O Clone, um dos maiores sucessos — nacionais e internacionais — da Globo, volta ao ar no Vale a Pena Ver de Novo a partir desta segunda-feira (4). Escrita por Gloria Perez e com direção geral de Jayme Monjardim, a história, levada ao ar originalmente entre 2001 e 2002, misturou cultura muçulmana, clonagem humana — um tema ainda pouco conhecido na época — e dependência química.
Como protagonistas de um amor que desafiava a diferença de culturas entre Ocidente e Oriente, o casal Jade e Lucas, personagens de Giovanna Antonelli e Murilo Benício, entrou para a galeria dos pares icônicos das telenovelas. O resultado? Uma das maiores audiências da Globo na faixa das oito.
A trama também funcionou muito bem por outros motivos. Gloria foi a fundo no drama de Mel (Debora Falabella), filha de Lucas, e Nando (Thiago Fragoso), viciados em drogas. Para o lado do humor, havia a personagem Dona Jura, interpretada pela atriz Solange Couto, que emplacou o bordão "não é brinquedo, não".
Do núcleo que morava no Marrocos, personagens como Tio Ali (Stênio Garcia), Nazira (Eliane Giardini), Kadhija (Carla Diaz) e Tio Adbul (Sebastião Vasconcellos) caíram no gosto do público. As expressões que eles usavam, como "insh'Allah", "arder no mármore do inferno", "mulher espetaculosa" e "jogar a vida no vento", viraram moda — e são lembradas até hoje.
Recém exibida pelo canal Viva e disponível no catálogo do Globoplay, O Clone faz sua segunda passagem pela faixa de reprise da Globo e substitui Ti Ti Ti. Dez anos depois de ser exibida pela última vez na TV aberta, a trama tem tudo para fisgar novamente o público que parece cada vez mais interessado em novelas que fizeram história — a emissora estuda, inclusive, abrir um novo horário para reapresentações.
Em entrevista por e-mail ao Estadão, Giovanna fala sobre o sucesso de Jade e como foram os preparativos para viver a personagem, sua primeira protagonista de uma novela das oito.
Giovanna, você vinha de uma personagem marcante, a Capitu de Laços de Família, que ganhou a simpatia do público, e passou para a Jade, uma protagonista absoluta, com características bem diferentes da personagem anterior. Isso tudo aconteceu com apenas uma novela de diferença. Como foi essa transição para você?
Tenho muita vontade de trabalhar, realizar e viver desafios. Me reinventar com novas possibilidades e personagens. Sempre fui à luta, corri atrás. Os "nãos" nunca me fizeram desistir. Então, agarrei com tudo essas oportunidades. Faço com muito prazer e entrega o que me proponho. E, com Capitu e Jade na minha mão, não podia ser diferente.
Jade demandou uma grande preparação, na qual você aprendeu a dançar, a usar trajes e acessórios. O quanto isso exigiu de você?
Muito esforço, dedicação e comprometimento. Não só meu, mas de toda a equipe e elenco. Ao mesmo tempo, uma grande experiência de vida profissional e pessoal. Foi uma personagem muito interessante de compor. De corpo e alma, nuances e conflitos. Jade trazia muitas tintas. Só de dança do ventre eram mais de 10 horas por dia durante semanas para fazer bonito para o público de casa.
A novela foi longa, o que deve ter dado quase um ano, entre preparação e gravações, de convivência com a personagem — além de você ter muitas cenas na novela. Como é para uma atriz conviver com uma personagem por tanto tempo?
Amo fazer novelas. Quando entro, sei que tenho que abdicar de muitos momentos da vida pessoal durante aquele período. Mas, quando percebo o retorno do público, me sinto tão grata, e tudo passa a fazer sentido, além do meu amor pela profissão. Fazer parte de trabalhos como O Clone é um privilégio para um artista.
O amor de Lucas e Jade deu muito certo, e entrou para a galeria de casais icônicos da história das telenovelas. Há alguma fórmula para que isso aconteça?
Primeiro, a construção do texto da Gloria. Sou louca por ela e por sua forma de trazer tantos assuntos relevantes para o público. Nosso casal era submerso em culturas tão ricas. E nisso nasce essa história de amor e paixão. A junção do Oriente com o Ocidente traz muitos ingredientes saborosos para a trajetória dos dois.
Quais são as principais lembranças que você guarda como atriz e como pessoa de O Clone?
Mergulhar numa cultura diferente da sua sempre é um desafio e, ao mesmo tempo, traz magia, novas descobertas e um novo olhar. Nós nos divertimos muito. Imagina ficar quase 50 dias, aos 20 anos de idade, no Marrocos! Que aventura! Foi muito intenso e de muito aprendizado para a vida toda. Fora que olhar para o meu filho Pietro hoje, que é um presente, me faz saber que de alguma forma ele estava já conectado a mim, quando conheci o Murilo (Giovanna e Murilo foram casados) nessa novela. Emocionante.
Você tem uma resposta para o motivo de O Clone ter feito tanto sucesso, não só aqui, mas em diversos países mundo afora?
Gloria Perez é uma mulher à frente do tempo. Uma inovadora. Sucesso nunca vem sozinho, é resultado do esforço coletivo. E, cá entre nós, quem não quer viver uma grande história de amor, não é? O Clone é a prova de que boas histórias nunca envelhecem.
Entrevista: Murilo Benício
Por telefone, Benício fala sobre como foi construir três personagens em O Clone e como a repercussão da novela atingiu a sua carreira.
Nas novelas que escreve, Gloria Perez sempre se adianta a temas que se tornarão debates na sociedade. Aqui, foi assim com a cultura muçulmana e a clonagem. Qual foi sua primeira impressão quando foi convidado para fazer a novela?
A Gloria fala de assuntos que até desconhecemos. A primeira vez que isso me chamou a atenção foi quando ela fez uma novela (Explode Coração) em que as pessoas se comunicavam por computador — que era o e-mail que, na época, era algo maluco para nós. Em O Clone, o que me chamou a atenção foi a questão da clonagem humana mesmo, da ética na medicina. Ninguém sabia para qual lado isso iria. Gloria é visionária.
Foi a primeira vez que você foi dirigido pelo Jayme Monjardim, que também estreava a parceria com a Gloria. Ele é um diretor com uma marca muito forte. Dizem que ele dá uma atenção muito especial ao elenco. Como foi trabalhar com ele?
O Jayme sempre me passou ser um cara muito apaixonado pelo que faz. Sempre soube muito o que queria. Esse contato com os atores é justamente pela paixão que ele tem pelo trabalho. Ele tem uma delicadeza com o trato com os atores que é necessária — precisamos nos sentir queridos. Ele ouvia a opinião dos atores e dividia o que ele pensava.
Você fez o Lucas, o clone Léo, e ainda o Diogo, um irmão gêmeo do Lucas. Como construiu a diferença entre eles?
O Diogo ficou muito pouco na novela (o personagem morre no início). Lucas era um cara apagado, sem expressão. Lembro que não queria fazer o Lucas e o Diogo tão diferentes. Eles tinham os mesmos pais, o mesmo dinheiro, fizeram as mesmas viagens. Fiz um mais inseguro e outro mais seguro de si. Queria dar a grande diferença justamente entre o Lucas e o Léo, que era o clone, que foi criado em um ambiente diferente, com outra família.
Os protagonistas estão mais sujeitos às críticas. E elas aconteceram em O Clone. Como você as encarou?
Lembro que o Léo era para aparecer muito mais cedo na novela. Isso, por algum motivo, não aconteceu. Então, eu acabei ficando com a barriga (fase em que nada de muito relevante acontece na história) inteira da novela com um personagem sem sal (Lucas). Um cara apagadinho, deprimido, que carregou a novela por muito tempo. Recebi muitas críticas na época. Quando o clone apareceu, as críticas sumiram. Acho que as pessoas disseram: "Ah, entendi".
O par com a Giovanna Antonelli deu muito certo. O público embarcou na história do casal. Isso colaborou para o sucesso?
Colaborou, sim. A história era muito centrada no amor entre Jade e Lucas. Quando o Léo chegou, virou quase um triângulo amoroso. Essa química funcionar é muito importante para a novela, sem dúvida.
O que muda, de fato, para um ator fazer um grande sucesso como protagonista de uma novela das oito?
Você vai para outro patamar na sua carreira. Mal ou bem, você está encabeçando um elenco de uma produção de muito sucesso. Ainda que o sucesso ou o fracasso de uma produção dependa de uma equipe inteira. Tem coisa que funciona até sem querer. De qualquer forma, ajuda um ator a se estabelecer, mas também não significa que isso aconteça. Depende da continuidade do trabalho. Depois de O Clone, acho — também não me lembro, pois faz tanto tempo — que eu possa ter me firmado aos olhos do público ou da emissora. Mas isso não foi determinante para minha carreira. Foi determinante apenas como história de eu ter feito parte de um êxito incrível pelo qual tenho um carinho enorme.
Provavelmente, a reprise será um novo sucesso. Você tem uma resposta para isso?
Se soubéssemos, faríamos um atrás do outro. Estou há 30 anos na Globo. Ela fez inúmeros sucessos, mas dois fenômenos que, por sorte, eu estava presente: O Clone e Avenida Brasil. O Clone mexeu muito com as pessoas. E não foi por uma moda ou um momento histórico. E sim por causa de uma história de amor que deu certo. A novela chegou e contou uma história maluca que foi comprada por todo mundo.