Quase um mês após a ampliação de horário de funcionamento dos bares, o futuro financeiro desses estabelecimentos ainda é incerto. A legislação municipal permite apresentações acústicas, que têm sido o ponto alto da vida boêmia gaúcha na pandemia, mas ainda há receio dos cidadãos de frequentarem estes espaços, especialmente aqueles sem área externa.
Desde 19 de setembro, o Matita Perê abriu suas portas, mas somente às sextas-feiras e aos sábados, das 18h às 23h. O proprietário Filipe Stella apontou que, enquanto não puder funcionar até pelo menos meia-noite, não vai operar o estabelecimento durante a semana, pois o risco financeiro é muito alto.
— Em vários bares noturnos as pessoas tendem a chegar às 20h, 20h30min, então às 22h30min tem que começar a encerrar a comanda para 23h fechar. É muito pouco tempo — disse.
O crescente movimento de reabertura, fundamentado nos decretos estaduais e municipais, vem trazendo otimismo para o setor. A última atualização da prefeitura de Porto Alegre foi a liberação do funcionamento de casas de shows, teatros e cinemas, entre outros espaços culturais.
— Todos do setor esperam no mínimo uma ampliação até meia-noite, essa hora faz bastante diferença para a gente. Claro que a gente gostaria de reestabelecer os horários normais, mas também a gente sabe de todas essas questões de segurança e tudo mais. É importante esse horário a mais. A gente tá na esperança por causa dessas ampliações aí — acrescentou.
Fiapo Barth, dono do Ocidente, afirmou que, por enquanto, o funcionamento do bar — que está com música ambiente — não vai sofrer alterações. A única coisa que tem buscado é a flexibilização do horário de funcionamento.
Enquanto isso, Cláudio Soares de Freitas, gerente-proprietário do Parangolé, afirmou que pensa em voltar a ter música ao vivo, um dos marcos do estabelecimento. Mas por enquanto, o movimento não tem se mantido em uma frequência boa para que o local, que reabriu no último dia 6, consiga se manter.
Em reformas, o Espaço Cultural 512 deve reabrir em 5 de dezembro com música ao vivo. Apesar de diversos locais terem aberto suas portas, ainda há aqueles que se negam a voltar a funcionar. Este é o caso do Café Fon Fon, fechado desde o dia 15 de março.
— Os locais tem a sua dinâmica, não tô aqui para julgar quem está certo e quem está errado. Eu, pessoalmente, não sinto segurança nesse decreto. Pelo bom senso, se for pensar só como comerciante, óbvio que a gente estaria aberto. Mas a gente lida com a vida dos outros e a nossa, porque é muito fácil pegar e botar o funcionário na frente — disse Bethy Krieger, dona do local.
Músicos
Para os músicos, a situação também é instável. Marcelo Rodrigues, integrante das bandas Riffmaker e Dropbox, contou que teve de voltar ao voz e violão, após mais de 15 anos tocando em grupo. Sozinho, está prestes a fechar 14 shows em outubro. Entretanto, não significa que tem ganhado dinheiro como antes da pandemia.
— Eu aceitei tocar por um valor diferenciado. Porque a gente sabe que as casas hoje estão ganhando menos. Tive vários shows com lotação esgotada, que toda a disponibilidade foi ocupada, e teve outros shows que eu fui que não tiveram ninguém. Não foi nem "ah, teve pouca gente". Não foi ninguém mesmo, e justamente nesse que eu ganharia por contribuição espontânea — contou.
O músico explicou que já está familiarizado com esses ambientes, uma vez que se apresentava com a banda em bares. Disse que convenceu alguns proprietários de casas noturnas, que não têm apresentações apenas com violão e voz, a fazerem um show nesse modelo. Também contou à reportagem ter visto uma mudança expressiva no perfil do público que frequenta esses locais:
— Quando eu comecei a tocar, vi que a noite é dos solteiros, porque as pessoas saem para caçar. A noite está bem mais fraca agora. Os casais estão saindo, e talvez estejam até saindo mais. Porque os casais, quando eles saem, saem para jantar, um programa mais gastronômico. E o pessoal que é solteiro sai mais para a balada, para beber. Eu brinco com o pessoal que agora é difícil de chegar em alguém porque primeiro não sabe se tem o corona ou não, segundo que tá de máscara. A noite acabou ficando mais dos casados.
Integrante das bandas Rock N' Roll Train, Rebaelliun e Ácidah, Evandro Passos também afirmou que a oportunidade de voz e violão chegou em boa hora. Dedicando-se exclusivamente à música desde 2014, ele estava parado desde 15 de março.
— A oportunidade chegou com o convite de bares onde as minhas bandas já tocavam antes da pandemia. Porém, no formato voz e violão, que eu faço com o meu colega da Rock N' Roll Train, o vocalista André Nascimento. O repertório é outro, dando mais destaque para músicas mais leves, e que se encaixem mais neste formato — contou. — Financeiramente o retorno tem sido bem menor do que era antes. Mas pra quem estava sem nada, qualquer ajuda é válida — acrescentou.
Mesmo com a restrição de capacidade, o músico afirmou que tem observando movimento nos locais que toca. Além disso, avaliou positivamente a reabertura gradual dos bares, destacando as medidas de segurança e cuidados tomados pelos estabelecimentos.
Na esteira do novo decreto, nada foi discutido em relação à possibilidade de fazer um concerto maior. Evandro disse que ainda pretende conversar com proprietários para ver quando voltarão a fazer shows com banda completa, mas avalia que, até o final do ano, permanecerá com voz e violão. Marcelo, por outro lado, espera conseguir concretizar os dois projetos de shows presenciais da Riffmaker enviados via lei Aldir Blanc.