Era sempre a mesma coisa no feriado de Finados - que, quando a gente tem pouca idade, está muito mais para feriado do que para Finados. Em lugar de homenagear os mortos, corre-se para aproveitar a vida. A caminho de Florianópolis, o vento fazia o Fiat 147, primeiro carro já velho que orgulhosamente comprei com meu suado dinheirinho, dançar na estrada. Só no muque para segurar aquela casquinha. Por favor, meu Deus, só não me deixa parar dentro da Lagoa dos Quadros. Santa Catarina era quase do outro lado do mundo, com todos os perigos dessa travessia, a bordo de um velho Fiat 147.
Os dias voaram em 2019, quem sabe para acabar logo com esse ano que, não sei se concordam, vai embora sem deixar saudade - e também sem deixar garantias para os que trabalham, para os que estudam, para os que envelhecem, para os que precisam de assistência, para os que merecem descanso.
Feriado de Finados e ventania, uma tradição. Chegando à praia, penava-se para salvar do vento as toalhas, os chapéus, os chinelos, o jornal, o frasco de bronzeador. Nessa época ninguém usava protetor solar, era bronzeador mesmo, quanto mais oleoso para dar a ideia da carne fritando e ficando escura, melhor. Cada uma das minhas rugas de hoje tem a marca Rayito de Sol. Quem também precisava de uma âncora para não sair pelos ares com o vento de Finados era o guarda-sol. Quantos não foram em direção ao mar, flutuando coloridos pelo céu? Por fim, de suma importância era manter a boca fechada para não comer areia a cada rajada, ou seja, da manhã até o sol se por.
Pois novembro chegou outra vez com seus ventos que levam e levantam tudo. Lugar comum dizer que chegou voando. Os dias voaram em 2019, quem sabe para acabar logo com esse ano que, não sei se concordam, vai embora sem deixar saudade - e também sem deixar garantias para os que trabalham, para os que estudam, para os que envelhecem, para os que precisam de assistência, para os que merecem descanso. Eita, ano que termina sem deixar pedra sobre pedra. De bom, só os amores e os nenês que nasceram nele. E os poucos projetos que conseguiram vingar, apesar de tudo.
Melhor fechar a janela. Pela fresta, um uivo que cairia bem em um filme de terror. Se faltar luz, então, é certo que a claridade das velas revelará uma figura sem cabeça sentada no sofá da sala. No momento, o pânico é outro. Será que as esquadrias suportam tanto vento? Já tive uma veneziana que voou do sétimo andar em plena Rua 24 de Outubro. Entre as várias desgraças que poderia causar, foi cair em cima do meu próprio carro estacionado no pátio do prédio. Sem machucar ninguém. Alguma mão do além interferiu, só pode.
Senhores, segurem as perucas.
Senhoras, segurem as saias.
Vendedores de esquina, segurem seus produtos.
Banhistas, segurem seus guarda-sóis.
Bancas da Feira do Livro, segurem os telhados. E os clientes.
Novembro chegou chegando. Chegou ventando - inclusive em alguns países nossos vizinhos.
Segurem-se.