Após acordo entre líderes partidários, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmou que não pretende colocar a Medida Provisória (MP) que flexibiliza o Código Florestal em votação na Casa.
— Cumprindo o acordo com vários líderes políticos e do papel institucional de presidente do Senado Federal, eu informo aos senadores e senadoras que não convocarei amanhã (quinta-feira, 30) sessão deliberativa para apreciarmos essa Medida Provisória. Agradeço o apoio de vários senadores no sentido da construção de um acordo e um entendimento — disse Alcolumbre.
— Independente da votação na Câmara se encerrar no dia de hoje, este presidente cumprirá o acordo construído com vários líderes partidários.
Articulação da bancada ruralista
O texto-base foi aprovado nesta quarta-feira (29) por 243 votos favoráveis e 19 contrários, em articulação capitaneada pela bancada ruralista.
Ainda estão sendo debatidos os destaques, que podem retirar do texto os jabutis (jargão para artigos estranhos ao tema original do texto) que beneficiam proprietários que desmataram áreas de reserva legal.
No entanto, como a bancada ruralista tem grande força no Congresso, há possibilidade de as alterações serem mantidas.
Entre elas, está uma mudança no artigo 68 do código, considerada por ambientalistas a mais importante, que altera a referência temporal de proporção de restauração de área desmatada de determinados biomas.
É uma anistia sem cabimento nenhum, as próprias indústrias agroexportadoras são contrárias ao texto. Isso vai ter consequências internacionais.
RODRIGO AGOSTINHO
Deputado federal pelo PSB de SP e presidente da Comissão de Meio Ambiente na Câmara
Assim, proprietários que tiverem desmatado mais do que os valores de reserva legal até os anos respectivos da nova redação da lei serão isentos de adequação.
Pelo código ambiental de 2012, vigente hoje, estavam desobrigados de promover a recomposição da mata os proprietários que tivessem desmatado antes de haver leis regulamentando percentuais de preservação.
Em 1965, uma lei que estabeleceu percentuais de 50% de preservação da Amazônia e 20% para as demais vegetações do país. Os ruralistas ampliam esse prazo tomando como base os anos em que determinados biomas passaram a ser explicitamente preservados na lei.
No caso do cerrado, por exemplo, o início da proteção será considerado como 1989. Já no caso do Pampa e do Pantanal, em 2000. Segundo os ambientalistas, porém, estas áreas já estavam preservadas pela legislação dos anos 1960, embora o texto trouxesse referência às regiões do país (como sul, leste meridional etc) e não ao tipo de vegetação característica.
Hoje, o valor que deve ser preservado nas propriedades é de 80% na Amazônia, 35% no cerrado amazônico, 20% em outros biomas, como Pampa, cerrado, Pantanal e Mata Atlântica.
O que estão querendo é fazer o cidadão, que fez manejo da terra dele, coberto por uma lei de 1965, e ele tem de recompor pela lei de 2000. Ninguém terá condições de fazer isso
ALCEU MOREIRA
Deputado federal pelo MDB do RS e presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária
Segundo ambientalistas do Observatório do Código Florestal, a aprovação da medida provisória pode significar a perda de 5 milhões de hectares de vegetação nativa, um total que representa duas vezes a área do estado de Sergipe.
— Você que desmatou o cerrado até 1989 está liberado, que desmatou o Pantanal até 2000, está liberado. É uma anistia sem cabimento nenhum, as próprias indústrias agroexportadoras são contrárias ao texto. Isso vai ter consequências internacionais — disse o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), presidente da Comissão de Meio Ambiente da Casa. — Uma das consequências imediatas é que alguns países podem suspender a compra de produtos agrícolas brasileiras.
Já os defensores da medida dizem que as alterações na medida provisória trazem segurança jurídica para produtores.
— Ninguém preserva tanto quanto o Brasil e o produtor brasileiro — afirmou o deputado Celso Maldaner (MDB-SC).
O argumento é que a área já tem desmatamento consolidado.
— O que estão querendo é fazer o cidadão, que fez manejo da terra dele, coberto por uma lei de 1965, e ele tem de recompor pela lei de 2000. Ninguém terá condições de fazer isso — afirmou o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Alceu Moreira (MDB-RS).
Proposta com prazo de adesão sem data
definida preocupa grupo de ambientalistas
O texto original da medida, editada por Michel Temer, prorrogava o prazo de adesão de produtores ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), um programa de ações de recuperação ambiental obrigatório instituído no Código Florestal, até dezembro de 2019, com possibilidade de extensão até 2020.
No texto do relator, Sérgio Souza (MDB-PR), o prazo de adesão é prorrogado indefinidamente, e estabelece que o proprietário deve aderir ao PRA apenas se este for notificado pelo órgão responsável.
Segundo uma carta endereçada aos deputados escrita pelo grupo Ciência e Sociedade, composto por mais de 50 cientistas, a mudança no prazo também preocupa os ambientalistas.
"Alterar a forma de conduzir o PRA é ignorar todo o esforço e recursos que foram empreendidos nos Estados na elaboração das normas de regularização ambiental, podendo levar à paralisação das regulamentações em curso nos estados com normativas já estabelecidas. Além disso, resulta em insegurança jurídica em um processo que exige colaboração e confiança junto ao setor produtivo", diz o texto.
Deputados da oposição tentaram aprovar requerimento para que o texto original da MP editada por Temer fosse votado, mas perderam.