Nova Bassano hoje tem mais vacas do que habitantes. Maior produtora de leite na Serra, com 57 milhões de litros gerados por ano, o município de 8,8 mil pessoas conta com 10,5 mil cabeças de gado leiteiro.
A produção ganhou musculatura nos últimos anos e ocasionou profunda mudança no perfil econômico do local. Diversas famílias de agricultores trocaram os hortifrutigranjeiros pelo leite. E parte agregou valor ao produto gerado pelos rebanhos.
É o caso da produtora Rejane Tessaro. Seu avô começou na atividade rural com o plantio de frutas e verduras, como repolho, pimentão e tomate. A criação de vacas leiteiras era uma atividade secundária. Oito anos atrás, o perfil de produção se transformou.
Resultado turbinado
O baixo preço das frutas e verduras e o desgaste na saúde da família em razão do uso de agrotóxicos no plantio fizeram com que os Tessaro optassem apenas pelo leite. A partir daquela época, o plantel cresceu. Passou de 30 para 50 vacas em lactação, sendo 40 da raça holandesa e 10 da jersey.
A maior mudança, entretanto, ocorreu em 2011, quando Rejane liderou a implantação de uma queijaria. Desde então, o foco é a fabricação de queijos. A produtora toca o negócio ao lado do marido e seus pais, além de dois funcionários. O novo produto garantiu incremento significativo na renda familiar.
– Meu sonho sempre foi ter algo próprio. E queríamos agregar valor à matéria-prima que produzíamos. Arriscamos com a queijaria e deu certo. Nossa renda anual é 30% maior do que se só vendêssemos leite – explica Rejane.
Os 1,2 mil litros captados diariamente são transformados em cerca de três toneladas de queijo colonial a cada mês. A venda ocorre principalmente em pontos localizados em Nova Bassano e na vizinha Serafina Corrêa. A estrutura ainda tem condições de produzir manteiga e iogurte.
Instabilidade no mercado
A maré não anda favorável para os produtores leite. No Rio Grande do Sul, mais de 20 mil pessoas deixaram a atividade nos últimos dois anos, conforme a Emater. Um dos principais motivos é o baixo preço do alimento. No Estado, o valor líquido do litro pago ao produtor em outubro foi de R$ 0,95, conforme o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Universidade de São Paulo (USP). Em agosto do ano passado, a remuneração chegou a R$ 1,64 por litro.
– Se não mudar a situação, parte da produção vai morrer mesmo. É a pior crise desde que começamos a investir no leite. Em cada litro vendido hoje, temos prejuízo de R$ 0,20 – lamenta o produtor Itamar Tang, de Farroupilha.
Impacto das importações
A concorrência com o leite do Uruguai agrava a situação. O alimento do país vizinho vem principalmente em forma de queijo e leite em pó e chega com preço mais competitivo no mercado nacional. Em razão da crise, o Ministério da Agricultura suspendeu, na primeira quinzena de outubro, a emissão de licenças de importação dos derivados do produto do Uruguai para avaliar se não estava ocorrendo triangulação – quando um país compra de terceiros e comercializa utilizando benefícios fiscais, no caso, por integrar o Mercosul. A medida foi suspensa na última segunda-feira.
Os produtores se mobilizam para pedir ao governo federal o controle da compra no Exterior por meio de cotas. Darlan Palharini, secretário-executivo do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Rio Grande do Sul (Sindilat), lembra que a adoção de cotas já ocorre sobre o leite da Argentina e defende a limitação de 3 mil toneladas ao mês também para os uruguaios.
– Neste ano, o Uruguai colocou em torno de 6 mil toneladas por mês de queijo e leite em pó no mercado brasileiro. No ano passado, foram 10 mil toneladas por mês. Esse volume prejudica o crescimento da bacia leiteira do Rio Grande do Sul e do Brasil – alerta o dirigente, ressaltando que a redução das importações foi insuficiente para amenizar os impactos.