O governo federal confirmou nesta quarta-feira (1º) a edição de uma Medida Provisória (MP) que autoriza corte salários e jornadas de trabalhadores durante a crise provocada pelo coronavírus. As reduções poderão ser feitas em qualquer percentual, podendo chegar a 100%.
Trabalhadores afetados receberão uma compensação do governo que pode chegar a 100% do que ganhariam de seguro-desemprego em caso de demissão. Essa complementação de renda tem regras diferentes dependendo do tamanho da empresa.
Após recuo do presidente Jair Bolsonaro, a nova medida libera a suspensão de contratos de trabalho por até dois meses, mas estabelece um auxílio do governo para esses casos.
A medida recebeu aval de Bolsonaro e será editada até esta quinta-feira, informaram técnicos do Ministério da Economia. Por se tratar de uma MP, a medida valerá imediatamente após a publicação e poderá ser adotada pelos empregadores. Caberá ao Congresso validar o texto.
O governo quer permitir que os patrões suspendam os contratos de trabalho por até dois meses, mas há uma garantia de renda para os empregados. Essa pausa no contrato pode ser negociada entre o empregador e o funcionário, sem a participação de sindicatos.
Se a empresa optar pela suspensão de contrato, as regras para os patrões mudam dependendo do faturamento. No caso de uma companhia dentro do Simples (faturamento bruto anual até R$ 4,8 milhões), o empregador não precisa dar compensação ao trabalhador durante os dois meses, e o governo vai bancar 100% do valor do seguro-desemprego.
Quando o faturamento superar esse patamar, o patrão deverá arcar com 30% do salário do empregado. O governo entra com 70% do valor do seguro-desemprego.
Para trabalhadores de menor renda, a redução dos ganhos em caso de suspensão de contrato deve ser, portanto, pequena. Quem hoje recebe um alto salário deverá ter uma queda maior, pois o benefício é balizado pelo valor do seguro-desemprego, que varia de um salário mínimo (R$ 1.045) a R$ 1.813.
A medida provisória também define regras para a modalidade de redução de carga horária. Isso poderá durar até três meses.
A MP define tratamentos distintos para três faixas de renda — até três salários mínimos (R$ 3.135), de três salários mínimos a dois tetos do INSS (R$ 12.202,12) e acima de dois tetos previdenciários.
O primeiro grupo, e principal alvo do programa, reúne empregados formais que recebem até três salários mínimos (R$ 3.135). Para esses trabalhadores, bastará um acordo entre funcionário e patrão para efetivar o corte.
Nesse caso, o governo pagará ao trabalhador uma proporção do valor do seguro-desemprego equivalente ao percentual do corte de salário. A compensação será de 25%, 50% ou 70% do seguro-desemprego, que varia de R$ 1.045 a R$ 1.813,03.
O segundo grupo do programa de proteção ao emprego tem renda mensal entre R$ 3.135 e R$ 12.202. Trabalhadores com esse perfil salarial têm regras diferentes. A jornada e rendimentos podem ser reduzidos em até 25% por acordo individual — direto entre o patrão e o funcionário.
Para negociações de cortes superiores, o acordo precisará ser coletivo, intermediado por sindicatos.
O governo avaliou que nesses casos uma diminuição 50% ou até 70% no salário representaria uma perda muito grande e, por isso, o trabalhador precisa de uma representação sindical.
Como a compensação emergencial leva em consideração o percentual de diminuição na jornada e o valor seguro-desemprego, cujo teto é R$ 1,8 mil, há uma limitação para que a renda seja compensada com a ajuda do governo.
A negociação entre empresa e funcionário será mais flexível para aqueles trabalhadores considerados hipersuficientes, cujos salários são duas vezes o teto do INSS ou mais e que possuem diploma de ensino superior. Esses critérios de classificação já estão previstos na CLT.
Para esse terceiro grupo, o tamanho do corte na jornada e no salário poderá ser decidido em acordo individual, independentemente do percentual. Como o auxílio do governo é calculado pelo seguro-desemprego, trabalhadores com esse perfil deverão ter perdas de rendimento maiores.
Esse trecho da medida se sustenta em um ponto incluído na CLT pela reforma trabalhista aprovada pelo governo Michel Temer em 2017, que regulamentou o conceito de trabalhador hipersuficiente. Para esse profissional, a lei autoriza que as relações contratuais sejam objeto de livre negociação entre empregado e patrão. Para eles, é permitida definição individual sobre jornada de trabalho, banco de horas, plano de cargos e salários, entre outros pontos.
Inicialmente, a equipe econômica anunciou que daria autorização para empregadores reduzirem salários e jornadas de funcionários em até 50%. Não haveria nenhuma diferenciação por renda. Nesse caso, o governo liberaria uma compensação apenas para pessoas com remuneração de até dois salários mínimos (R$ 2.090).
Esses trabalhadores receberiam uma antecipação de 25% do valor ao qual teriam direito caso fossem demitidas e solicitassem o seguro-desemprego.
No novo formato da MP, a compensação do governo não será mais uma antecipação. Desse modo, caso seja demitido no futuro, o trabalhador não terá descontados os valores já recebidos neste ano.
Em outra Medida Provisória publicada na última semana, Bolsonaro chegou a autorizar a suspensão de contratos por até quatro meses sem nenhum tipo de compensação pelo empregador ou pelo governo. O dispositivo acabou revogado pelo presidente sob o argumento de que a medida foi mal interpretada e que haveria uma contrapartida do governo.