Logo saberemos qual presidente vai influir diretamente no destino do Brasil pelos próximos quatro anos. Presidente dos Estados Unidos, bem entendido. Dependendo se for um ou outro, é possível ter alguma esperança de mudanças na nossa política ambiental – Biden se importa com a destruição do planeta – e no desalinhamento das nossas relações exteriores com os países mais ultrapassadamente conservadores em questões de saúde, gênero e outras pautas tão fundamentais quanto. Talvez também parem as cutucadas com vara curta na China, o maior parceiro comercial do seu Zé, que planta soja lá no interior de Três Passos. Veremos. Para o nosso bem, seria melhor apostar em Joe Biden e sua vice nada decorativa, a senadora Kamala Harris.
Importante lembrar que, se Biden for eleito, o capitalismo não tem nada a temer. Ele é branco, rico, defensor da livre iniciativa, liberal e etc etc etc. É um democrata que não assusta ninguém, como 99% dos democratas norte-americanos.
O único que ousa avançar um pouco mais em certos conceitos, o senador Bernie Sanders, já pela segunda vez foi preterido por seus próprios correligionários. Aos 79 anos, pode ter sido a última vez que o mais carismático dos democratas tentou disputar a presidência dos Estados Unidos. Tomara que não.
A entrevista de um dos autores norte-americanos mais importantes dos nossos dias, Paul Auster, revelou algumas impressões do lado pró-Biden. Leitora, leitor que preferem o Trump – política é um pouco como futebol, a gente acaba escolhendo um lado assim como torce pelo Barcelona ou Real Madrid sem ter nascido na Espanha –, não se irritem. Na semana passada, a minha amiga e vizinha de Revista Donna, Martha Medeiros, sofreu várias grosserias por conta de uma bela coluna em que falou de um Brasil que já foi poesia e inspiração. Assinar uma coluna é dar a cara a tapa. Infelizmente, tem gente que entende essa expressão ao pé da letra e abusa da violência para discordar de um texto. Calma, pessoal. Raiva e amargura causam úlcera, rugas e, nos casos mais extremos, impotência. Fica a dica.
Voltando a Paul Auster. Talvez Trump seja reeleito, mas mesmo assim gostaria de trazer algumas das declarações do meu autor vivo mais amado e preferido sobre os últimos quatro anos nos Estados Unidos.
“Temos uma agência de proteção ambiental que não quer proteger o meio ambiente. Temos uma secretária de Educação que não acredita na escola pública. E assim com tudo.” Ele caracterizou a polarização do país como “uma guerra cultural americana” e, sobre a pandemia, disse: “Nunca na vida senti tanta indignação com a forma como um problema público foi administrado pelas pessoas no poder. Chamavam de farsa, ou de algo criado pela China. Não assumiram a responsabilidade de administrar uma crise nacional.”
Mais um trecho: “As coisas mudaram para sempre. O mundo em geral, e a América em particular, estão em crise. Temos o grande problema verdadeiro que todos devemos enfrentar, que é a mudança climática. (...) Se não agirmos já, será tarde demais. E o sofrimento nas gerações vindouras será espantoso. Já vemos os primeiros sinais neste país, os piores incêndios e os piores furacões que tivemos em nossa história. E é só o começo. Vai implicar uma nova forma de vida. As pessoas se irritam por usar máscaras na pandemia, imagine os tipos de mudanças que teremos que fazer para reduzir as emissões. (...) Não será fácil. Mas acredito que, se os democratas chegarem ao poder, e o Senado se tornar de fato uma instituição democrática, podem-se aprovar muitas leis que comecem o processo de arrumar algumas das injustiças mais atrozes do país.”
Logo, os Estados Unidos terão seu presidente. Seja ele qual for, vou encerrar com as palavras do senador uruguaio José Mujica ao renunciar ao seu mandato pelas limitações que a pandemia impôs aos seus 85 anos. “Eu tenho minha boa quantidade de defeitos, sou passional, mas no meu jardim faz décadas que não cultivo o ódio, porque aprendi uma dura lição que a vida me impôs. O ódio acaba idiotizando.”
Independentemente do presidente da vez, boa semana sem ódio para todos.