Além da pandemia do coronavírus, 2020 também não está sendo um bom ano para a agricultura gaúcha. De janeiro a maio, os produtores rurais tiveram que lidar com a estiagem. Em agosto, foi a geada fora de época que afetou as lavouras, aliada a episódios de granizo. Agora, é novamente a escassez de chuva que castiga o Estado desde setembro, principalmente nas regiões Norte e Noroeste.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o acumulado de chuva nessas regiões, em outubro deste ano, está abaixo dos 50 milímetros, sendo que a maioria das cidades não registrou precipitação ao longo deste mês. No mesmo período do ano passado, o acumulado chegou a 250 milímetros.
Em Santa Rosa, por exemplo, choveu apenas 51,5 milímetros na cidade em setembro deste ano, quando a média esperada é de 162 milímetros. Em outubro a precipitação foi ainda menor, de 5,4 milímetros – a média para outubro é de 268,1 milímetros. Em Passo Fundo, outra cidade castigada pela falta de chuva, a precipitação neste mês está em 12,6 milímetros, quando a média é de 225 milímetros. No ano passado, por exemplo, foram 338 milímetros registrados ao longo do 10º mês.
Morador de Santo Ângelo, o agricultor Santo Luís Pedó, conhecido como seu Pedó, de 57 anos, tem 20 hectares onde cultiva, principalmente, trigo e milho.
— Está sendo muito difícil. O milho está na fase de crescimento e não teve nada de chuva. Faz quase 60 dias que não registramos chuva considerável, aquela que molha o solo, então poderemos quase considerar perdida essa safra — lamenta.
A mesma preocupação tem o agricultor Luiz Valdecir Pertuzzati, de Três Arroios. Com 19 hectares de milho, trigo e soja, ele relata que a situação é delicada na região:
— A falta de chuva está afetando o milho, que era para estar em pleno desenvolvimento, está atrasando o plantio de soja e afetando também o setor leiteiro, já que não dá para plantar a pastagem, pela falta de umidade na terra, e a pastagem de inverno já terminou — observa.
Gilmar Ostrovski, coordenador da cooperativa Ecoterra, também de Três Arroios, alerta para perdas também em outras culturas, como ervilha, alho, cebola, entre outras.
— Está terrível. Estamos vivendo um momento de desespero. Trabalhamos com diversidade de produção e as perdas estão grandes. Algumas delas, como ervilha, estão com 100% de perda na lavoura. Moranga também está praticamente sem ter como recuperar. Culturas novas, como a batata doce, que seriam colhidas em 35 a 40 dias, nós nem conseguimos plantar ainda, porque falta umidade no solo — alerta.
De acordo com o diretor técnico da Emater, Alencar Paulo Rugeri, a situação atual é atípica no Estado, pois esse seria um período de chuvas e não de seca.
— É um fenômeno que está posto e que causa esses desarranjos nas culturas. Milho e trigo, por exemplo, já estão impactados e, dependendo da região, o milho já tem perdas significativas. No caso da soja, o pessoal estaria plantando, mas ainda não tivemos umidade de solo suficiente para iniciar o plantio — observa.
Rugeri alerta que 2020 está se assemelhando a 2004 e 2005, quando o Rio Grande do Sul teve duas safras com problemas.
— Nós vivemos um ano muito complicado para agricultura. O único fator favorável é o preço, mas não adianta ter preço e não ter produto — salienta.
Segundo o engenheiro ambiental e hidrólogo da Sala de Situação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema), Lucas Giacomelli, o Estado está sob ação do La Niña, o que provoca a diminuição de chuva na região Sul do país. Essa deficiência hídrica, segundo ele, deve seguir pelos próximos meses, agravando-se no verão, estação tradicionalmente mais seca.
— Neste momento, o nível dos rios gaúchos está dentro da média ou ligeiramente baixos, mas a condição é de observação e, a longo prazo, pode ter escassez — ressalta.