Muito se sabe sobre vinhos, mas pouco se sabe sobre o que vem antes deles. Na hora de desenvolver um novo rótulo, precisamos entender quem é o consumidor, qual a proposta da bebida e, principalmente, se temos a variedade de uva disponível nos vinhedos. Caso contrário, é necessário fazer o plantio primeiro, para depois de três anos, em média, conseguir fazer a primeira colheita e vinificação-teste.
Enólogos, junto ao marketing das empresas, estão sempre atentos às demandas do mercado, para testar novas variedades e, consequentemente, novos rótulos. Para isso, necessita-se tempo de vinhedo, seja ele próprio da vinícola ou de outros produtores. Independentemente, essa comunicação entre campo e mercado precisa estar sempre aliada ao futuro.
Os vinhedos-teste são áreas destinadas para os experimentos de uvas novas, como os clones da já conhecida cabernet sauvignon, por exemplo. Neles, busca-se melhorias em qualidade e produção, e realiza-se testes com variedades resistentes a fungos (piwi), além de ensaios de porta-enxertos, com o objetivo de adaptá-las às características do solo.
Lucindo Copat, enólogo que já participou de centenas de implantações e testes de variedades, reforça que, no Brasil, por ser um país tropical, o clone da uva precisa ser o melhor adaptado à região, e o porta-enxerto também faz a diferença.
O solo é superimportante, mas já temos tecnologias para corrigir o mesmo, melhor desenvolver a planta e usar a microbiota para ciclagem dos elementos do solo.
A escolha das variedades
Essa parte requer um pouco de senso, como é o caso da syrah, em Bagé.
– Quando iniciamos a escolha das variedades, há 20 anos, eu tinha acabado de voltar da Austrália. Encontrei algumas características peculiares das ondulações do relevo semelhantes entre o país da Oceania e a região da campanha gaúcha – relembra Lucindo.
A variedade francesa ganhou notoriedade no continente, onde o clima é bem diferente do nosso, mas o enólogo conta que, juntando as experiências e observações, a syrah foi escolhida como uma das variedades para o campo experimental em Bagé.
Assim como a tannat, a grande proximidade com o Uruguai e o destaque da qualidade dos vinhos fez com que a campanha gaúcha investisse nessa uva e, hoje, está colhendo bons frutos e elaborando vinhos elegantes, frutados e mais leves para consumo jovem.
Também foi o caso da glera. Além do consumo de espumante ter crescido, o produto mais leve, elaborado pelo processo charmat, caiu no gosto do público e virou bebida do dia a dia, até na beira da praia. O mercado estava demandando por algo mais leve e de melhor custo-benefício. Assim, a glera passou a ser produzida, já que tem alta produtividade, e foi muito bem adaptada à serra gaúcha, região com muita similaridade ao Vêneto, na Itália, local de origem do Prosecco.
Implantar vinhedos novos tem propósito, tem experimentação e muita tecnologia. Estamos sempre buscando melhorar a qualidade dos vinhos mas, para isso, precisamos ter matéria-prima de qualidade. O investimento em adaptar novos clones são constantes e a aposta em novas uvas também, sempre buscando integrar e melhorar o ecossistema: produtor, vinícola, mercado, consumidor e, claro, meio ambiente.