram fazer cortes para tentar aliviar o caixa, avalia Nunes.
O economista também menciona que, na comparação com serviços e comércio, a atividade industrial sofre mais restrições para adotar o regime de home office. Trabalhadores de linhas de produção não conseguem exercer suas tarefas em casa.
Em abril, o governo federal chegou a autorizar o corte de jornada e salários ou a suspensão de contratos no país. A medida buscava preservar empregos, mas, até ser colocada em prática, as empresas já haviam sofrido os primeiros prejuízos da pandemia, afirma Nunes.
– A indústria entendeu que os meses seguintes seriam de dificuldades – resume.
Depois das fábricas, o setor de serviços foi o segundo que mais fechou vagas em abril no Rio Grande do Sul. No período, a atividade encerrou quase 23,4 mil empregos. Em seguida, apareceu o comércio, que amargou perda de 19,7 mil postos com carteira assinada.
– Os dados são uma tragédia. A saúde financeira de muitas lojas é frágil. Quando veem a receita colapsar, não têm condições de manter o fluxo de pagamentos. Uma das primeiras alternativas é pensar em demissões – analisa a economista-chefe da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado (Fecomércio-RS), Patrícia Palermo.
Financiamento
O desempenho gaúcho acompanhou a avalanche de números negativos sentida em outras regiões brasileiras. Em abril, o país perdeu 860,5 mil empregos, o pior saldo para o mês desde o início da série histórica, em 1992. O número é superior às populações, somadas, de Caxias do Sul e Canoas (857,5 mil habitantes).
O setor de serviços fechou quase 362,4 mil vagas, amargando a maior destruição no Brasil. O comércio, por sua vez, encerrou 230,2 mil postos com carteira assinada. No ranking nacional, a indústria foi a terceira atividade que mais perdeu empregos (196 mil).
Professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), a economista Maria Carolina Gullo sublinha que um dos entraves vividos por empresas hoje é a dificuldade de acesso a crédito. Sem financiamento para quitar despesas, muitas são forçadas a demitir. Diante das dificuldades, a melhora no mercado de trabalho tende a ocorrer em ritmo lento, assim como a retomada da atividade econômica, frisa Maria Carolina, que também integra a Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul:
– Empresas voltaram a funcionar com número menor de funcionários no Estado, atendendo a decreto do governo. Retomaram operações, mas de forma muito lenta.
RS pode ter alívio apesar das incertezas
Até o momento, não há clareza sobre a duração da pandemia e seus impactos nos negócios. Mesmo assim, analistas avaliam que o Estado pode dar passo à frente na tentativa de reduzir os prejuízos gerados pela covid-19 a empresas e trabalhadores.
Além de registrar menor nível de contaminação do que outras regiões do país, o Rio Grande do Sul iniciou plano de reabertura gradual da economia. Chamado de distanciamento controlado, o modelo leva em consideração o quadro epidemiológico de 20 regiões para permitir ou não o funcionamento dos negócios. A iniciativa entrou em vigor em 11 de maio.
– O mérito do plano é trazer uma estratégia para enfrentar a situação. Além disso, divide o Rio Grande do Sul em regiões, e não fecha todo o Estado, o que é importante para diminuir os impactos econômicos – diz o economista-chefe da Fiergs, André Nunes de Nunes.
A economista-chefe da Fecomércio, Patrícia Palermo, avalia que o projeto é “positivo” e “traz maior previsibilidade” para as empresas. Por outro lado, lembra que, se uma região receber bandeira vermelha, tem de fechar setores como o comércio, considerado não essencial – a lógica é a mesma para a cor preta. Se houver avanço do vírus, novas paralisações colocariam em risco mais vagas de trabalho, argumenta Patrícia.
Em abril, os pedidos de segurodesemprego cresceram 45,1% no Estado, em relação a igual período de 2019. Foram 52,7 mil solicitações, aponta a Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social.
– Maio deve ser outro mês ruim, mas não tanto quanto abril. A grande questão é saber como será a retomada da economia nos próximos meses – declara Nunes.
Professora da UCS, a economista Maria Carolina Gullo afirma que a pandemia deve elevar a informalidade entre trabalhadores, tendência que já preocupava antes de o coronavírus golpear os negócios.