Em AmarElo – É Tudo Pra Ontem, Emicida propôs uma aula sobre heróis negros na história brasileira. Sua figura de professor volta a reinar em O Enigma da Energia Escura, série que estreia nesta quarta-feira (18), às 23h30min, no canal pago GNT. Com a preocupação de reconstruir a história do país refletindo a respeito de temas como desigualdade social e branquitude, o rapper faz uma espécie de continuação do documentário lançado no ano passado pela Netflix.
Em uma das cenas de AmarElo, a ativista americana Angela Davis questiona o porquê de o Brasil sempre voltar seu olhar aos EUA para refletir sobre o movimento negro. Nesta nova série, que também será disponibilizada na íntegra no Globoplay, Emicida traz o assunto ao centro novamente.
— A série tira a gente da superfície, aprofundando os temas e sugerindo linhas de raciocínio que gerem mudanças. A ideia foi abordar temas sobre os quais já ouvimos falar em alguma dimensão, mas que ainda precisam ser debatidos amplamente para podermos avançar — explica o rapper, em entrevista por e-mail a GZH.
Nos cinco episódios de 25 minutos de duração, em média, o artista estabelece a conversa com o público a partir de uma cabine espacial, em uma “galáxia distante”, em alusão direta à origem da cultura hip hop na década de 1970. Naquele período, as festas de rua do Bronx, em Nova York, colocavam os DJs e os MCs em um mesmo patamar — mesmo que dialogassem com “espaços siderais diferentes”, segundo o artista.
Além de fazer esse paralelo com o rap, a série conversa com especialistas, intelectuais, ativistas, artistas e pensadores para reconstruir a história do povo brasileiro. Entre eles, estão o cofundador do Instituto Brasileiro da Diversidade, Hélio Santos, a cantora Margareth Menezes e o escritor e ativista indígena Ailton Krenak.
Para Emicida, no entanto, o seriado também serve para retomar outro grande nome já apresentado em AmarElo, a filósofa Lélia González, que é considerada uma das principais ativistas do movimento feminista negro.
— Ela nos apresenta o seu conceito de “pretuguês”. E levar a releitura da mãe preta na construção e na disseminação de valores na sociedade para a televisão é algo importante. De certa forma, ela responde um pouco sobre qual é a mensagem da série, que é ampliar a nossa forma de ver o mundo, a fim de torná-lo um lugar melhor — reforça Emicida.
Educação
A produção de O Enigma da Energia Escura é assinada pelo próprio Emicida ao lado do irmão, o empresário e músico Evandro Fióti. Para fechar o time, três negros completam a direção geral do projeto: Day Rodrigues (de Mulheres Negras – Projeto de Mundo), Emílio Domingos (do longa documental Favela é Moda) e Mariana Luiza (do curta-metragem Casca de Baobá).
Para Fióti e Domingos, o fato de cinco negros conduzirem um mesmo projeto é uma marca no audiovisual brasileiro.
— Nós temos um vasto arquivo material, mas o mais fundamental é essa construção do olhar do negro sobre o negro. Na sociedade brasileira, racista e elitista como ela é, tendo os negros como a maioria, é importante que a gente reflita sobre isso, já que a nossa história é tão apagada nessa construção — acredita Domingos.
Outra proposta do seriado é a preocupação em formar o público sobre a negritude. Emicida recorda que, quando estava no Ensino Fundamental, ficou um ano distante da escola por conta do racismo que sofria. Ele se diz eternamente grato à professora Rita de Cássia, que passou a adaptar, quando ele voltou à aula, suas lições de casa para o formato de quadrinhos, por saber do seu interesse.
— Posso dizer que se não fosse ela, eu, o Emicida, não estaria aqui. Ou seja, minha preocupação é constante pela evolução da educação em tudo que a gente faz. Os professores não têm respaldo econômico, tempo para oxigenar as ideias e nem como voltar para sala de aula com soluções e estratégias para entender os pontos fracos e a capacidade de cada um dos seus alunos — lembra o artista.
Assim como AmarElo e O Enigma da Energia Escura, os projetos futuros de Emicida devem continuar explorando o assunto. Nesta semana, o rapper está em Portugal, cumprindo sua residência artística no Centro de Estudos Sociais de Coimbra, e segue escrevendo todos os dias.