Sem consenso na polêmica envolvendo os prejuízos causados pela deriva do agroquímico 2,4-D em culturas como uvas e oliveiras, o Ministério Público Estadual (MP) irá agora se aprofundar no inquérito civil — ouvindo especialistas técnicos e outros setores afetados. Além disso, o órgão irá ampliar a investigação para outros herbicidas hormonais.
— Se é um problema comum a outros químicos, temos de ampliar o objeto de análise, a fim de evitar novos problemas futuros — adiantou Anelise Grehs, coordenadora do Núcleo de Resoluções de Conflitos Ambientais do MP.
Desde o último 8 de janeiro, o caso passou a ser investigado também pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente de Porto Alegre, por se tratar de um problema de âmbito estadual. Sem adiantar prazo para conclusão do inquérito, Anelise afirmou que entre os encaminhamentos possíveis estão ajuizamento de ação civil pública de suspensão do produto, a ser aceita pela Justiça, ou tentativa de nova conciliação, por meio de acordo formal.
— Nossa atuação, agora conjunta com a Promotoria de Meio Ambiente, irá se fundar em provas técnicas e em aspectos jurídicos.
Na última quinta-feira (17), Anelise acompanhou as mais de três horas de reunião entre produtores de soja e de culturas que tiveram prejuízos causados pelo 2,4-D — comprovados em 69 laudos feito pela Secretaria Estadual da Agricultura (veja ao lado). O encontro, realizado na sede da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), em Porto Alegre, terminou sem conciliação.
— Reconhecemos que o problema de deriva existe e somos parceiros para desenvolver ações de aplicação correta. O que não podemos aceitar é a suspensão ou proibição de um produto absolutamente seguro, permitido em todo o Brasil e diversos países — disse Gedeão Pereira, presidente da Farsul.
O ponto de divergência é justamente em relação a uma possível proibição do produto, apontada por vitivinicultores como a única solução efetiva.
— Não é uma questão de radicalização, mas de sobrevivência. Todas as outras ações, como conscientização e treinamento, já foram feitas e não surtiram efeito — reclama o produtor Valter Pötter, proprietário da Guatambu Estância do Vinho, de Dom Pedrito.
Presidente Associação Gaúcha de Produtores de Maçã (Agapomi), José Sozo compartilha da mesma opinião. Embora os pomares na região dos Campos de Cima da Serra tenham sido menos afetados do que na Campanha, o dirigente teme que o problema ganhe proporções maiores nos próximos anos.
— E não estamos falando apenas da fruticultura, mas nos milhares de empregos que essas atividades geram — resume o dirigente.
Entenda o caso
- Em 2015, o Ministério Público Estadual abriu inquérito para investigar a suposta deriva do herbicida 2,4-D em parreiras da região da Campanha.
- Nos anos seguintes, produtores de uvas e oliveiras passaram a identificar prejuízos em suas produções. Na safra atual, a estimativa é de perda de 40% nos parreirais da região da Campanha.
- Em janeiro, a Secretaria Estadual da Agricultura concluiu relatório com 69 laudos positivos para a presença do produto em 79 coletas realizadas em 58 propriedades em 23 municípios.
- Uma das amostras positivas foi na zona urbana de Santana do Livramento, em frente a um hospital.
- No último dia 8, o MP recebeu o relatório da Secretaria da Agricultura e incluiu a Promotoria de Justiça do Meio Ambiente de Porto Alegre na investigação, por se tratar de um problema de âmbito estadual
- Na última quinta-feira, produtores de soja e de culturas prejudicadas pela deriva do produto reuniram-se na Farsul, em Porto Alegre. A reunião terminou sem consenso.