– Eu não quero.
– O quê?
– Não quero.
– Você bebeu tanto, não tem a menor condição de saber o quer.
– Eu não quero.
– Relaxa, tá tudo bem, confia em mim.
– Não quero.
– Para com isso, eu conheço bem o seu tipinho, provoca, provoca, e depois quer pular fora.
– Não tô me sentindo bem.
– Claro que não. Bebeu mais do que um gambá.
– Me larga.
– Deixa de ser arisca.
– Me larga.
– Se você não parar de me empurrar, eu vou segurar mais forte, e depois você vai contar para as suas amigas que eu fui bruto com você e mimimi e mimimi.
– Me larga, por favor.
– Logo, logo, você vai pedir por favor para eu não largar, não tem mulher que não goze comigo.
– Me deixa sair.
– Já vai, deixa eu acabar aqui e a gente já sobe.
– Para.
– Quietinha, quietinha, não enche meu saco.
– Eu não quero.
– Dá para calar a boca um segundo? Para de atrapalhar, porra.
– Eu quero ir embora.
– Depois você vai.
– (Silêncio).
– Quieta. Isso. Quieta.
– (Silêncio).
– Você me deu um suador.
– (Silêncio).
– Viu como foi bom? Eu falei que você ia gostar.
– (Silêncio).
– Que foi, engoliu a língua? Não vai dormir, sua bêbada.
– (Silêncio).
– Levanta, arruma essa roupa, arruma essa cara, é noite de sertanejo, bebê.
– Eu tô machucada.
– Sabia que você ia inventar essa, comigo não cola, eu não fiz nada diferente do que você faz toda noite.
– Eu nunca tinha feito isso.
– Conta outra, tá me achando com pinta de otário?
– Eu nunca tinha feito isso.
– Por que não falou antes? Como é que eu ia saber?
– Eu não queria.
– Como é que eu ia saber?
– Eu não queria.
– Devia ter falado direito, ficou aí, enrolando a língua, como é que eu ia adivinhar?
– Eu não queria.
– Se eu soubesse, nem olhava para a sua cara. Tá cheio de menina muito mais bonita do que você querendo dar para mim lá na festa, até parece que eu preciso ficar com uma que faz doce.
– Eu não queria.
– Quer o que, que eu peça desculpas? Vai dizer que não gostou?
– Eu não queria.
– Agora é tarde, deixa quieto, segue a vida, não inventa de fazer post, textão, essas merdas todas, que você vai se incomodar, quem me conhece sabe quem eu sou, meu pai é importante, é amigo de juiz, de deputado, de governador, de presidente, a nossa família manda prender e manda soltar, esquece essa história, não vai ser difícil para uma bêbada, e tem mais, quem é que vai condenar um cara que agiu de boas, que só estava se divertindo, que não teve intenção de fazer nada de mal?