O jogo da discórdia da última segunda-feira (5), no Big Brother Brasil 21, reascendeu o debate sobre casos de racismo vistos no reality show. Na dinâmica - por meio da qual os participantes usaram flechas para elencar quem estaria jogando sujo e quem consideravam o melhor e o pior jogador da disputa -, o professor de geografia João Luiz expôs sua dor ao relembrar uma fala preconceituosa de Rodolffo, um dos emparedados da semana, sobre seu cabelo.
No sábado (3), ao vestir a fantasia de homem das cavernas que integrava o castigo do monstro, o sertanejo comparou a peruca enviada pela produção ao cabelo de João Luiz. O brother sentiu-se desrespeitado, e chegou a desabafar com outros participantes sobre a dor que o comentário lhe causou. No jogo da discórdia, ele justificou as flechadas no cantor relembrando o episódio.
Rodolffo tentou se explicar, após o apresentador Tiago Leifert lhe conceder espaço para resposta. Contornando o reconhecimento de seu erro, o sertanejo alegou que não sabia a respeito do sentimento de João em relação ao caso, mas voltou a afirmar que via semelhança entre a peruca e o cabelo do professor.
Acolhido por outros brothers, João rebateu as justificativas dadas pelo sertanejo, afirmando estar cansado de precisar enfrentar esse tipo de situação.
— Eu estou cansado de ouvir isso. Não é só aqui dentro, é lá fora também. Nunca ninguém tem a intenção de machucar, nunca ninguém tem a intenção de fazer as coisas com a gente — disse João. — Por que, que não é mais fácil para você reconhecer que errou, cara? Você fala pra mim que quer ser melhor e você acabou de reafirmar, você tá reafirmando a mesma coisa que você falou — acrescentou, em seguida.
Repercussão
Fora da casa, os administradores das contas do professor nas redes sociais reafirmaram o quão inadmissível é a situação enfrentada por ele, criticando a postura de Rodolffo. "Mas não sabe pedir desculpas mesmo, né?", publicou o perfil oficial de João no Twitter. Internautas e artistas também manifestaram apoio ao participante, e fizeram campanha pela eliminação do sertanejo. Em Porto Alegre, vereadores da bancada negra da Câmara Municipal prestaram solidariedade ao brother.
Já a assessoria de Rodolffo usou as redes para pedir desculpas pelo ocorrido no reality. "Pautas como essa levantadas, principalmente ao vivo, são muito importantes. Obrigado @joaoluizpedrosa e @camilladelucas por abrirem uma coisa tão delicada que aconteceu. Esperamos que aceitem as desculpas, que perdoe o que te feriu e que tudo possa ser superado por vocês", publicou a conta do cantor no Twitter.
Internautas pedem punição
O episódio também reascendeu um debate iniciado ainda na edição de 2019 do reality show, quando outros episódios de preconceito tomaram grande proporção no programa: não deveria haver algum tipo de punição no jogo quando casos como este ocorrem dentro do confinamento?
Tomando como exemplo o ocorrido na edição de 2020 do Big Brother Portugal — quando a participante Sónia Jesus proferiu falas de cunho racista a respeito de brasileiros e acabou punida pela produção, perdendo a liderança e sendo automaticamente colocada no paredão —, internautas cobraram pela incorporação de medidas disciplinares que visem punir, também por meio de mecanismos da disputa, falas de confinados que endossem o racismo (que, dentro e fora da casa, é crime).
De fato, esta não foi a primeira vez em que participantes negros do Big Brother Brasil precisaram se impor contra episódios de cunho racista — sejam eles dentro ou fora da casa. Com mais força desde o BBB 19, o racismo foi pauta de todas as edições seguintes do programa, chegando a gerar investigações policiais sobre alguns dos protagonistas de falas preconceituosas. Abaixo, confira situações que marcaram as edições recentes do reality.
Big Brother Brasil 20
No Big Brother Brasil 20, a discussão sobre o combate ao racismo foi uma das pautas que mobilizaram a edição. Marcado também por bandeiras contra o machismo e a homofobia, o BBB 20 foi, talvez, a temporada anterior que mais colocou holofotes sobre as lutas contra diferentes tipos de preconceito.
Ainda confinada no reality, a campeã da edição, Thelma Assis, sofreu diversas ofensas racistas nas redes sociais. A médica também foi vítima de comentários preconceituosos por parte do empresário Rodrigo Branco, que durante uma live no Instagram afirmou que os votos para que a participante fosse campeã seriam "porque ela é negra, coitada". O caso, assim como outros dos quais a campeã do BBB 20 foi vítima, foi levado às autoridades.
Na casa, a sister também precisou lidar com comentários feitos pela sister Gizelly Bicalho a respeito de seu tom de maquiagem. "Gente, eu não sei o que a Thelminha passa na cara, é barro?", perguntou a advogada, rindo, e Thelma explicou que sua cor de base era marrom. Fora da casa, a assessoria da sister considerou o caso como um episódio de racismo recreativo — quando elementos da cultura e a própria aparência de pessoas negras são ridicularizados, em colocações travestidas de brincadeira.
Quem também foi alvo de comentários preconceituosos no BBB 20 foi Babu Santana. O ator acabou isolado pela "comunidade hippie", formada por nomes como Marcela McGowan, Ivy Moraes, Manu Gavassi e o gaúcho Daniel Lenhardt. Parte do grupo chegou a conversar, em um dos episódios, que Babu, há semanas no grupo xepa, deveria ser colocado no vip apenas "para arrumar a cozinha todo dia". Votado em todos os paredões, a perseguição contra o ator foi lida como racismo pelos espectadores.
Outro episódio marcante sofrido pelo ator foi quando a modelo Ivy Moraes fez piada com o pente garfo utilizado por Babu. No quarto com Piong Lee e Gizelly Bicalho, a sister questionou, aos risos: "Quem que penteia o cabelo com um trem desse?". Na internet, espectadores pediram a expulsão da participante, que já havia manifestado outras falas discriminatórias.
Big Brother Brasil 19
O Big Brother Brasil 19, edição com o maior número de participantes negros da história do reality, até aquele momento, foi a primeira a jogar o holofote das discussões que extrapolam o confinamento para a pauta do racismo — além disso, o BBB 19 também levantou debates sobre homofobia, zoofilia e violência sexual. No reality, participantes como Rodrigo França e Gabriela Hebling foram vítimas de comentários de cunho racista e alvos de intolerância religiosa em relação a suas crenças, ligadas a matriz africana.
A maior parte da falas problemáticas assistidas na edição vieram da advogada Paula Sperling — que, apesar disso, acabou por sagrar-se campeã do BBB 19. Em uma das ocasiões em que a postura da sister foi apontada como racista, ela comentou com Gabriela que seu cabelo também era "ruim", em comparativo com o da colega. Em outro episódio, Paula revelou a Hariany Mesquita, sua dupla no reality, que sentia medo de Rodrigo porque "ele fala o tempo todo desse negócio de Oxum deles lá". A sister ainda acrescentou que "Deus é maior", e foi acusada de preconceito religioso.
Na mesma edição, o participante Maycon Santos revelou teria ouvido vozes enquanto Rodrigo e Gabriela dançavam "umas músicas esquisitas" — a canção Identidade, de Jorge Aragão. Ele foi acusado de intolerância.
— Olhei para os dois num sincronismo legal, achei legal, juro por Deus. De repente, comecei a olhar e escutar uns negócios: "Não faça igual a eles". Aí veio Jesus Cristo em minha mente: "Não para aqui, para a vida inteira. Se fizer igual a eles, eles ganharão mais força" — disse o brother, que em outra ocasião havia sugerido que a sister Isabella estaria resfriada por conta de um "trabalho" feito por Gabriela.
Os episódios levaram a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância da Polícia Civil do Rio de Janeiro a instaurar um inquérito para investigar as supostas condutas racistas e intolerantes de Paula e Maycon no reality. A investigação, contudo, acabou por ser arquivada.
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