Pilares importantes da cena musical de Porto Alegre demonstram sinais de desgaste na pandemia de coronavírus. Depois de cinco meses sem abrir as portas, casas de shows voltadas a diferentes públicos enfrentam dificuldades para pagar aluguel e outras despesas. E alguns proprietários já levantam a hipótese de encerrar de vez as atividades se não for possível retomar as atividades nos próximos meses.
O Ocidente, um dos principais palcos para a música alternativa e festas da Capital, é um dos negócios que poderão ser encerrados caso não haja condições de reabrir até março. O bar tem oferecido almoços por telentrega e takeaway desde junho, mas a receita é insuficiente para cobrir todas as despesas.
Fiapo Barth, fundador do Ocidente (ponto boêmio que completa 40 anos em dezembro) afirma que as contas só têm se mantido em dia graças a renegociações do aluguel e ao programa de suspensão temporária de contrato de trabalho do governo federal.
— Se esses programas de suspensão de contrato forem mantidos, aguento até março. Mas será preciso uma grande negociação com os aluguéis do espaço. Por enquanto, os proprietários têm sido muito compreensivos, reduzindo custos, mas não sei até quando – afirma Fiapo.
Espaço tradicional do jazz na Capital, o Café Fon Fon começou no mês passado a oferecer lasanhas e feijoadas aos sábados, mas os proprietários acreditam que será muito difícil manter o negócio ativo até março, caso o cenário em relação ao coronavírus não mudar.
— A ideia dos almoços é um paliativo. Estamos tirando de canequinha a água do navio. A gente tenta reduzir ao máximo nossos custos, mas não há como não pagar aluguel ou ficar sem luz e internet, por exemplo, porque dependemos da tecnologia para manter a segurança — explica a pianista Bethy Krieger, que administra o Fon Fon ao lado do saxofonista Luizinho Santos.
Gabriel Lopes-Salomão, do Gravador Pub, é mais um dono de casa de shows que afirma ter seu negócio em risco caso não possa reabrir até março. O empresário tem trabalhado com telentrega e takeaway de pizzas desde o início da pandemia, mas também considera o serviço como um paliativo diante da crise. Para seguir movimentando a cena cultural, Gabriel também tem promovido bate-papos e transmissões ao vivo com bandas.
— O que tem mantido a casa em pé são as pizzas que a gente está vendendo. Em função da pandemia, a gente baixou o preço da pizza. Imagina a dificuldade que é manter as contas em dias com um único produto, mais barato do que costumava ser. Mas é assim que estamos trabalhando — conta Gabriel.
Já o Agulha criou uma série de produtos que se relacionam com o isolamento social. Há desde pijamas até jogos de baralho e pingue-pongue, passando por cervejas especiais e bebidas para drinks. É também o único dos espaços fechados com um projeto de shows a distância. Em breve, deve disponibilizar uma agenda para apresentações com tecnologia de realidade virtual:
— A ideia é realizar shows no palco do Agulha com todos os protocolos de segurança, considerando só artistas solo ou bandas pequenas, para não gerar aglomeração. Venderíamos ingressos simples, para as pessoas assistirem no computador ou celular, e também uma modalidade com um óculos de realidade virtual, para a pessoa ter uma imersão em 360 graus, sentindo-se parte da plateia ou até da banda — conta Eduardo Titton, sócio do Agulha.
A maior parte dos donos de casas de shows entrevistados por GaúchaZH não pretende reabrir seus estabelecimentos sem que uma vacina esteja em uso, mesmo que as autoridades permitam um retorno das atividades antes disso. E até quem pretende reabrir antes da vacinação planeja uma volta parcial, sem shows presenciais. Claudio Freitas, do Parangolé, afirma que pretende voltar assim que houver uma liberação do poder público, porém com público reduzido e sem atrações musicais.
— Não podemos gerar qualquer situação que possa colocar em risco os clientes e nossa equipe. Sou uma das pessoas que trabalha a noite toda no bar e muitos dos frequentadores são verdadeiros amigos. Tudo tem que ser feito de modo que não ofereça risco a nós e a nossos amigos — avalia Freitas.
Já Cláudio Fávero, sócio do Opinião, é categórico em relação à necessidade de vacina:
— Uma casa como o Opinião não tem como retornar antes de uma vacina. Vamos segurar nosso negócio funcionando até isso acontecer. Nossa casa tem uma função na cena cultural de Porto Alegre há décadas. Está fora de cogitação fechar definitivamente. Seria injusto conosco, com os artistas, com o público e com a cidade.
A situação dos espaços
Agulha
- Fechado desde 16 de março.
- Situação dos funcionários: 10 suspensões de contrato. Não houve demissões.
- Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: indefinido.
- O que tem feito para minimizar a crise: venda de produtos pela internet, como bebidas, jogos e vestuário. Em breve quer promover shows à distância com óculos de realidade virtual.
- Reabre quando houver vacina ou controle dos casos de covid-19.
Café Fon Fon
- Fechado desde 14 de março.
- Situação dos funcionários: um funcionário em atividade. Não houve demissões.
- Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: até março.
- O que tem feito para minimizar a crise: lasanhas e feijoadas aos sábados por telentrega e takeaway.
- Reabre quando houver vacina ou controle dos casos de covid-19.
Gravador Pub
- Fechado desde 15 de março.
-Situação dos funcionários: uma demissão.
-Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: até março.
- O que tem feito para minimizar a crise: telentrega de pizzas e transmissões ao vivo.
- Reabre quando houver vacina.
Ocidente
-Fechado desde 14 de março.
- Situação dos funcionários: quatro em atividade, oito demissões, 25 suspensões de contrato.
- Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: até março.
- O que tem feito para minimizar a crise: almoço por telentrega e takeaway.
- Reabrir quando houver vacina.
Opinião
- Fechado desde 14 de março.
- Situação dos funcionários: 45 suspensões de contrato. Não houve demissões.
- Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: indefinido.
- O que tem feito para minimizar a crise: não criou alternativas secundárias. Tem realizado negociações com parceiros para estender prazos.
- Reabre quando houver vacina.
Parangolé
- Fechado desde 22 de março.
- Situação dos funcionários: uma suspensão de contrato e uma demissão.
- Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: indefinido.
- O que tem feito para minimizar a crise: não criou alternativas secundárias.
- Reabre quando a legislação permitir, mas sem shows até pandemia estar controlada.