Até março, fim de semana era sinônimo de trabalho para Natalia Avila Teixeira, 35 anos. Sócia de uma empresa de decoração de festas infantis e mãe solo, ela emendava um evento atrás do outro, sem descanso, enquanto a filha, Rosana, de três anos, ficava sob os cuidados de sua família. De segunda a sexta, a rotina não era diferente: compra de material, organização da agenda, reuniões e por aí vai. Mas a pandemia de coronavírus chegou e instaurou um novo momento na vida de Nat e Rô. As festas canceladas e o trabalho paralisado oportunizaram almoços de domingo tranquilos em família, sem pressa. Se no início do distanciamento social a empresária diz que quase surtou pensando
no lado financeiro, hoje admite que encara o confinamento por outro ângulo.
– Estou em um momento de ressignificar tudo, a vida corrida, aquela loucura. Financeiramente, estou quebrada. Se era de falta tempo que eu reclamava antes, agora vou usar para fazer algo de útil. Ficava longe da minha filha nos fins de semana, sentia falta, tenho a lembrança dos almoços de domingo em família e é tão bom. Hoje, vejo que foi uma parada obrigatória, tento ficar positiva – conta Nat, que é conhecida nas redes sociais como Nat Welter do perfil @surtadanamaternidade.
Assim como ela, outras mulheres se desafiaram a olhar a maternidade por uma nova perspectiva neste período de distanciamento social. E são essas histórias que a Revista Donna escolheu para presentear você neste Dia das Mães. Administrar home office, teleaulas das crianças, limpeza da casa, incerteza sobre o futuro e mais mil e uma tarefas é fácil? Claro que não. Mas as 24 horas em casa junto das crianças podem ser um momento de conexão importante, avalia Adriana Zilberman, psicóloga e diretora do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo (Cefi):
– A crise sempre oportuniza que a gente repense e reflita sobre nosso lugar e sobre nosso papel, valores e prioridades. Podemos redescobrir algumas coisas importantes dessa relação de mãe e filho, da brincadeira, do que nunca se tinha tempo. Tem que ser algo prazeroso, não pode se tornar um peso. Também é preciso cuidar a cobrança sobre a maternidade neste momento difícil por que estamos passando, de tentar ser uma super-mãe.
O confinamento também pode ser uma oportunidade para as próprias crianças conhecerem um lado das mães a que elas não tinham acesso, geralmente por falta de tempo. É hora de puxar da memória o que sempre se teve vontade de fazer e nunca foi possível devido à rotina, indica Ieda Zamel Dorfman, psicoterapeuta vice-presidente da Associação Gaúcha de Terapia Familiar (Agatef):
– Podemos focar no que gostávamos, mas tínhamos deixado de lado, como dançar em casa, fazer bolo junto. Separar um tempo para se divertir mesmo ao lado deles, se conectar com os filhos com criatividade e brincando. Eles podem descobrir uma outra mãe, mais alegre, dançarina, que pinta, que faz um doce, que ri.
As primeiras vezes
Nat e Rô têm desenhado juntas, feito sessões de cinema e observado as estrelas com binóculos. A convivência intensa também oportunizou outro passo importante: tirar as fraldas de Rô. Foi a ocasião perfeita para realizar o processo sozinha com a filha, conta:
– Sem a correria, acho que está muito mais fácil o desfralde. Estamos fazendo com calma, até para mim, para exercitar a paciência, não é uma coisa fácil. Estou me dedicando e, quando tem algum acidente, rimos juntas. Está sendo leve.
Outra mãe que está vendo de perto as primeiras descobertas do filho é Melissa Danda, 37. Antes da pandemia, Daniel, de um ano e três meses, ficava na escola no turno da tarde – pela manhã, ela e o marido, Eduardo, se revezavam para cuidar do menino. Ambos são professores e agora estão em home office, dividindo-se entre o trabalho e o tempo integral com Daniel. Melissa conta que, apesar da desorganização familiar no início do distanciamento social, ficar ainda mais perto do filho se tornou uma oportunidade para incentivá-lo a dar os primeiros passos sozinho. E ele conseguiu: agora, já caminha por tudo, explica:
– Que coisa bem boa conseguir acompanhar mais ele, cheirar mais e beijar mais. Ele estava em adaptação na escola antes da pandemia e já ensaiando os primeiros passos. Queria se soltar, mas não ia. Daí, em casa, estimulamos e foi determinante: pegou confiança. Sinto que foi muito importante a gente estar junto.
A professora também destaca outro fruto do confinamento: o abraço. Daniel não sabia abraçar, não tinha essa iniciativa. O tempo em casa fez com que ele começasse a reparar ainda mais na relação dos pais e, por isso, passou a imitar o casal e a distribuir abraços carinhosos na família.
– Tenho certeza de que é pelo convívio. Noto que ele tem olhado mais a maneira que eu e meu marido nos tratamos, com carinho, e está querendo fazer igual. É a coisa mais querida, e isso é consequência desse período, da relação que estamos desenvolvendo nessa convivência.
Arte e receitas
No caso de Marina Mottin, 43, a pandemia trouxe os filhos novamente para dentro de casa. Ela e o marido, Marcelo, já trabalhavam boa parte do tempo em home office e agora a novidade é ter que dividir o espaço com Maria Luiza, 10, e Miguel, sete, em tempo integral. Com a nova rotina, a professora e especialista em desenvolvimento comportamental reparou em habilidades dos filhos que nunca tinha notado antes e também aproveitou a chance para desenvolver gostos em comum.
– Nunca estive tão perto deles em todas as coisas que fazem. Percebi que minha filha tem afinidades com arte, gosta de fazer, é um talento dela. Também vimos Star Wars juntos, assistimos todos os filmes, foi nosso momento em família – diz Marina.
Como Miguel está aprendendo espanhol, ela sugeriu um desafio: os cumprimentos precisavam ser feitos na língua estrangeira para treinarem juntos – e também se divertirem. A preparação dos alimentos também inspirou as crianças a colocarem a mão na massa na cozinha. Com o incentivo e a supervisão da mãe, Maria Luiza se arriscou a criar uma receita de torta de bolacha.
E são esses pequenos momentos que ajudam a desenvolver uma conexão que ficará ainda mais fortalecida quando tudo isso passar, aposta Marina:
– Acho que nunca nos ouvimos tanto, nunca percebemos tanto o outro. Estamos falando mais, conversamos mais, nos ajudamos mais. Não quero perder isso nunca.