Se para nós adultos não está sendo fácil a adaptação neste novo cenário de distanciamento social exigido pela pandemia do coronavírus, imagina para as crianças. Uma recente pesquisa realizada pela ONG SOS Aldeas Infantiles, na Espanha, mostrou que essas mudanças impactaram diretamente crianças e adolescentes, que passam mais tempo em casa, sem escola, e muitas vezes estão também distantes dos familiares e amigos.
De acordo com o material divulgado, 74% das crianças temem a doença, 66% sentem a distância dos familiares e 53% receiam que a vida volte a não ser a mesma.
Conversamos com a psicóloga Flávia Barfknecht que nos deu algumas dicas para as mamães que poderão contribuir para a saúde mental da família e proporcionando momentos de diálogo sobre anseios e medos.
- Antes de tudo, é necessário que os pais mantenham a calma durante este período (por mais difícil que seja) para passar segurança as crianças. Procure conversar sobre este momento em que estamos vivendo, mas não os sobrecarregue de informações. Deixe claro que não estamos em férias, mas em um momento especial, que irá passar e ela poderá rever amigos, a escola e os esportes.
- Separe um tempo para a dedicação integral para a criança. Desligue os aparelhos eletrônicos e o trabalho e, neste período escolhido (não há tempo definido) esteja inteiro, com os pensamentos voltados a eles.
- Observe seu filho, aproveite esse período para conhecê-lo. As crianças expressam seu mal estar através da birra, da agressividade, da recusa em comer e do retorno às fases iniciais do seu desenvolvimento.
- O homeschooling é desgastante para todos, nas diferentes faixas etárias e requer organização familiar. Não se cobre tanto, procure entender o funcionamento da criança ao estudar e, se for auxiliar, esteja disponível. Uma dica é determinar horários para os estudos.
- Mantenha uma rotina mais próxima possível da realidade de antes da pandemia. Essa prática auxilia a criança a não se desorganizar emocionalmente.
- Chame seu filho para ser parceiro nas atividades da casa. Cada faixa etária pode contribuir, conforme suas habilidades.
- Leia um livro para a criança e aproveite o momento de ir para a cama para ficarem juntos. Isso pode auxiliar a criança a elaborar os sentimentos de medo, frustração e ansiedade diante desse momento.
- Não é o hora de cobrarmos de nossas crianças e adolescentes que saiam especialistas em algo, mas, sim, que possam aprender e/ou desenvolver habilidades emocionais que serão fundamentais para sua vida daqui para frente.
- Entenda que 90% dos pais estão com as mesmas dúvidas, medos e angústias. Aproveite para dividi-las! Não é um momento em que as coisas estejam fáceis! Todos estamos aprendendo a lidar com todo esse movimento.
- Peça ajuda especializada se a intensidade destes sentimentos e emoções esteja trazendo prejuízos e um sofrimento não administráveis. Psicólogos, psiquiatras e uma rede de apoio estão preparados para auxiliar as famílias e todos que estão sendo impactados por esse momento.
- Pense em como você e sua família querem sair desse momento de pandemia (emocionalmente falando). Mais unidos, fortalecidos e preparados para a nova realidade?
- Ame, converse, expresse seu afeto, esteja junto, expresse segurança. Assim teremos um ambiente mais tranquilo e estaremos atuando diretamente no sofrimento emocional da criança e a auxiliando a diminuir os impactos deste período.
Relato de algumas famílias
“Meu filho Theo anda com medo das pessoas. Como convive apenas comigo e meu marido, outro dia, no caminho até o supermercado, ficou com muito medo das pessoas que se aproximaram. Se ele vê alguém perto da gente já fala “mamãe, estou com medo da pessoa” Lydia Goess, mãe do Theo de quatro anos
“Minha filha não aguenta mais não ver os amigos e quer muito retornar para a escola. Uma tia testou positivo e se recuperou, então ela está mais tranquila e não está com tanto medo.” Chaiane de Vargas Cardoso, mãe da Lavínia, de seis anos
“Minha filha de 10 anos chora de medo de ter que voltar à escola e dos avós adoecerem e morrerem.” Flavia Faller, mãe da Milena, de 10 anos, e do Davi, de dois anos
“Meu filho se adaptou bem às aulas online. Também aumentou muito o uso dos eletrônicos, mas, por agora, tudo bem. Só não quer sair de casa, de jeito nenhum. Ir num drive-thru é uma briga. E entra em pânico se alguém fala em voltar para a escola. Está curtindo ficar em casa e usa máscara direto e álcool nas mãos o tempo todo.” Cátia Guidani, mãe do Guilherme, 10 anos
“Minhas filhas têm muito medo de pegar a doença e dos avós adoecerem. Mas o lado positivo disso tudo é que noto que elas estão muito mais apegadas, querendo sempre brincar, tomar banho e dormir juntas.” Betina Porto Bratkowski, mãe da Joana, de seis anos e da Gabriela, dois anos
“A minha filha não tem vontade de fazer nada. Tem medo até de sair para dar uma volta de carro.” Aline Ruschel, mãe da Júlia, seis anos
“Meu filho acordou um dia e perguntou o que aconteceria se tivesse lockdown e acabasse toda a comida.” Cristine Spiering Hartwig, mãe do Bernardo, oito anos
“Todas as noites a Malu reza e pede para o coronavírus ir embora.” Maíra Gatto, mãe da Mallu, cinco anos
“Tenho um menino de três anos e uma menina de sete anos. Explico sempre para eles tudo. O menor não entende muito, mas o de sete anos está mais tranquilo. Não deixo eles verem muita televisão, apenas o que falo são as informações que têm. Não sei se estou fazendo certo, mas assim conseguimos passar por tudo isso com mais calma no coração.” Patrícia Carneiro, mãe do Martim de três anos e da Pietra, de sete anos
“Está muito complicado. No início da quarentena, minha filha não queria nem ir no pátio de casa. Agora estamos dando voltas pelo bairro que é tranquilo. Mas ela tem crises de choro. Não sei o que passa na cabecinha dela. Essa semana tivemos caso de covid na família. Nós estamos mantendo distanciamento de todos desde março, mas quando ela soube ficou bem nervosa.” Renata, mae da Ana Luísa de oito anos
Vanessa Martini é mãe do Theo e jornalista. Tem um blog, o Mãezinha Vai Com As Outras, onde divida a rotina e os aprendizados da maternidade. Escreve semanalmente sobre o assunto em revistadonna.com.