A recente euforia dos brasileiros com a Bolsa de Valores, ilustrada pelo avanço de 2018 até novembro de 2019, quando o número de pessoas que aplicam em ações dobrou, chegando a 1,6 milhão no país — arrefeceu com as recentes desvalorizações em razão do coronavírus. O Índice Bovespa (Ibovespa), que acompanha os papéis mais negociados no pregão, chegou a cair 4,9% com o avanço da doença.
O temor é que a economia da China, epicentro da doença, seja duramente afetada, freando o crescimento do país asiático e a compra de produtos do Brasil. É uma cadeia de eventos que afetaria o lucro das empresas do brasileiras e derrubaria suas ações na Bolsa.
— Este movimento costuma ocorrer quando há eventos não previstos, como uma epidemia, um ataque terrorista ou cenário de conflito militar, como a tensão entre Estados Unidos e Irã no início do ano — explica Denílson Alencastro, economista-chefe da Geral Investimentos.
Em 23 de janeiro, o Ibovespa chegava ao seu recorde histórico, aos 119,5 mil pontos. Nos dias seguintes, com a propagação do coronavírus para além da província chinesa de Wuhan e os primeiros casos suspeitos no Brasil, o índice começou a mergulhar. Bateu em 113,7 mil pontos na sexta-feira passada (31), mas, gradativamente, voltou a subir.
— O mercado se recupera conforme surgem notícias de que a mortalidade do vírus não é tão elevada e de que os países estão agindo para controlar a epidemia. Isso, junto com alguns sinais positivos da economia brasileira, ajudam na retomada da bolsa — afirma Carlos Müller, analista-chefe da Geral.
Um relatório do banco BTG Pactual verificou que casos anteriores de epidemias, como o ebola, a Sars e o zika, causam efeito apenas do curto prazo na Bolsa. Em todas situações, entre três e seis meses após o surto, os valores das ações voltaram à normalidade.
Prova de fogo para investidores
Daniela Casabona, sócia-diretora da consultoria financeira FB Wealth, observa que esta é a primeira prova de fogo para milhares de brasileiros que estão descobrindo a Bolsa, mas avalia que não há motivo para pânico.
— A Bolsa é assim mesmo, tem que ter paciência e apetite à volatilidade. Mas o caso ilustra como é importante que as pessoas mantenham uma parte de seus investimentos em aplicações mais estáveis, para ter uma reserva para imprevistos imune a grandes oscilações — afirma.
Embora a tendência no longo prazo seja que a Bolsa se reerga — nesta terça-feira, já havia recuperado parte das perdas, chegando a 115,5 mil pontos —, quem contava com o dinheiro para breve ficou em uma situação delicada. A sugestão de analistas financeiros é que não se resgate agora o valor aplicado em ações.
— O melhor é não "realizar" o prejuízo tirando agora o dinheiro dos fundos de ações. Na verdade, quando há uma queda é a hora de investir mais e esperar a subida, e não de resgatar — lembra Denílson.
Sem susto na renda fixa
Quem tem dinheiro em aplicações como poupança, títulos do Tesouro, fundos de renda fixa, CDBs, Letra do Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA) não tem motivo para se preocupar, dizem especialistas. Isso porque estas aplicações, chamadas de renda fixa, são conectadas à Taxa Selic, que não sofre efeito imediato de crises internacionais.
Um impacto indireto sobre estas aplicações poderia ser a alta do dólar, que pressionaria os preços de produtos importados e elevaria a inflação no Brasil, apertando os ganhos dos investidores. Entretanto, Daniela Casabona minimiza o risco.
— O efeito do coronavírus é de curto prazo, é muito improvável que cause um aumento generalizado de preços ou force o governo a mexer no Juro Básico. Neste aspecto, quem está na renda fixa está em segurança — afirma a especialista.