Por Luiz Américo Camargo
Pensei muito se deveria escrever ou não sobre este tema. Afinal, vai que alguém se melindra e resolve me atacar... Brincadeiras à parte, o assunto é a polarização política levada à mesa em tempos de impeachment e de mudança de governo. Ou melhor: as diferenças de opinião contaminando o salão do restaurante.
Temos visto vários relatos de discussões acaloradas que derivam para insultos e coisas piores; de abordagens agressivas com autoridades e figuras públicas; de gestos de execração coletiva. E tudo isso na hora do almoço, na hora do jantar, levando clientes às vias de fato, obrigando algumas pessoas a entrar ou sair por passagens secretas, escoltadas por maîtres e proprietários. Precisamos disso?
Não sei se meu ponto de vista é antiquado. Ou se apenas não consegui me libertar dos ensinamentos familiares, “na mesa, não se briga”. Mas acho que deveríamos negociar uma trégua: vamos comer e deixar comer, sem bate-boca por questões partidárias?
Imaginemos um repasto de domingão. A turma ao lado está proferindo opiniões que maltratam as suas crenças (e nem vem ao caso quais são elas). O que fazer? Tome um gole d’água e segure a onda. Aí, você olha para a porta de entrada e vê despontar um membro do governo (nem me importa se do atual ou do anterior) que sempre lhe pareceu insuportável. Proceda assim: não vote nele, faça campanha contra, alerte seus amigos sobre quão ruim ele é. Mas deixe o sujeito almoçar sossegado com a família. Em nome da boa educação e do respeito à hora da refeição.
É importante que se converse sobre o poder e sobre os rumos do país. Mas respeitando o prato, o ambiente, o momento. Nem carece de retornarmos aos ditames da etiqueta tradicional, na linha “religião e política não se misturam com comida”. Podemos adotar um amplo cardápio de temas, por que não? Só que sem desrespeitar quem não concorda com a gente. Honrando os outros comensais e o trabalho do cozinheiro, de quem nos serviu, do dono da casa.
Eu, por exemplo, gosto de carne de porco com vinho branco. Peço sempre água sem gás. Prefiro massas e arroz al dente. Você não? Tudo bem. Tomemos nossos lugares e, bom apetite.
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