Por muito tempo, a carne de porco ficou em segundo – ou até mesmo em terceiro e quarto – plano em função da contaminação e da transmissão de doenças graves. Nos últimos anos, porém, com produtores mais qualificados, bares e restaurantes brasileiros têm se esforçado em trazer o ingrediente para os cardápios, principalmente por ser versátil, saboroso e mais barato.
– A carne de porco combina com tudo, pode ser gordurosa ou não, e tem um custo menor. Além disso, é muito difícil estragar um porco, até bem passado fica bom – defende o chef André Mifano, que comanda o Vito, em São Paulo.
Em seu restaurante, Mifano faz questão de promover a cultura do não desperdício e, por isto, lá todas as partes do animal são usadas na cozinha. Além da barriga, da costelinha e dos embutidos presentes no cardápio, o rabo, a orelha e o focinho servem para fazer caldo. A cabeça vai para um bolinho servido no menu degustação. O joelho vira recheio de ravióli, e os pés são usados para engrossar feijões. Isso sem falar da pancetta e do bacon defumado, também feitos com partes do animal.
Também localizado em São Paulo, o Epice, de Alberto Landgraf, aposta em partes menos comuns do porco desde que abriu, em 2011. Por lá, o cardápio conta com orelha frita, pé recheado e rabo desossado e grelhado na chapa.
– Na Europa, eles usam miúdos e partes menos nobres do porco há muito tempo. Como estudei lá, acabei adaptando meu estilo de cozinhar ao que aprendi. Partes como barriga e orelha são mais gordurosas e muito mais saborosas. Além do sabor, conseguimos aumentar o aproveitamento do alimento – comenta Landgraf.
Pensando em colocar no papel a prática de aproveitar o porco por inteiro que já existia em seu restaurante, o chef britânico Fergus Henderson lançou, em 2004, o livro The Whole Beast: The Nose to Tail Eating – algo como “comer o animal do focinho até o rabo”. A filosofia prega que é mal-educado matar um animal e não aproveitá-lo por inteiro, o que vem a calhar em uma época em que se prega a sustentabilidade como forma de termos um mundo melhor.
– Em São Paulo, mal temos água, como vamos jogar alimentos fora? Devemos transformar aquilo que é dispensável em especial – argumenta Mifano. – É muito mais válido comprar um porco por inteiro do que segmentá-lo. Também fica mais barato para mim. E é possível fazer isso com vegetais e outros animais, como gado e peixe.
* Conteúdo produzido por Juliana Palma