Após três horas e meia, a reunião entre produtores de soja e de culturas afetadas pelo uso do herbicida 2,4-D acabou sem acordo nesta quinta-feira (17). Agricultores que atuam no ramo de uva, oliveiras e maçãs reclamam de perdas causadas pela deriva (produto que não atinge o alvo) do produto químico, que é utilizado por sojicultores antes da época de plantio para eliminar a erva-daninha conhecida como buva. A tentativa de mediação ocorreu na Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), em Porto Alegre.
O presidente da entidade, Gedeão Pereira, não quis cravar que o diálogo entre as partes acabou, mas disse acreditar que a busca pela conciliação é "difícil". Na opinião dele, os representantes do cultivo de uva e da produção de vinho estão agindo de maneira "radical". Eles defendem a proibição do uso do 2,4-D como único caminho para resolver o impasse. Gedeão reconhece os prejuízos causados pela "má aplicação do herbicida", mas defendeu a regulamentação para pulverização terrestre como principal alternativa:
— O grande problema que nós temos é o de deriva. Ou seja, má aplicação do produto. Pela regulamentação, criaríamos normas, onde produtor teria de cuidar muito bem de temperatura, velocidade de vento, umidade relativa. Uma série de efeito pelos quais ele ficaria responsável para fazer as aplicações.
Gedeão salienta que o fim do uso do herbicida transformaria um prejuízo milionário em outro bilionário.
— Nós não temos um substituto à altura para a cultura da soja.
Presidente da Associação dos Produtores de Soja do Estado (Aprosoja-RS), Luis Fernando Fucks também reconhece que o problema da deriva existe, mas que a solução passa necessariamente pela profissionalização do produtor.
— O problema está na aplicação, e não no produto. A questão é que está havendo uma intransigência em relação ao impasse — afirma.
Em relação a criação de um regramento para a pulverização terrestre, semelhante à adotada na aviação agrícola, com penalizarão para quem não cumprir as normas, o dirigente acredita que também possa ser uma alternativa, caso o treinamento dos produtores não resulte efeito.
— Ninguém gosta de fiscal dentro da propriedade. Mas se esse for o único jeito, teremos de aceitar.
Laudos da Secretaria da Agricultura confirmaram a presença do resíduo do produto em vinhedos e pomares de oliveiras e de maçã no Estado.
Helio Marchioro, conselheiro do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), defende a suspensão do uso do agrotóxico até que haja um consenso para evitar mais perdas. Ele entende que a regulamentação poderia amenizar os danos, mas que apenas a proibição seria a solução para o fim dos prejuízos.
— Como foi tirado o consenso, a posição vai ser de defesa do grupo que está morrendo.
O produtor Valter Pötter, proprietário da Estância Guatambu, não vê outra alternativa para o fim dos prejuízos que não seja o fim do uso do 2,4-D nas lavouras. No entendimento de Pötter, a regulamentação não acabaria com o impacto do produto nas outras culturas:
— Esse regramento ou legislação mais técnica sobre aplicações terrestres não vai resolver. Existe regramento para aplicação aérea e muitas vezes é infringido. Como é que vão fiscalizar esses confins do Rio Grande do Sul. O Estado não tem recurso para fiscalizar uma rodovia.
Pötter também defende o reparo dos prejuízos causados aos produtores e a não liberação de herbicidas hormonais no futuro, que têm o mesmo efeito do 2,4-D em folhas largas.
Com a falta de acordo entre os produtores, caberá ao Ministério Público (MP) analisar quais serão as medidas adotadas em relação ao caso. A judicialização não é descartada, mas não seria o único caminho possível para resolução do embate nesse momento, segundo a promotora Anelise Grehs, coordenadora do Núcleo de Resolução de Conflitos Ambientais.