Um ano depois de vivenciar, pela primeira vez na história da TV brasileira, a pausa nas gravações de uma novela do horário nobre, Adriana Esteves comemora o fechamento de um ciclo. A partir desta segunda-feira (15), a Globo retoma a exibição dos novos capítulos de Amor de Mãe – um aguardado desfecho para a trama, que ficou paralisada desde março do ano passado. Ainda que a emissora tenha voltado a puxar o freio nos estúdios em razão do recrudescimento da pandemia no país, a atriz celebra a chance de mostrar ao público o final de sua personagem, a mãe superprotetora (e inconsequente) Thelma.
Na vida real, o ano de confinamento serviu para a artista reforçar vínculos. Na entrevista que você confere a seguir, Adriana conta que os últimos meses foram de harmonia com os guris de sua casa, os filhos Felipe, 21 anos, e Vicente, 14, além do marido, o também ator Vladimir Brichta. Completa a família a enteada Agnes, 24, de quem a atriz fala com orgulho.
Aos 51 anos, Adriana celebra um reencontro com si mesma. A idade, para ela, passa longe de ser um peso: seu trunfo é o equilíbrio conquistado, tanto na vida pessoal quanto na carreira de três décadas. Na pandemia, os telespectadores puderam se reencontrar com a amada vilã Carminha, que desfilava suas caras e bocas em Avenida Brasil, e com os ataques “do coração” de Celinha, de Toma Lá, Dá Cá, que voltou à grade aos sábados. No nosso papo, Adriana abre o jogo sobre a chegada aos 50, seus novos projetos e recorda momentos marcantes de sua trajetória.
Em Amor de Mãe, sua personagem começa como uma mãe superprotetora, mas depois ganha um ar controverso.
Recebi a personagem acreditando que falaria de amor, um amor desmedido ao filho único. Isso me encheu de inspiração. O amor materno talvez seja o sentimento de que mais gosto de falar. Com o passar da trama, Thelma foi se revelando muito insegura em relação à vida como um todo, o que foi trazendo consequências duras a ela.
Como foi encarar as gravações durante a pandemia? Primeiro, a pausa. Depois, os dias no set de uma forma totalmente atípica.
Passamos por um momento histórico na televisão brasileira, assim como no mundo todo. Paralisar as gravações no meio de uma novela foi algo que nunca havia acontecido. Foi uma medida necessária, emergencial e feita no momento certo. Ficamos seis meses em isolamento até que os protocolos para a volta das gravações fossem criados e colocados em prática. No início, fiquei muito apreensiva. Mas a vontade, o entusiasmo para voltar a gravar e finalizar a obra foram enormes. Passamos por momentos de muita união de toda a equipe, talvez uma das coisas mais bonitas que já vivenciei em minha trajetória profissional. Senti o real valor da solidariedade. E isso nos encheu de emoção para os capítulos finais da trama.
A personagem Thelma tem uma carga emocional forte: a questão de poder morrer a qualquer momento, de deixar o filho... Como é, para você, enquanto mãe também, lidar com isso e se “distanciar” quando sai do set?
Talvez essa seja uma das maiores dores de uma mãe: enxergar sua vida finita e deixar um filho. Digo talvez porque existe outra maior, pra mim, do que essa, que é perder um filho. Esses pensamentos estiveram em mim durante toda a criação. Mas a necessidade do distanciamento é grande em situações como essas. É preciso ter bastante maturidade (risos).
Você tem recebido relatos de telespectadoras neste sentido?
Várias mães mencionam a dor, quando pensam na hipótese de um dia faltar, mas, ao mesmo tempo, é também um assunto velado. A morte em si é um assunto velado. Sabemos que vai ocorrer, mas acho que preferimos não pensar nela.
Você esteve no ar durante o confinamento com personagens completamente diferentes: a Carminha, de Avenida Brasil, a Thelma e também a Catarina, de O Cravo e a Rosa, sucesso na Globoplay. Como foi se rever nesses papéis?
Sou bem apaixonada por minhas “filhas” (risos). Três personagens muito diferentes, vividas em fases diferentes da minha vida. As três me enchem de orgulho e me fizeram crescer muito com elas.
A Carminha, aliás, é uma das vilãs preferidas do público e segue conquistando fãs no streaming.
Carminha foi a personagem mais avassaladora de minha vida. Com ela, pude colocar em prática muito que sempre pensei na atuação. Exercitar o verdadeiro, o espontâneo, dar asas à criatividade, crer que tudo é possível. Infinitas possibilidades. João Emanuel Carneiro me deu esse enorme presente.
Outro trabalho seu que repercutiu muito foi a série Assédio, de 2018. Como foi abordar a questão da violência contra a mulher na TV?
Assédio denuncia a brutalidade existente em certos indivíduos da sociedade. Essa história verídica me monopolizou muito ao passo que fui sabendo detalhes da luta de tantas mulheres vítimas daquele monstro (a produção baseada no caso do médico Roger Abdelmassih, que abusou de pacientes). Minha personagem teve a responsabilidade de apresentar essas dores gravíssimas vividas. Uma série feita basicamente por mulheres. Contou com a excelente concepção e direção de Amora Mautner, além de um elenco de excelentes atrizes.
Personagens femininas que fogem da mocinha clássica ganham cada vez mais força. Como você vê essa mudança?
Vejo a mulher crescendo dentro e fora da tela. Muitas deixaram de ser invisíveis. A dramaturgia está dando voz a tantas de nós. Momento necessário e rico.
A dramaturgia está representando bem essa mulher pós-50, com suas questões e inquietações?
Acho que esse espaço para a apresentação de mulheres mais maduras, suas dores, suas belezas, suas histórias, está a cada dia sendo mais revelado, e vai seguindo o empoderamento feminino.
Você completou recentemente 51 anos. Temos falado cada vez mais do conceito ageless, que exalta mulheres que mantêm seu estilo de vida independentemente da idade. Você se identifica?
Todas nós, mulheres, vítimas de um machismo histórico, ao longo dos anos sofremos muitos tipos de preconceito e dentre eles os rótulos no que dizem respeito às idades. Como se só nos fosse autorizado para cada faixa etária um determinado tipo de comportamento. Gosto muito de ver a libertação desses padrões. A mulher pode e deve viver de acordo com seus anseios, independentemente de uma idade cronológica.
O que os 50 trouxeram de positivo?
Hoje estou como imaginava que estaria. Com meus filhos, minha profissão, mais equilíbrio em relação à vida, casada com um parceiro que é um grande companheiro.
A publicidade está começando a atentar para representar melhor as mulheres de várias faixas etárias. Como você vê essa mudança?
Ainda temos um caminho pela frente, mas sem dúvida diminuiu a idolatria somente por mulheres jovens. Grandes mulheres estão mostrando suas vidas e histórias e abrindo foco para a admiração e o respeito à maturidade.
Você já disse que vivencia a maternidade plenamente também com a Agnes, sua enteada, além de seus dois filhos. Para você, como é o papel de “mãedrasta”?
Agnes foi um presente que veio para mim muito cedo. A conheci quando ela tinha apenas quatro anos. Ser mãe dela foi aprender a amar uma pessoa diferente que já vinha com sua pequena grande história. Ela me ensina muito na maternidade. Ela é um elo de enorme harmonia com os irmãos.
Em tempos de relações efêmeras, como é estar num relacionamento longevo, como o seu e de Vladimir?
Eu e Vladi tivemos um lindo encontro. Ele é realmente o meu amor. Nesses 17 anos que estamos juntos, construímos e crescemos muito juntos. Temos muitas semelhanças. Nosso olhar para a vida dá esperança para construir muito mais. E somos namorados. Ele é o homem que sempre sonhei. Um homem que admiro muito e ama ser meu namorado. Eu não saberia viver sem esse romance. Mantemos mesmo nosso romance, por puro prazer.
Como você está encarando o período de pandemia?
Está sendo difícil para o mundo inteiro. Em nosso país, por vários motivos evidentes de desgoverno, isso se agrava. Minha preocupação com o coletivo é enorme. As diferenças sociais escancaradas. Dentro de casa, procuramos nos preparar desde o início para tantas mudanças e privações. Ter conscientização e responsabilidade com o outro. É doído ver o isolamento de meus pais, meus filhos adolescentes sem aula, sem o convívio com amigos... Mas estamos conseguindo uma grande harmonia familiar. Conseguindo ajudar financeira e psicologicamente quem precisa à nossa volta. É uma luta diária para tomar atitudes e medidas saudáveis.
O que você espera da retomada do audiovisual?
O pós-pandemia será muito rico para a cultura. Há vários projetos que precisam ser viabilizados. Mas precisamos do apoio e incentivo.
Quais seu projetos para o ano?
Neste início de ano, estou dedicada à reestreia de Amor de Mãe. Estou muito feliz por termos conseguido finalizá-la. Torcendo também para que haja o lançamento de dois filmes de que participei: Marighella, de Wagner Moura, e Medida Provisória, de Lázaro Ramos. Na verdade, estou torcendo muito pela vacina, para que em breve possamos estar fazendo vários filmes, teatros, séries e novelas.