Bares e botecos são patrimônios culturais brasileiros. É praticamente impossível dimensionar a importância que eles têm na cultura e na gastronomia do nosso país. Não à toa, muitos movimentos políticos, sociais e até grandes clássicos da música surgiram em volta de uma mesa de bar.
Muito mais do que servir uma cerveja bem gelada com um tira-gosto, são pontos de encontro.
A cultura de boteco existe, resiste e é passada de geração em geração, seja para os que estão há décadas no setor ou para os que estão chegando agora.
Porto Alegre é reduto de clássicos que nos ajudam a contar essa história. O Tuim, por exemplo, é um dos grandes nomes do centro da Capital que, há mais de 80 anos, serve o chope bem tirado e o bolinho de bacalhau do mesmo jeito. No Point Beer, a relação entre cliente e estabelecimento vai muito além de anotar e servir o pedido. Quem chega no bar, chama os garçons pelo nome.
Talvez, sejam esses alguns dos fatores que fazem com que clientes, ou melhor, amigos, queiram voltar sempre. É ter a certeza de que serão bem atendidos, de que a cerveja estará no ponto e de que o garçom saberá exatamente os pedidos.
Mesmo que esses clássicos sigam firmes com o passar do tempo e jamais percam a sua majestade, a gastronomia da cidade ganhou novos estabelecimentos, que buscam maior sofisticação, seja no ambiente, no cardápio ou até no serviço. Bares investiram na coquetelaria internacional e em pratos mais elaborados, afastando-se um pouco da proposta de simplicidade dos botecos.
No entanto, nos últimos meses, novos lugares investiram no estilo despretensioso. As clássicas mesas de metais e os copinhos americanos voltaram a fazer parte do cenário boêmio da cidade. É justamente isso que o Largo da Chosen busca retomar.
— Nos encantamos com a tendência que se solidificou em outras regiões do Brasil e que, aqui, por algum motivo, as pessoas deixaram de procurar. Um consumo mais genuíno, deixando de olhar tanto para a coquetelaria clássica internacional e olhar para a nacional. E isso envolve um insumo totalmente brasileiro que é a cachaça — acredita Ricardo Cioba, sócio da Chosen.
A marca foi criada em 2016, em Porto Alegre, apenas como uma cervejaria cigana — que desenvolve as próprias receitas, mas produz em fábricas de terceiros. Depois de um ano e meio, os sócios encontraram um terreno na Rua Vasco da Gama e abriram o Estreito da Chosen, bar com uma proposta diferente para a cidade, mais informal, sem serviço de garçons e com chão de brita.
— Na época, foi um choque em relação ao que o mercado conhecia por bar. Foi a nossa primeira casa e foi importantíssima para que a Chosen se tornasse conhecida — conta Ricardo.
Com a ideia de democratizar e simplificar ainda mais o consumo da cerveja artesanal, há pouco menos de um mês, a marca ocupou um casarão em uma esquina do 4º Distrito e abriu o Largo da Chosen. Desta vez, com um consumo mais simples e informal. A escolha do local de esquina não foi em vão, os sócios buscavam um espaço que fosse o encontro de duas ruas, para incentivar que as pessoas ocupassem o ambiente, consumindo na calçada mesmo, com um bom samba.
Além da estética de um botequim clássico, com o balcão de inox e as mesas de metal, a marca criou também um novo produto para o Largo, que é o Chopinho, uma cerveja mais leve e fácil de saborear nos dias de verão.
— Tem que ter muita atenção em relação ao que é servido, tanto em termos de bebida quanto de comida. A gastronomia deve conversar com o espaço, com qualidade. Apostamos em acepipes para compartilhar, como torresmo, ovinhos de codorna e até clássicos, como o bolovo — ressalta o sócio.
FOCO NA GASTRONOMIA LOCAL
Na mesma linha da simplicidade, o Zanza é mais uma novidade da Capital que aposta nos clássicos bem feitos, como o pastel de camarão, que é um dos carros-chefes do cardápio. Laura Matiotti, proprietária da casa, conta que não tinha a pretensão de abrir um bar, mas quando viu o espaço da Rua Vasco da Gama para alugar, não pensou duas vezes.
A casa inaugurou há menos de duas semanas, e Laura conta que não esperava um movimento tão rápido. Abriu no primeiro dia apenas para alguns amigos e, quando viu, pessoas que passavam pela rua começaram a entrar. Desde então, todos os dias registraram filas de espera. Inclusive, Zanza vem da ideia de “zanzar” pelas ruas do bairro e encontrar um local para entrar.
O cardápio da casa aposta em produtos locais, trazendo charcutaria e vinhos gaúchos, e, na carta de drinks, clássicos brasileiros, como o Jorge Amado, que leva cachaça.
— Temos produtos incríveis aqui e precisamos valorizar a nossa gastronomia. A gente busca abrir essa vitrine para que mais pessoas conheçam o que produzimos por aqui — ressalta.
A casa conta com amplo espaço ao ar livre e a decoração reúne itens antigos, como um balcão refrigerado que faz parte do bar e deixa as bebidas à mostra, e a campainha na qual os atendentes avisam que os pedidos estão prontos. A proprietária conta que a reforma do espaço, que antes abrigava uma parrilla, levou nove meses, e boa parte dos móveis foram garimpados por ela em antiquários.
Sejam os novos ou os clássicos botecos, todos se unem com a mesma qualidade aliada à simplicidade e ao sentimento de proximidade do cliente. Não importa o tempo de existência, a verdade é que um bom boteco sempre será o lugar com o atendimento mais caloroso, onde nos sentimos em casa.
Vida longa aos velhos e aos novos clássicos!