No ano em que marca meio século de saudade de Lupicínio Rodrigues, o Centro Municipal de Cultura (CMC), que leva o nome do mestre do samba-canção e foi construído na região onde o poeta nasceu, foi atingido pela enchente que assolou o Estado. Parte do espaço foi duramente afetada pela água e, para voltar a ter a presença de diferentes expressões artísticas, precisaria de uma profunda reforma. Na última semana, ela começou.
A projeção da Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa (SMCEC) é que a reabertura completa do local seja em março de 2025.
Três equipamentos do CMC estão em obras neste momento: o Teatro Renascença - que necessita ser totalmente recuperado - e partes consideráveis do Atelier Livre Xico Stockinger e da Biblioteca Pública Municipal Josué Guimarães.
Mesmo com um certo tempo de distanciamento, o cheiro da umidade, da enchente, que impregnou a cidade, ainda está presente nestes espaços.
No ponto mais crítico, o Renascença, a água chegou até a oitava fileira de cadeiras, inundando praticamente todo o local e deixando o palco completamente submerso.
Todos os 270 assentos do teatro foram descartados, por conta da lama e da contaminação — estão amontoados no fundo do teatro, aguardando descarte. Já removido, o carpete precisará ser totalmente substituído. O tablado do local teve outra sorte. Por conta de sua madeira de lei, passará por uma recuperação mais simples e poderá ser quase totalmente mantido.
— Vamos ter novas poltronas e carpetes, especiais para teatro, manutenção dos dois camarins, das varas cênicas e recuperação elétrica onde for necessário. No subsolo do teatro, existe uma área de infraestrutura do prédio todo, com reservatórios e bombas, que passará por manutenção geral — explica a arquiteta da SMCEC Juliana Wagner, que fiscaliza a obra.
Com esta reforma, o teatro também vai implementar melhorias, como a modernização das mesas de som e de luz, que serão substituídas, além de acessibilidade, com poltronas para obesos, corrimãos, local adequado para cadeirantes e rampas de acesso. Estes incrementos devem reduzir a ocupação máxima do teatro, ficando abaixo dos 270 locais de antes.
— Esta diminuição de capacidade será por um bom motivo. Vamos entregar o teatro um pouquinho melhor do que estava antes — salienta Juliana.
Coberto por uma capa, o piano do CMC, que teve os seus pés atingidos pela água, está aguardando para ser restaurado pela Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa). O processo deve durar seis meses — ou seja, quase o tempo de recuperação do próprio teatro.
Desenvolvida em conjunto com o Escritório de Reconstrução, a reforma do centro terá valor total de R$ 2,8 milhões, sendo realizada como compensação por uma obra da CFL Empreendimentos, dentro do Termo de Aquisição de Solo Criado por Contrapartida, assinado junto a Prefeitura.
— Para compensar a compra do índice construtivo para o empreendimento da CFL, a empresa paga em obra e não em dinheiro. E a gente sabe que o município não tem braço para tudo, pela grande perda que a enchente provocou na nossa cidade. Então, a gente teve que ter essa parceirização com a iniciativa privada, para que pudéssemos fazer essa reconstrução mais rápido — explica Liliana Cardoso, secretária municipal de Cultura e Economia Criativa.
Funcionando parcialmente
Se o Renascença está completamente isolado, os outros dois espaços que foram atingidos pela água voltaram a funcionar parcialmente. O Atelier Livre, mesmo tendo sido bem afetado em seu primeiro andar — que fica no subsolo —, conseguiu reabrir uma das salas, o que foi possível graças a uma recuperação liderada pela equipe do próprio CMC. Este espaço se soma aos do segundo piso, que não foram atingidos.
Assim, os alunos de cerâmica, escultura, gravura, arte em madeira, entre outras modalidades, puderam retomar as aulas. Os únicos que ainda aguardam para voltar são os estudantes de litogravuras, devido aos prejuízos com ferramentas. O retorno está previsto para dezembro. No total, os cursos somam 296 estudantes de artes, divididos em 20 turmas.
Dentro do Atelier Livre, além de ferramentas para a criação das peças, como prensas, foram perdidos materiais de escritório, da área administrativa, assim como 40% de uma biblioteca com mais de 4 mil itens.
A equipe de reforma está, no momento, reestabelecendo as sete salas de aula, bem como dois banheiros e uma cozinha que integram este espaço dedicado à confecção de artes manuais.
Já a Biblioteca Pública Municipal Josué Guimarães viu o seu subsolo ser totalmente tomado pela água — que atingiu 1m90cm e ficou represada no espaço por quase um mês.
No piso atingido, que está com pedaços da parede se desprendendo e cheiro de mofo, foram destruídas salas de reuniões, além de 600 DVDs e cerca de 400 livros, que seriam destinados para outras instituições do município.
O andar principal está acessível, com 40 mil obras disponíveis, e está está aberto para consulta de livros. Por ali, também, nesta reforma, haverá melhora na climatização, deixando o espaço mais confortável para receber os visitantes no verão. As claraboias também terão venezianas para proteger os livros da claridade. Os avanços são comemorados pela equipe e serão feitos na esteira das obras em andamento.
Ao contrário dos outros espaços, a Sala Álvaro Moreyra, que fica em um nível mais alto, não foi atingida pela água e pode funcionar plenamente, recebendo artistas para produções. Esta atuação, mesmo que parcial dos espaços do CMC, é importante para seguir movimentando a economia criativa da cidade, conforme explica a secretária Liliana:
— A classe artística também estava angustiada para voltar. Nós também tínhamos editais abertos no Renascença, que conseguimos remanejar para o Teatro de Câmara Túlio Piva. Um mês depois da chuva, conseguimos resolver a problemática, para que os artistas não ficassem sem o seu palco. E, se Deus quiser, vamos conseguir entregar o Centro Municipal de Cultura antes de março.