Por René E. Gertz*
Segundo o Antigo Testamento, as pessoas daquele tempo faziam montículos de pedras para sinalizar lugares em que tinham vivenciado momentos importantes de suas vidas. Desde os velhos romanos, fala-se em monumentos, em "lugares de recordar". Modernamente, em quase todas as localidades, conservam-se objetos destinados a lembrar, a recordar episódios importantes para o povo do local ou da região.
São Leopoldo não foge à regra, e o município possui muitos objetos dignos de serem preservados para recordar sua rica história. Lá estão a ponte velha sobre o Rio dos Sinos; a estação do primeiro trem que ligou Porto Alegre ao interior da então província; as casas de algumas de suas personalidades de maior destaque, como a do seu mais importante prefeito, João Corrêa Ferreira da Silva, ou do "pioneiro da ecologia", Henrique Roessler.
Mas São Leopoldo possui lugares de memória cuja importância ultrapassa o âmbito municipal e regional. De acordo com a Lei Federal nº 12.394, sancionada em 4 de março de 2011 pela presidente Dilma Rousseff, o município foi declarado Berço da Imigração Alemã no Brasil. E pode-se dizer que os lugares básicos que lembram esse fato são três: o Monumento ao Imigrante, na praça de mesmo nome, o Museu Histórico Visconde de São Leopoldo e a Casa do Imigrante, na Feitoria Velha.
O Monumento ao Imigrante foi depredado em 1942, por motivos políticos — foi reconstruído, mas, desde então, vem sofrendo com a deterioração causada pelo tempo e, sobretudo, pela ação daqueles que querem apropriar-se das partes metálicas. O "colono" de metal teve de ser recolhido, alguns anos atrás, tendo sido substituído por uma figura de material menos cobiçado; em placas de metal, mesmo afixadas em tempos mais recentes, estão evidentes os sinais da tentativa de arrancá-las, com pé-de-cabra.
No mínimo desde 2017, a situação financeira do museu está em petição de miséria. Já na década de 1980, quando foi construído um novo prédio para abrigá-lo, a construção ficou pela metade; os pilares de concreto abandonados, ao lado da parte concluída, dão testemunho do fato. Apesar dessas dificuldades, o poder público contribuía com certa importância, que permitia o funcionamento da instituição. Nos últimos dois anos, essa ajuda deixou de existir, e, se o museu continua funcionando, isso se deve à dedicação de sua diretoria, que conta com o trabalho de voluntários e uma modesta ajuda financeira de algumas pessoas físicas e jurídicas.
Desde 1980, a Casa do Imigrante (que desabou nesta terça-feira) é parte integrante do Museu. E ela é, sem dúvida, o terceiro marco importante nessa condição de São Leopoldo como Berço da Imigração Alemã no Brasil. Mesmo tendo sido construída mais de 30 anos antes da chegada dos primeiros imigrantes alemães, foi nela que eles ficaram, inicialmente, abrigados. Ela já apresentou problemas em outras oportunidades, tendo sido restaurada, contando com a colaboração de Theo Wiederspahn, um arquiteto que deixou marcas profundas na cidade de Porto Alegre e em muitos lugares do interior do Estado.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado do Rio Grande do Sul fez seu "tombamento", isto é, reconheceu seu valor histórico para todos os gaúchos, pois, considerando que mais de 30% da população estadual possui algum grau de ascendência alemã, todos eles têm o direito de ao menos imaginar que seus antepassados dormiram naquela casa, mesmo que só simbolicamente, pois na memória de todos eles estão presentes as "hospedarias de imigrantes", os primeiros abrigos pelos quais seus antepassados passaram ao chegar à nova pátria, antes de irem para seus lotes de terra.
* Historiador